Trabalhos Aprovados 2022

Ficha do Proponente

Proponente

    Estevão de Pinho Garcia (IFG)

Minicurrículo

    Professor do Bacharelado em Cinema e Audiovisual do Instituto Federal de Goiás (IFG) – campus Cidade de Goiás desde 2015. Doutor em Meios e Processos e Audiovisuais pela Escola de Comunicações e Artes da USP. Mestre em Estudos Cinematográficos pela Universidad de Guadalajara, México. Pesquisador com diversos artigos publicados sobre o cinema latino-americano.

Ficha do Trabalho

Título

    O surrealismo libertador de Buñuel no pensamento crítico de Glauber

Seminário

    Audiovisual e América Latina: estudos estético-historiográficos comparados

Formato

    Presencial

Resumo

    Entre as páginas dos artigos Os 12 mandamentos de Nosso Senhor Buñuel e A moral de um novo Cristo e as do texto Tropicalismo, Antropologia, Mito, Ideograma, Glauber Rocha reflete sobre a obra de Luís Buñuel com atenção. Nosso objetivo é, portanto, através da análise dos textos de Glauber dedicados ao cinema de Buñuel, identificar de que forma o surrealismo do cineasta espanhol foi tomado como referência para uma proposição de cinema revolucionário que ganhou corpo a partir de A estética do sonho

Resumo expandido

    Entre as páginas dos artigos Os 12 mandamentos de Nosso Senhor Buñuel (1962) e A moral de um novo Cristo (1966) e as do texto Tropicalismo, Antropologia, Mito, Ideograma (1969), Glauber Rocha reflete sobre a obra de Luís Buñuel com admiração e atenção. Muito do que aí foi analisado será desdobrado posteriormente em seu trabalho teórico, principalmente no manifesto A estética do sonho (1971). É lícito considerar que cada um desses textos se situa em fases distintas da trajetória prática e teórica de Glauber, no entanto, em todos, observaremos uma apropriação estratégica de Buñuel, notadamente de seu surrealismo. No ensaio de 1962, o autor compartilha uma idéia corrente, defendida por um determinado setor da crítica, que o cineasta espanhol apresenta uma leitura muito própria e característica do surrealismo. Glauber reitera que “Buñuel conheceu Breton depois de Un chien andalou e nunca foi porta voz das idéias gerais do grupo”. A independência do diretor é destacada: Buñuel sim seria um surrealista porém um surrealista particular, desvinculado de grupos ou confrarias. A peculiaridade do surrealismo de Buñuel residiria precisamente no fato de que independente de onde possa estar trabalhando, ele sempre levará consigo sua cultura e, através dela, o seu surrealismo. No ensaio A moral de um novo Cristo, Buñuel é o diretor que dialética e violentamente materializava o sonho. Aqui é possível ver, mais claramente, formulações e idéias que serão depuradas e defendidas no manifesto de 1971. Ao afirmar nesse artigo que o surrealismo de Luis Buñuel “libera pela imaginação o que é proibido pela razão”, Glauber somente está chamando “surrealismo” o que ele chamará de “desrazão” em Estética do sonho. A denominação se modifica, mas o sentido permanece. O surrealismo de Luis Buñuel – constatamos mais uma vez que Glauber sublinha estar se referindo ao surrealismo de Buñuel e não a qualquer surrealismo – “é a pré-consciência do homem latino”. Essa afirmação nos indica que o surrealismo do cineasta espanhol não está só desligado de um surrealismo fundamentado por filosofias arraigadas na tradição ocidental como é a pré-consciência de um novo homem, no caso, do homem latino. Glauber afirma que o héroi buñueliano “de Robinson Crusoe ao criminoso Archibaldo de la Cruz, do padre Nazario à freira Viridiana e ao santo Simón, é, na última redução, um fanático latino organicamente faminto” e explica que “o comportamento de um faminto é tão absurdo que seu registro real cria o neo-surrealismo; sua moral, como subproletariado, é mais metafísica que política”. Essa última frase é fundamental: “mais metafísica que política”. Se a moral do oprimido do Terceiro Mundo (exemplificada no cinema de Buñuel através do faminto latino) é mais metafísica que política, sua total libertação só poderá ser alcançada no plano metafísico (ou místico). Esse plano não é uma dimensão a parte ou separada da dimensão política e sim a abarca. O plano metafísico inclui o político ou, em outras palavras, o plano metafísico também é político. No novo conceito de política compreendido por Glauber na passagem dos anos 1960 para os 70 não existe tal separação. Política não é mais um termo fincado no mundo material e se abre ao mundo místico. No texto Tropicalismo, Antropologia… Glauber afirmará que o surrealismo é coisa latina e que é o discurso das relações entre fome e misticismo. Para o autor “Buñuel é um surrealista e seus filmes mexicanos são os primeiros filmes do tropicalismo e da antropofagia”. Voltemos para A moral de um novo Cristo, aqui, o autor não menciona os termos “irracionalismo liberador” e “misticismo”, que serão os principais conceitos de seu futuro manifesto. No entanto quando Glauber afirma que o surrealismo de Buñuel “é a linguagem por excelência do homem oprimido” constatamos que esse surrealismo abarcará esses conceitos. Os elementos que Glauber encontrava no surrealismo de Buñuel parecem ter sido a fonte inspiradora para as suas posteriores formulações.

Bibliografia

    BUÑUEL, Luís. Escritos de Luis Buñuel. Madrid: Editorial Páginas de Espuma, 2000.
    ILIE, Paul. Los surrealistas españoles. Madri: Taurus, 1972.
    ROCHA, Glauber. O Século do Cinema. São Paulo: Cosac Naify, 2006.
    _______. Revolução do Cinema Novo. São Paulo: Cosac Naif, 2004.
    STARA, Daniela. De la realidad al sueño: incidencias buñuelianas en el cine de Glauber Rocha. Tese de Doutorado, Universidad Complutense de Madrid, 2010.