Ficha do Proponente
Proponente
- Gledson Merces dos Santos (UFF)
Minicurrículo
- Professor de História do Cinema da Faculdade Cal de Artes Cênicas. Técnico em Regulação da Ancine. Mestrando em Cinema e Audiovisual pela Universidade Federal Fluminense. Comunicólogo formado pela Universidade Católica do Salvador. Ator formado pela Faculdade Cal de Artes Cênicas. Especialista em Artes Visuais, Cultura e Criação pelo SENAC-DF. Especialista em Direção Teatral pela Faculdade Cal de Artes Cênicas. Editor de Cinema Negro do OCA-UFF.
Ficha do Trabalho
Título
- Políticas para diversidade no audiovisual: avanços e retrocessos
Seminário
- Cinemas negros: estéticas, narrativas e políticas audiovisuais na África e nas afrodiásporas.
Formato
- Presencial
Resumo
- A Medida Provisória 2228-1/01 estabelece princípios gerais da Política Nacional do Cinema, cria a Ancine e Conselho Superior do Cinema e dá outras providências. Com isso, fica estabelecido o que passou a se chamar de “Tripé da política audiovisual”, formado pelo CSC, Ancine e SaV. Essa estrutura traz em seus normativos a obrigação de pautar a diversidade no audiovisual. No entanto, apesar do arcabouço legal, poucas ações foram efetivadas em prol da equidade.
Resumo expandido
- A discussão sobre igualdade racial e diversidade no campo cultural não é um assunto novo no Brasil. A Constituição Federal de 1988, a Constituição Cidadã, escrita após o fim da Ditadura Militar e durante o processo de redemocratização do país, traz a preocupação não só com o amparo à cultura, mas também com a promoção da diversidade no campo cultural, ao pregar que “O Estado protegerá as manifestações das culturas populares, indígenas e afro-brasileiras, e das de outros grupos participantes do processo civilizatório nacional.” (BRASIL, 1988).
No entanto, em se tratando de audiovisual e instituições governamentais responsáveis pelo setor, ações efetivas começam a surgir na década de 2010. Em 2012, a partir de uma parceria entre a Secretaria do Audiovisual e outros órgãos de apoio à cultura, são lançados editais destinados exclusivamente a artistas e produtores negros. Entre eles, destaca-se o edital Curta-afirmativo, dedicado a jovens negros produtores de audiovisual. As chamadas tiveram forte adesão e centenas de projetos inscritos de todo o país. Mesmo com a alta demanda de projetos, os editais foram embargados a partir de uma ação movida por um advogado, alegando que o edital “lesa o patrimônio público e ofende os princípios jurídico-constitucionais da legalidade, da impessoalidade da moralidade e da isonomia” (CALDEIRA apud AQUINO, 2018, p.27).
A sentença proferida pelo juiz federal José Carlos do Vale Madeira, da 5ª Vara do Maranhão, diz que a medida “estimula a criação de guetos culturais por destinar somente aos negros a tarefa de se pronunciar”. O juiz parece ignorar (propositalmente) que é justamente o oposto que vem acontecendo ao longo dos mais de 125 anos de cinema no Brasil e ao longo dos séculos de uma forma geral. Ignora que quem sempre teve o privilégio de falar foram pessoas brancas.
A invisibilidade da representação negra no cinema remete às antigas práticas escravocratas de literalmente silenciar o negro, amordaçando-o. Por que deve a boca do sujeito negro ser amarrada? Por que ele tem que ficar calado? (KILOMBA, 2019, p.20). A mordaça hoje se materializa na exclusão do negro de participar, produzir e acessar bens culturais. A tentativa do advogado e a anuência do juiz ilustram essa “mordaça” que ainda hoje é colocada na população negra de inúmeras formas.
Já a Ancine, principal órgão fomentador do audiovisual brasileiro, só vai lançar seu primeiro edital com cotas para pessoas negras e indígenas no ano de 2018. As cotas nesse edital do Fundo Setorial do Audiovisual são fruto de diversos debates, que já vinham acontecendo na sociedade e também dentro da própria Agência, a partir de discussões levantadas por servidoras da casa e da participação efetiva da Comissão de Gênero, Raça e Diversidade, formada por servidoras e servidores com intuito de desenvolver atividades voltadas para inclusão e igualdade de oportunidades no audiovisual brasileiro.
Em 2019, com a chegada do Governo Bolsonaro ao poder, a Comissão é extinta e com ela todas as ações em prol da diversidade na Agência. Os novos editais não contemplam mais cotas para diversidade e as discussões são colocadas de lado na casa. O novo Mapa Estratégico do órgão, que já teve entre seus objetivos estratégicos a promoção da diversidade de gênero e raça na produção das obras audiovisuais brasileiras, agora traz apenas a meta de “Realizar análise das informações sobre a participação de mulheres e negros nos diversos segmentos da cadeia produtiva do audiovisual”, algo que já foi feito pela própria Ancine e por outras instituições como o Grupo de Estudos Multidisciplinares da Ação Afirmativa – GEMAA. Para além de tais estudos, a baixa participação e a falta de oportunidades para pessoas negras no mercado audiovisual é um fato de notório no país.
Este trabalho buscará debater mais detalhadamente esses pequenos passos em prol da diversidade no audiovisual, os desafios enfrentados no caminho e o atual retrocesso na pauta.
Bibliografia
- AQUINO, Isabela Silva de. Cinema Negro e Políticas Públicas: O impacto dos Editais Curta Afirmativo no cinema de Realizadores Negros no Brasil. Monografia (Cinema e Audiovisual). Universidade Federal Fluminense. Niterói, 2018.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988. Disponível em: . Acesso em: 7 jun 2021.
ANCINE, Agência Nacional do Cinema: Mapa Estratégico. Rio de Janeiro. 2017. Disponível em: . Acesso em 10 jun 2021.
___ Plano Estratégico 2020-2023. Rio de Janeiro. 2021. Disponível em: https://www.gov.br/ancine/pt-br/assuntos/noticias/ancine-aprova-novo-plano-estrategico Acesso em 21 fev 2022.
KILOMBA, Grada. A Máscara. In: Memórias da Plantação: episódios de racismo cotidiano. 1. ed. Rio de Janeiro, Cobogó, 2019. 248 p.