Trabalhos Aprovados 2022

Ficha do Proponente

Proponente

    Fernanda Omelczuk Walter (UFSJ)

Minicurrículo

    Professora adjunta do Departamento de Ciências da Educação e do Programa de Pós-Graduação em Educação da UFSJ. Psicóloga, Mestre e Doutora em Educação pela UFRJ. Co-coordenadora do Grupo de Pesquisa Educação, Filosofia e Imagem – GEFI/UFSJ. Coordenadora do projeto de pesquisa e extensão Educação, cinema, outros territórios. Realizadora e pesquisadora de práticas inventivas com as imagens em contextos formativos diversos.

Ficha do Trabalho

Título

    Pedagogias de cineastas: mulheres, infância e educação no cinema

Seminário

    Cinema e Educação

Formato

    Presencial

Resumo

    O texto analisa o lugar protagonizado, ou confiscado, das mulheres nos filmes Jonas e o circo sem lona de Paula Gomes e O garoto selvagem de Truffaut, destacando elementos que descrevam as pedagogias destes cineastas a partir de como cada um se afeta com as crianças de seus filmes. Tomo como referência o corpo vibrátil de Rolnik e risco do encontro entre quem filma e é filmado, de Comolli, buscando entender como este acontecimento cria um tipo de cinema, de conhecimento e uma pedagogia.

Resumo expandido

    O texto analisa o lugar protagonizado – ou invizibilizado – das mulheres nos filmes Jonas e o circo sem lona (2015) de Paula Gomes e O garoto selvagem (1969) de Truffaut, destacando elementos que distinguem as pedagogias das/dos cineastas a partir do modo como cada um deles se deixa afetar em composição com as crianças de seus filmes. Para tanto, tomo como referência a ideia de corpo vibrátil (ROLNIK, 2018) e abertura ao risco do encontro-acontecimento entre quem filma e quem é filmado (COMOLLI, 2008; DELEUZE; PARNET, 1998; MARCELLO, 2009) e como este encontro se corporifica nas imagens e em um determinado modo de produzir cinema, conhecimento e uma pedagogia.
    Nas análises de Goliót-Lété e Lerner-Sei (2017) Truffaut partilha com Itard o desejo de reparar uma infância dolorosa, assumindo não apenas a direção, mas também a atuação como Itard, chegando ele mesmo, o cineasta, ao sucesso em sua empreitada, ao contrário de Itard, que fracassa na tarefa de socializar o menino. Isto porque Truffaut afirma que o cinema fez o ator-criança “evoluir”, atribuindo a si um empreendimento pedagógico que o faz deslizar entre as posições de cineasta-educador.
    Para a construção deste filme Truffaut se baseou em documentos que Itard escreveu enquanto acompanhava como tutor o desenvolvimento do menino. Em estudos sobre a transposição destes textos para filme, as autoras ressaltam a centralidade que Itard ganha em cenas em contraste com o apagamento da governanta Madame Guérin, que divergem do modo como sua participação é narrada nos escritos originais.
    Ao fazer isto Truffaut cria uma dicotomia pedagógica que isola e emite um juízo de valor superior à educação cientifica que ele – Itard – proporcionava e é evidenciada no filme, em detrimento da educação sensível, ocupada por Madame Guérin. Ela que, ao contrario de Itard, se deixa afetar pela presença do menino. Ela o escuta. O vê. Legitima sua singularidade. Itard está preocupado em torna-lo como outros meninos visando a manutenção de um modo dominante de existência.
    Diferente de Truffaut, Paula Gomes não usa um artifício para ocupar um lugar protagonista em cena, e não atribui a si a função de educadora. Entretanto, o que vemos, a partir da aproximação destes filmes, é que ao analisarmos seu encontro com Jonas, há também uma cineasta-educadora. Ela torna-se uma personagem da história, que intervém junto à mãe para que o deixe ir ao circo e consola Jonas pelo fracasso de sua empreitada – numa câmera tátil, que não só o filma, mas também o toca, literalmente, com as mãos a acariciá-lo em consolo, prestando-lhe assistência na última cena do filme (COMOLLI, 2008). Ainda que ela não fale, como Truffaut, de uma educação pelo cinema, o menino Jonas se torna não apenas seu amigo como passa a trabalhar com cinema e com a própria Paula em projetos seguintes.
    Se, por um lado, a narrativa do filme inicialmente se assemelha a uma ficção, a presença da diretora dentro das cenas embaralha os limites entre os gêneros. Ao filmar a história de Jonas, Paula provoca e produz o real, colocando em circulação traços de diferentes regimes da imagem, da infância e da escola. Em uma das cenas, por exemplo, vemos a diretora da instituição escolar reclamar que a presença da equipe documentarista na escola altera o comportamento de Jonas, inventa um novo Jonas – podemos dizer –, que ela talvez não queira reconhecer. Ela considera mau exemplo filmar um aluno que não tem um bom desempenho nas provas e tarefas. O cinema, em sua visão, deveria manter uma correspondência mais direta com o que percebia, representar o real, e não intervir nele (RANCIÈRE, 2009).
    Entendemos que a aproximação destes filmes, revelam de um lado, um forte protagonismo feminino na direção e impacto formativo enquanto do outro uma pedagogia que se faz com base no confisco do papel central de uma mulher educadora. A proposta deste trabalho é aprofundar e desenvolver estas análises com vistas a construção da pedagogia de cada um destes cineastas.

Bibliografia

    COMOLLI, J. L. Ver e poder. Cinema, televisão, ficção, documentário. Belo Horizonte: UFMG, 2008.

    DELEUZE, G. PARNET, C. Diálogos. São Paulo: Escuta, 1998.

    GOLIÓT-LÉTÉ; A. LERNER-SEI, S. Olhares cruzados sobre a educação de um jovem selvagem: Itard (1801) – Truffaut (1970). Em: BANKS-LEITE, L; DAINEZ, D; GLAVÃO, I. O garoto selvagem e o dr. Jean Itard. Histórias e diálogos contemporâneos. Campinas, SP: Mercado de letras, 2017.

    JONAS e o circo sem lona. Direção: Paula Gomes. 2015. Brasil. 1 DVD (83 min).

    MARCELLO, F. Sobre crianças e encontro: singularidades em jogo na estética cinematográfica. Revista Educação e sociedade; Campinas, vol. 30, n. 107, p. 611-630, maio/ago. 2009.

    O GAROTO Selvagem. Direção: François Truffaut. 1969. França. 1 DVD (85min).

    RANCIÈRE, J. A partilha do Sensível: estética e política. São Paulo: EXO experimental org; Editora 34, 2009.

    ROLNIK, S. Esferas da insurreição. Notas para uma vida não cafetinada. São Paulo: n-1 edições, 2018.