Ficha do Proponente
Proponente
- Everaldo Asevedo Mattos (Poscom/UFBA)
Minicurrículo
- Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Cultura Contemporâneas/UFBA e mestre pelo mesmo programa. Bacharel em Artes, com concentração em Cinema e Audiovisual, pelo IHAC/UFBA. Pesquisador do Laboratório de Análise Fílmica (Pepa) do Poscom/UFBA. Bacharel em Direito pela UCSal – Universidade Católica do Salvador.
Ficha do Trabalho
Título
- “Inxeba” e as feridas abertas pela masculinidade tóxica
Seminário
- Cinemas negros: estéticas, narrativas e políticas audiovisuais na África e nas afrodiásporas.
Formato
- Presencial
Resumo
- Adotando-se, como objeto de estudo, o filme “Inxeba” (2017), de John Trengove, propõe-se, neste trabalho, a análise de questões relacionadas à masculinidade em África e às feridas, físicas e emocionais, sofridas pelas novas gerações, que confrontam com novas configurações de gênero e sexualidade os modelos tradicionais normalmente impostos.
Resumo expandido
- Lançado comercialmente em 2017, “Inxeba”, longa-metragem de estreia do diretor John Trengove, logo desfrutou de uma premiada recepção crítica e em festivais, sendo, inclusive, o filme indicado pela África do Sul para concorrer a uma indicação ao Oscar de Melhor Filme Internacional. Todo este sucesso, contudo, veio também acompanhado de bastante resistência dos espectadores sul-africanos mais conservadores, que tentaram boicotar “Inxeba” ao se verem incomodados com a representação, na obra, da tradicional prática de iniciação masculina conhecida como “ulwaluko” – rito de passagem ancestral que marca o ingresso dos jovens Xhosa na vida adulta – associada a questionamentos acerca dos ideais de masculinidade e sexualidade inerentes a esta prática e ao próprio povo Xhosa.
Com o aparente intuito de propor reflexões acerca dos ideais acima referidos, especialmente num contexto africano impregnado de tradições, de respeito ao passado e suas heranças, Trengove constrói seu filme em torno de três homens com personalidades bem diferentes: Xolani (Nakhane Touré), Kwanda (Niza Jay) e Vija (Bongile Mantsai). Membro do povo Xhosa, Xolani deixou a comunidade para morar em uma cidade próxima e trabalha em um armazém local, mas, anualmente, retorna a suas origens para servir de instrutor de algum garoto que será submetido ao “ulwaluko”. É nesse contexto que ele é abordado pelo pai de Kwanda, um dos jovens iniciados, que desconfia que o filho seja homossexual e pede a Xolani que, como instrutor, seja rígido com o jovem durante sua iniciação, de modo a ajudá-lo a realmente “tornar-se homem”. O que ninguém da comunidade sabe é que o próprio Xolani é gay e apaixonado por Vija, um dos outros instrutores, com quem mantém relações sexuais durante os encontros anuais para realização do ritual.
A partir da tensão entre esses três personagens e, especialmente, do constante confronto de Kwanda com relação às práticas e ideais envolvidos no “ulwaluko”, Trengove parece querer levar o público a refletir sobre questões, de certa forma, universais, mas que são ainda mais relevantes no contexto sociocultural que ele elegeu para situar sua obra. Afinal, o que significa ser homem? A heteronormatividade e a heterossexualidade são os únicos critérios para se definir a masculinidade? Aprende-se a ser homem? Ao tornar esses questionamentos texto e subtexto de seu longa-metragem de estreia, Trengove imbui “Inxeba” de narrativas e imagens que levam à reflexão acerca da própria construção da masculinidade em África (OUZGANE; MORRELL, 2005), além de salientar as feridas, físicas e emocionais, que podem ser abertas, individual e coletivamente, a partir da manutenção impositiva de ideais de gênero e sexualidade potencialmente ultrapassados (KIRBY-HIRST; KARAM, 2018; SCOTT, 2020).
A partir desses pressupostos e questionamentos, portanto, tendo como objeto de estudo “Inxeba”, de John Trengove, propõe-se, neste trabalho, a análise de como o diretor salienta, na tessitura imagética e textual de seu filme, questões relacionadas à (re)construção da masculinidade em África e às feridas, físicas e emocionais, sofridas pelas novas gerações, que confrontam com novas configurações de gênero e sexualidade os modelos tradicionais normalmente impostos.
Bibliografia
- GREEN-SIMMS, Lindsey B. Queer African Cinemas. Durham: Duke University Press, 2022.
KIRBY-HIRST, Mark e KARAM, Beschara. Inxeba (The Wound): Sexual, Gender, Cultural and Religious Traumata on the African Screen. Communicatio, nº 4, vol. 44, pp. 88-107, 2018.
OUZGANE, Lahoucine e MORRELL, Robert (org.). African Masculinities: Men in Africa form the Late Nineteenth Century to the Present. New York: Palgrave Macmillan, 2005.
SCOTT, Lwando. Inxeba (The Wound), Queerness and Xhosa Culture. Journal of African Cultural Studies, nº 1, vol. 33, pp. 26-38, 2020.
TCHEUYAP, Alexie. African Cinema and Representations of (Homo)Sexuality. In: VEIT-WILD, Flora e NAGUSCHEWSKI, Dirk (org.). Body, Sexuality and Gender: Versions and Subversions in African Literature 1. Amsterdam – New York: Rodopi, pp. 143-154, 2005.
WILLIAMS, James S. Ethics and Aesthetics in Contemporary African Cinema: The Politics of Beauty. New York: Bloomsbury Academic, 2019.