Ficha do Proponente
Proponente
- Leandro Afonso Guimarães (UFBA)
Minicurrículo
- Professor, pesquisador e realizador. Diretor de, entre outros curtas, Argentina, Me Desculpe (2015) e Toda Sombra Parece Viva (2019). Doutorando em Comunicação e Cultura Contemporâneas (UFBA), com apoio financeiro do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq.
Ficha do Trabalho
Título
- Gloria (Christian Keller, 2014): cantos, crimes e Sergio
Seminário
- Audiovisual e América Latina: estudos estético-historiográficos comparados
Formato
- Presencial
Resumo
- Gloria Trevi é uma cantora que foi de um gigantesco fenômeno musical a um escândalo criminal popular – de cinco milhões de discos vendidos a quatro anos presa. Após analisar quanto de atenção Gloria – Diva Suprema (Gloria, Christian Keller, 2014) dedica à artista, compositora, “diva suprema”, mas também ao produtor Sergio Andrade, com quem ela vai para a cadeia, esta análise pretende traçar interpretações possíveis para a trajetória narrada.
Resumo expandido
- – Se não fosse cantora, o que gostaria de ser?
– Presidente de meu país.
– De verdade, considera ser presidente?
– Sim, quando acabar minha voz, por que não?
– Muitas artistas no México lutam para ser a Madonna latina.
– Eu não quero isso! Nunca! Talvez ela seja a Gloria Trevi estadunidense!
O diálogo acima é uma compilação de conversas separadas por mais de vinte anos – a referência a Madonna veio em entrevista publicada no Los Angeles Times (OUMANO, 1993) e a conversa sobre uma carreira hipotética fora da música está retratada no filme Glória – Diva Suprema (Gloria, Christian Keller, 2014). Em meio a dezenas de cinebiografias musicais latino-americanas do século XXI, esta se diferencia não (apenas) pela popularidade ou ambição de Gloria Trevi, mas sobretudo porque a obra confronta uma questão criminal: se a abertura é com Gloria adolescente, em 1984, a segunda cena, que se passa 15 anos depois, no Brasil, mostra a cantora levada no camburão da polícia internacional.
A primeira música que Gloria interpreta no longa é na sua apresentação como uma jovem aspirante a cantora: Amor Cavernicola: “Ehiyo ehiyo eh! / “Buscando en una tierra prehistórica, luchando para poder ser feliz” (Gloria, Christian Keller, 2014), direcionada ao músico e produtor musical Jorge Andrade, mostrado ao público primeiro por discos e premiações emolduradas numa casa de dois andares. Esse homem poderoso considera a interpretação primitiva, “sem ideia de melodia, nem de ritmo, nem de estrutura nem das progressões” (Ibid.). O comentário posterior às críticas é um pedido para que ela tire a bota, já que ele precisa ver como ela está formada – para isso diz: “se desvista” (Ibid.). A imagem termina com ela atendendo ao pedido de Sergio, de onde o filme corta para a cena em que ele, mais de uma década depois, a chama na cama, dizendo que ambos têm de partir. Carinhosamente chamada pelo músico de “monstra”, ela afirma querer ver sua filha, mas, assim que deixam o prédio, chega a polícia. A “monstra”, que para quem encabeça o ato não merece aspas nem carinho, está presa pela Interpol. Assim como Sergio Andrade.
Aos mais desavisados, é natural a pergunta: o que ela fez? A quem já conhece sua ficha corrida, a questão pode ser mais específica: como o filme constrói essa personagem, que foi de um gigantesco fenômeno musical popular a protagonista de um escândalo criminal? Em que medida Christian Keller trabalha com mais uma “construção de biografias que se comportam quase que como destinos; ou verdadeiros tribunais de defesa” (SCHWARCZ, 2013, p. 52)?
Oliva (2014) chega a afirmar que o diretor “Keller se enamora por sua própria heroína – quem não se apaixonaria depois de cantarolar ‘Dr. Psiquiatra’? – e acaba por vitimizá-la”. Por outro lado, a cantora diz que a história escrita não foi aquela contada por ela em entrevistas à roteirista (DOMÍNGUEZ, 2014). É bem possível que Berman (2014), autora das páginas que resultaram no filme, e também de um livro sobre Gloria, tenha duvidado da “apresentação de si, ou melhor, de produção de si” (BOURDIEU, 2006, p. 189) – afinal de contas, a construção cine-biográfica de Gloria derivou do contato entre interrogada (a cantora) e interrogadora (jornalista e roteirista), que criou sua versão.
A proposta visa, assim, contribuir para a discussão: como estão representados no filme a carreira, a passagem criminal e demais meandros presentes na vida da protagonista?
Bibliografia
- BERMAN, Sabina. 2014. Gloria: una historia sobre la fama y la infamia. https://books.google.com.br/books/about/Gloria.html?id=Iw3hoQEACAAJ&redir_esc= Madrid: Planeta, 2014, 204 p. Acesso: 20 abr., 2022.
BOURDIEU, Pierre. A ilusão biográfica. In: FERREIRA, Marieta de Moraes; AMADO, Janaina; PORTELLI, Alessandro. Usos & abusos da história oral. 8. ed. Rio de Janeiro: Ed. da FGV, 2006. p. 183-191.
DOMÍNGUEZ, Alejandro. 2014. Las tres demandas de Gloria Trevi contra Sabina Berman. In: Milenio. 04 dez., 2014. https://www.milenio.com/cultura/las-tres-demandas-de-gloria-trevi-contra-sabina-berman. Acesso: 20 abr., 2022.
OLIVA, Jessica. Gloria. 2014. 30 dez., 2014. In: Cine Premiere. https://www.cinepremiere.com.mx/40225-review-cine-gloria.html. Acesso: 20 abr., 2022.
SCHWARCZ, Lilia Moritz. Biografia como gênero e problema. História Social: Revista dos Pós-graduandos em história da UNICAMP, Campinas, n. 24 jan/jul. 2013, p. 51-63, 2013.