Ficha do Proponente
Proponente
- Matheus Vianna Matos (UFBA)
Minicurrículo
- Doutorando pelo Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Cultura Contemporâneas/PósCom/UFBA. Formado em Comunicação Social – Jornalismo pela Universidade Federal da Bahia (2017) e Mestre pelo PósCom/UFBA. Atualmente é pesquisador do Centro de Pesquisa em Estudos Culturais e Transformações na Comunicação/TRACC e atua principalmente nos seguintes temas: estudos culturais, narrativas audiovisuais, cinema brasileiro, fluxos audiovisuais, territorialidades, cinema baiano, música.
Ficha do Trabalho
Título
- Quilombismo e Territorialidades: “Quilombo Rio dos Macacos” (2017)
Formato
- Remoto
Resumo
- A partir dos estudos de Abdias do Nascimento, proponho uma articulação entre o quilombismo e as resistências quilombolas no Brasil contemporâneo, tomando como objeto analítico o documentário Quilombo Rio dos Macacos (2017), de Josias Pires, que acompanhou as lutas e as violências sofridas por essa comunidade. Propomos também uma aproximação com o trabalho de André Brasil, ao compreender que no cinema temos relações de continuidades e descontinuidades entre os modos de vida e as formas de imagem.
Resumo expandido
- A partir dos estudos de Abdias do Nascimento, proponho uma articulação entre o conceito de quilombismo e as resistências de territorialidades quilombolas no Brasil contemporâneo, tomando como objeto analítico o documentário Quilombo Rio dos Macacos (2017), de Josias Pires. O filme acompanhou durante anos as lutas e as violências sofridas por essa comunidade quilombola devido às ações da Marinha instalada na mesma região, em Simões Filho/BA. Ao pensarmos essas disputas, propomos aqui uma aproximação com o trabalho de André Brasil, ao propor que no cinema temos relações de continuidades e descontinuidades entre os modos de vida e as formas de imagem. Isso nos permite “afirmar que as performances que ali se produzem (dos autores e dos personagens) estão, simultaneamente, no mundo vivido e no mundo imaginado, elas são, a um só tempo, forma de vida e forma da imagem” (BRASIL, 2014, pg 133).
Intelectual com extensa pesquisa em torno da diáspora africana e as lutas de resistência da população negra no Brasil, Abdias do Nascimento tem como uma de suas principais propostas a ideia de quilombismo. Segundo o autor, essas comunidades, em suas várias formas, tiveram grande importância e foram “genuínos focos de resistência física e cultural” (NASCIMENTO, 2002, pg. 264). Nesse sentido, Nascimento indica que os quilombos configuram uma unidade, “uma única afirmação humana, étnica e cultural, a um tempo integrando uma prática de libertação e assumindo o comando da própria história. A este complexo de significações, a esta práxis afro-brasileira, eu denomino de quilombismo” (NASCIMENTO, 2002, pg. 265). Importante marcar que compreendemos o território como algo dinâmico e atravessado por relações de poder. A partir disso, Rogério Haesbaert defende abordar a territorialidade em uma dimensão imaterial que “existe e pode inserir-se eficazmente como uma estratégia político-cultural” (HAESBAERT, 2014, pg. 64). Ao pensarmos sobre as práticas de des-ordenamentos territoriais, podemos compreender como a proposição do quilombismo está alinhada com essa potência do des-ordenamento desse mundo colonizado.
O documentário Quilombo Rio dos Macacos (2017) consegue evidenciar essa trama complexa, na medida em que traz relatos que resgatam a memória dos antepassados que viveram naquele território, mas também busca evidenciar as diversas resistências e ativismos envolvidos na disputa frente ao poder militar-federal. Por não existir uma estrada que chegue até as casas, a Marinha controla de forma diária a possibilidade de ir e vir da população, que acaba buscando caminhos alternativos e de difícil acesso. Esse controle agressivo resulta ainda em episódios de violência física e verbal como o filme evidencia com trechos de câmeras de segurança, potencializado pelo completo silêncio da trilha sonora nesse momento. Essas ações são mostradas também por gravações de celular dos próprios moradores, que buscam algum mecanismo de defesa. Seja para as câmeras do diretor ou em audiências públicas, os moradores relatam a dificuldade de terem uma noite de sono tranquila, devido a todas essas violências físicas e simbólicas.
Ao pensar em alianças afetivas (GROSSBERG, 2018) que se formam entre as diversas comunidades quilombolas ou indígenas, ainda na metade inicial do filme, lideranças de outros quilombos realizam uma visita em Rio dos Macacos e relatam lutas semelhantes para o reconhecimento de suas terras frente aos poderes governamentais. Existe ali uma troca de conhecimentos, de estratégias político-culturais, que ultrapassam as fronteiras das comunidades. Através de toda essa historicidade de resistências e potência criativa, buscamos evidenciar outros futuros possíveis, destacando o quilombo como uma formação forte para uma identidade negra brasileira.
Bibliografia
- BRASIL, A. A performance: entre o vivido e o imaginado. In: Experiência estética e performance. PICADO, B; MENDONÇA, C. M.; CARDOSO, J. (Orgs.). SSA: EDUFBA, 2014, p. 131-145.
GROSSBERG, Lawrence. Under the Cover of Chaos: Trump and the battle for the American Right. Pluto Press, London, 2018.
HAESBAERT, Rogério. Viver no limite: território e multi/transterritorialidade em tempos de in-segurança e contenção. Rio de Janeiro: Bertrand, 2014
NASCIMENTO, Abdias. O Quilombismo. In: O Quilombismo: documentos de uma militância pan-africana. Brasília: Fundação Cultural Palmares, 2002, pp. 255-295
QUILOMBO RIO DOS MACACOS. Direção de Josias Pires. Produção de Marcela Costa: Bahia, 2017 (120 min.).