Ficha do Proponente
Proponente
- Michel Schettert (N/A)
Minicurrículo
- Cineasta. Especialista em conteúdos digitais audiovisuais. Trabalha como editor de imagem e som. Pesquisa a rítmica na relação corpo x arte. Faz experimentações em Videodança, Videoclipe, Videoensaio e Fotofilme. Estudou cinema entre Brasil e França. Fez residência artística e diplomado na Argentina e no México. Exibiu estudos artísticos dentro e fora do Brasil, como “Yaras” (2014), “Usina” (2015) e “Impulso” (2020).
Ficha do Trabalho
Título
- Da videodança à sala de cinema – um impulso ao silêncio
Mesa
- Outros cinemas
Formato
- Presencial
Resumo
- A partir do curta experimental “Dois Mowimentos”, esta comunicação faz uma reflexão sobre as questões de som inerentes à edição coreocinematográfica, envolvendo os conceitos de escuta e empatia para descrever uma suposta “telempatia” na atividade do editor.
Resumo expandido
- Em seu processo de feitura, o curta Dois Mowimentos (2017) levantou uma série de reflexões sintetizadas em fluxogramas, que vieram a confluir com o pensamento de Michel Chion (2008) na obra “A Audiovisão: som e imagem no cinema”.
O curta consiste na performance “Lava-jato” – um protesto artístico-político realizado em ano de eleições presidenciais. A dança mostra os movimentos de um bailarino de terno que conduz um carro de luxo em Brasília, passando pelo Congresso Nacional e parando finalmente à frente do Ministério da Justiça, onde o carro é estacionado. Neste local ocorre a performance na qual o bailarino usa de balde, água e esponja para lavar o carro, além da sua própria roupa. O ato é realizado em dois movimentos, sendo o primeiro mais econômico em relação ao segundo em termos de energia de movimento. O bailarino sai de um estado de contenção rumo à exaustão.
A concepção do som do filme partiu de alguns princípios que norteiam o campo da videodança: A música não deve ser um ponto de partida – a isto cabe o videoclipe, que parte da música para dar ritmo à montagem – ou seja, a trilha sonora da videodança deve ser integrada a posteriori e não a priori da dança ou da performance de movimento.
A partir desta premissa, duas intenções vieram à tona: 1) trabalhar com a noção de música concreta em detrimento da música tradicional; 2) construir uma trilha que contivesse o que Chion descreve como “sons fora de campo” – denominação para elementos sonoros que montados formam uma narrativa significante em paralelo ao conteúdo das imagens.
Na montagem sonora, portanto, diversas camadas de áudio foram mescladas contendo basicamente som direto, efeitos sonoros, reveses, ruídos e ambiências os quais, uma vez mixados, estabeleceram uma “lógica externa” com a semântica do ato performático fundador do vídeo. Segundo Chion, a característica dessa lógica é possuir um fluxo repleto de solavancos na sua continuidade sonora que vem para reforçar uma tensão entre as situações audiovisuais.
No momento da edição, a percepção empática daquilo que é mínimo nos ritmos tem efeito produtivo.
A questão da “escuta reduzida”, expressa em Chion, remete ao modo como o editor diminui o volume de sua escuta e renuncia a alguns estímulos, para poder então focalizar sua audição em elementos específicos. A escuta se reduz a uma faixa ou a outra, clarifica alguns itens, dá relevo a determinados timbres e escolhe um aspecto dentro do conjunto de sonoridades presentes na edição.
A empatia, no campo da psicologia, é entendida como uma habilidade que o terapeuta possui em sentir o que o cliente está sentindo. De uma perspectiva jungiana, o terapeuta deve ativar uma “escuta empática” reduzindo seu ego e ativando seus conhecimentos analíticos em direção ao sujeito analisado, na tentativa de estabelecer uma aliança terapêutica de trabalho. A projeção psíquica remete ao mesmo mecanismo: colocar-se no lugar do outro. Sendo esta uma conduta que ocorre no plano presencial, o que poderia ser perguntado sobre a possibilidade desta troca ocorrer à distância e, mais, entre diferentes entes num tempo não simultâneo? Para o editor de vídeos esta resposta pode tecer alguns aspectos pertinentes.
Nota-se que o contexto em que trabalha o editor é repleto de informações rítmicas que operam não apenas no campo visual e sonoro, mas também no campo sensório-motor. O ritmo, modulado no tempo, constitui o fluxo comum entre os estímulos audiovisuais e o corpo empático do editor, o qual agencia nesta atividade os chamados neurônios-espelho.
Deslocando estes conceitos para o trabalho de edição, é possível notar que a atenção do editor se projeta ao ecrã em forma de ausculta a qual, na medida em que capta e interpreta os pulsos que lhe são entregues, deve provocar uma redução do ego. Propomos nesta comunicação, portanto, refletir sobre os efeitos dessa projeção do editor (analista/sujeito) em direção ao ecrã (objeto), sintetizada pelo acontecimento silencioso descrito aqui como “telempatia”.
Bibliografia
- CAGE, John. Silence. Hanover: Wesleyan University Press, 1973
CHION, Michel. A Audiovisão: Som e imagem no cinema. Lisboa: Texto e Grafia, 2016
JUNG, C.G. A Prática da Psicoterapia. OC 16/1. Petrópolis: Vozes, 2011
LEPECKI, André. Exaurir a Dança. São Paulo: Annablume, 2017
PEARLMAN, Karen. Cutting Rhythms: Shaping the film edit. Malden: Focal Press, 2009