Ficha do Proponente
Proponente
- Jailson Ramos de Oliveira (Unicamp)
Minicurrículo
- Sou graduado em Comunicação Social – Cinema e Audiovisual pela Universidade Anhembi Morumbi. Atualmente, faço mestrado em Multimeios na Universidade Estadual de Campinas, onde pesquiso a representação dos trabalhadores em três filmes brasileiros recentes sob orientação do Profº Dr. Gilberto Alexandre Sobrinho.
Ficha do Trabalho
Título
- Trabalho e desejo em No Coração do Mundo
Formato
- Presencial
Resumo
- Nesta comunicação, falaremos sobre como o longa-metragem No coração do mundo (Gabriel Martins e Maurílio Martins, 2019) representa um conjunto de personagens trabalhadoras, distintas em suas formas de se relacionar com o trabalho e, por consequência, com desejos também diferentes. Para tanto, enfocaremos nossa análise nos elementos realistas da obra, nos atentando especialmente às questões do cotidiano, das paisagens e da performatividade das memórias e dos encontros.
Resumo expandido
- Nesta comunicação, falaremos sobre como o longa-metragem No coração do mundo (Gabriel Martins e Maurílio Martins, 2019) representa um conjunto de personagens trabalhadoras, distintas em suas formas de se relacionar com o trabalho e, por consequência, com desejos também diferentes. Para tanto, enfocaremos nossa análise nos elementos realistas da obra, nos atentando especialmente às questões do cotidiano, das paisagens e da performatividade das memórias e dos encontros.
Ao analisar o cotidiano, abordaremos as conexões entre as trajetórias das personagens, suas rotinas e atitudes cotidianas (DELEUZE, 2018) e a forma como o filme expressa tais elementos de maneira homogênea (MARGULIES, 2016). Na narrativa, o cotidiano de todos os personagens é marcado pelo trabalho, mas os modos de encará-lo não são os mesmos. Alguns trabalham para melhorar de vida, outros já estão satisfeitos com o que têm e há ainda os que apostam no crime para acançar seus objetivos. Além disso, tanto o crime quanto o trabalho refletem um desejo de melhorar de vida e isso fica claro em uma fala da protagonista que diz que “o coração do mundo é pra onde vai o desejo da gente”. A forma como o filme constrói o cotidiano é homogeneizante no sentido de nivelar dramáticamente as cenas, seja pelo ritmo de montagem e planos longos, seja pela pouca ação. Tais elementos são expressos também nos corpos das personagens, uns mais ativos, outros mais cansados, uns com energia e disposição, outros com menos, de modo que se perceba o tempo e o cansaço nas personagens.
Em seguida, ao lidarmos com as paisagens, mostraremos como elas são compostas pela relação entre espaços, corpos sensíveis de sujeitos determinados e ideologias concretas (VIEIRA JR., 2020) e, por isso, têm a ver com os elementos indexicais que constoem o grupo social representado em tela, construindo-lhe formas de visibilidade (RANCIÈRE, 2005). O bairro Laguna – universo do filme – é composto de trabalhadores e trabalhadoras brancas e negras, com corpos dentro e fora de certos padrões estéticos, cuja compreensão da realidade aponta para uma crença de que, apesar de duro, o trabalho tem o poder de trazer uma vida melhor. De modo que apenas os que se envolvem com o crime apresentam críticas ao trabalho. É, ainda, no interior desse tópico que o filme desenvolve uma crítica ao naturalismo, a partir das ações da protagonista. Mas mais que isso, interessa sobretudo entender como o filme constrói a imagem desse grupo social que é composto por marginais e uma série de trabalhadores formais e informais, e articula isso com o conjunto das ideias, valores e desejos dessas personagens, dando concretude ao coletivo representado em tela.
Por fim, nos dedicaremos a expor a performatividade das memórias e dos encontros (SCHOLLHAMMER, 2013), que afirmam modos de ser e se afetar, isto é, que sugerem formas de se relacionar com o passado e de reagir aos eventos contingentes da realidade. Em alguns casos, as memórias implicam ausência de futuro, em outros são o combustível para sua construção. Abordaremos um encontro específico entre duas mulheres de classes distintas que parece dizer muito a respeito da posição discursiva do filme e também falaremos de como as distintas atitudes dos três protagonistas expressam distintas posições em relação ao sentimento de desamparo e ao desejo de mudança, de ascenção social, etc.
Enfim, com isso esperamos demonstrar como No coração do mundo encena um conjunto de desejos dos trabalhadores e, mais que isso, parece elaborar um discurso sobre uma certa afirmação do desamparo como capacidade e força para realizar tais desejos – especialmente no caso da protagonista Selma (Grace Passô).
Bibliografia
- BAZIN, Andre. O que é o cinema? São Paulo: Cosac Naify, 2014.
BRANDÃO, Alessandra; LIRA, Ramayana. Performance e realismo afetivo no cinema brasileiro contemporâneo. In: DENNISON, Stephanie. World Cinema: as novas cartografias do cinema mundial. Campinas: Papirus, 2013.
DEL RIO, Elena. Deleuze and the cinemas of performance. Edimburgo: Edinburgh University Press, 2008.
DELEUZE, Gilles. Cinema 2 – A imagem-tempo. São Paulo: Editora 34, 2018.
MARGULIES, Ivone. Nada acontece: o cotidiano hiperrealista de Chantal Akerman. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2016.
RANCIÈRE, Jacques. A partilha do sensível. São Paulo: Editora 34, 2005.
SCHOLLHAMMER, Karl Erik. Cena do Crime: violência e realismo no Brasil contemporâneo. Rio de Janeiro: José Olympio, 2013.
VIEIRA JR., Erly. Realismo sensório no cinema contemporâneo. Vitória: EDUFES, 2020.