Ficha do Proponente
Proponente
- Arthur Fernandes Andrade Lins (UFF/UFPB)
Minicurrículo
- Professor de Montagem no curso de cinema da UFPB. Possui experiência no campo do audiovisual, desenvolvendo atividades teóricas e práticas. Atua como diretor/roteirista/montador, tendo realizado filmes exibidos e premiados em importantes festivais nacionais. Mestre em Letras/UFPB com pesquisa sobre narratologia audiovisual e processos de adaptação. Doutorando no PPGCINE/UFF com pesquisa voltada para o cinema contemporâneo brasileiro em diálogo com o gênero de ficção-científica.
Ficha do Trabalho
Título
- A dinâmica do caos nas distopias do cinema contemporâneo brasileiro
Formato
- Presencial
Resumo
- Construindo seus mundos futuristas dentro de uma sensibilidade distópica impregnada pelos enormes retrocessos no campo da política institucional brasileira, os filmes ‘Era uma vez, Brasília’, de Adirley Queirós e ‘Sol Alegria’, de Tavinho Teixeira, incorporam a ruptura como crença em seu potencial desestabilizador, liberando as forças políticas do caos ao provocar um imaginário em desordem, abrindo espaço para novas relações de sentido que não se construam na progressão interna da narrativa.
Resumo expandido
- No cinema contemporâneo brasileiro, em seu caráter mais independente e inventivo, um conjunto de filmes se destaca ao dialogar com o gênero da ficção científica em seus aspectos narrativos e estéticos. Acreditamos que ao abrir espaço para o campo da fabulação, através sobretudo de suas narrativas distópicas, filme como Era uma vez Brasília [2017], de Adirlei Queiróz e Sol Alegria [2018], de Tavinho Teixeira, emergem como um mapeamento do imaginário disruptivo e tornam possíveis uma subversão dentro de uma determinada ordem política e simbólica.
Cabe investigar, nesse gesto de subversão aparente, como tais estratégias podem renovar os seus efeitos e agir em seu potencial disruptivo, ou antes, como elas agem dentro de um regime estético das artes e o que acionam enquanto gesto político em um contexto de desmonte generalizado da democracia e da desarticulação no campo das esquerdas.
É o movimento que age nas duas direções que cria as possibilidades de um saber. Na imersão pura nada se sabe. Na abstração total sabe-se tampouco. O que este movimento sugere é a dialética de um pensamento crítico, de um saber que se produz no enlace com o mundo, com seus fatos, seus acontecimentos, seu cotidiano em constante produção, mas também na reserva de um espaço poético, onde as coisas podem ser rearranjadas, dispostas em novas ordens, (des)montadas, até que “as ‘desordens do mundo’, objeto central da arte, segundo Brecht, possam dar lugar a algo como um ‘caos composto’” (HUBERMAN, 2017, 76).
‘Compor o caos’, fazendo da montagem a arte da dialética que cria as distancias para que a contradição possa emergir no interior de uma unidade. No cinema de caráter mais narrativo seria aquilo que se interpõe entre a trama e a fábula, fazendo ver as articulações que agem desmontando a lógica da causalidade para revelar a desordem em processo.
Mas como pensar o caos como uma categoria política? No que a desordem pode fazer surgir em nosso tempo e agir para alargar uma experiência sensível?
Os filmes Era uma vez, Brasília [2017] de Adirley Queirós e Sol Alegria [2018], de Tavinho Teixeira, feitos dentro de um cenário político de instabilidade e de desmonte generalizado, propõe reações no campo estético, mas não soluções ou programas no campo político. São máquinas de guerra, que podem confrontar uma ordem instituída e uma ideologia reacionária na lógica da representação, mas que só efetuam a sua força (des) mobilizadora agindo em desacordo com um sistema que sobredetermina as formas de vida e os tipos de imagem que devem abastecer um dado aparelho produtivo.
É o que vemos em Era uma vez Brasília [2017] de Adirley Queirós, que ao lado de Branco Sai, Preto Fica[2014] seu filme anterior, forma um díptico sobre o cotidiano da experiência distópica nas vivências periféricas do Brasil. Em ambos os casos, trata-se de viagens no tempo, onde personagens do futuro se perdem em suas missões e acabam caindo em Ceilândia no tempo presente, distrito localizado no entorno de Brasília, capital do País, e região em que vive o realizador dos filmes.
Já em Sol Alegria (2018), de Tavinho Teixeira, há uma linha continuada no enredo posto em movimento que revela a chegada ao lugar mítico como o clímax narrativo, o ponto final de um percurso torto e hesitante. Acontece que essa longa sequência final se revela um tour de force que gira em falso. Dessa forma, é no plano da composição que a utopia se faz mais forte e a poética do caos mais presente. Trata-se de uma poética relacional.
Será neste desencanto de um modelo de progresso falido em suas possibilidades de inventar uma comunidade, que algo deve morrer para que o novo surja, novas articulações no âmbito da linguagem, novas temporalidades a compor uma narrativa. São filmes distópicos, mas que aponta para uma “utopia de linguagem”
Bibliografia
- BENJAMIN, Walter. Passagens. Belo Horizonte: Editora UFMG; São Paulo: Imprensa oficial do Estado de São Paulo, 2009.
DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. Do caos ao cérebro. In: O que é filosofia. São Paulo: Editora 34, 1997.
DIDI-HUBERMAN, George. Quando as imagens tomam posição: olho da História, I. Belo Horizonte: Ed.UFMG, 2017.
JAMESON, Frederic. Arqueologías del Futuro. Madrid: Ed. Akal, 2009.
SUVIN, Darko. Metamorphoses of Science Fiction: On the Poedtics and History of a Literary Genre. New Haven: Yale University Press, 1979