Ficha do Proponente
Proponente
- Lucas Bastos Guimarães Baptista (Egresso ECA-USP)
Minicurrículo
- Crítico de cinema e pesquisador. Mestre (2014) e Doutor (2019) em Meios e Processos Audiovisuais pela ECA-USP. Desde 2013, é editor da Foco – Revista de Cinema. Colaborador do blog Estado da Arte, do jornal Estado de São Paulo. Ministrou os cursos História(s) do cinema experimental americano (2018), Robert Bresson: O caminho do cinematógrafo (2019), O cinema e a aspiração radical: Annette Michelson e as vanguardas (2020) e Vanguardas americanas: Vertentes do cinema experimental (2021).
Ficha do Trabalho
Título
- “O cinema intelectual e suas vicissitudes”: um projeto comparativo
Seminário
- Cinema Comparado
Formato
- Presencial
Resumo
- O que se propõe aqui é um olhar sobre os métodos comparativos presentes nos textos de Annette Michelson sobre o cinema soviético e a vanguarda norte-americana. Nossa ênfase é no tema do “cinema intelectual” como ligação entre as duas filmografias e referência para as comparações feitas por Michelson entre nomes como Sergei Eisenstein, Dziga Vertov, Stan Brakhage e Hollis Frampton.
Resumo expandido
- Propomos aqui uma leitura dos ensaios de Annette Michelson sobre as vanguardas soviética e norte-americana. Mais especificamente, nos voltamos aos métodos comparativos presentes nesses textos, quase sempre ligados a um tema central em sua produção crítica, e que ela mesma denomina “O cinema intelectual e suas vicissitudes”.
Escrevendo sobre Wavelength (1967) em 1971, Michelson refere-se ao filme de Michael Snow como uma obra que toma como analogia a própria consciência “em seus modos constitutivo e reflexivo, como se a investigação da natureza e do processo da experiência descobrisse na arte deste século um incrível e unicamente direto modo de apresentação”. No ano seguinte, ao escrever sobre O homem com uma câmera (1929), Michelson retoma a mesma terminologia – o filme de Dziga Vertov, segundo ela, investiga o espaço “sobre o qual a investigação epistemológica e a consciência cinematográfica convergem em mímese dialética”.
As vanguardas norte-americana e soviética, analisadas separadamente nesses ensaios, recebem uma moldura comparativa em um texto de 1973, no qual as obras de Sergei Eisenstein e Stan Brakhage são contrapostas. Considerando o projeto de Eisenstein de um cinema enraizado na montagem e que teria como modelo a consciência dialética, Michelson descreve o cinema de Brakhage como uma alternativa. O espaço da cena, com suas orientações visuais e temporais, seria o elemento abstraído, dissolvendo com isso a “função cognitiva” buscada pelo cineasta soviético, dando ênfase à “imagem eidética”. Eisenstein e Brakhage, figuras paradigmáticas em seus respectivos contextos, são vistos por ela como polos inversos de um mesmo problema – a representação da consciência pelo cinema.
É também em 1973 que Michelson define este problema como um verdadeiro projeto crítico, marcando a conexão entre essas duas filmografias. Ela cita uma observação de Eisenstein, publicada em 1932, na qual é descrita a ideia de um cinema “capaz de reconstruir todas as fases e todas as especificidades do pensamento”. Eisenstein considera a possibilidade de um “monólogo interior fílmico”, e propõe uma sequência de operações formais a serem integradas em uma mesma estrutura. Ainda que o projeto de Eisenstein não tenha sido concretizado, Michelson reconhece nele uma prefiguração da vanguarda norte-americana: “em sua afirmação da disjunção, da abstração, das relações mutáveis entre imagem e som, sua ênfase na polifonia, no uso do silêncio e da tela vazia como elementos formais dinâmicos […] Eisenstein, num deslumbrante salto imaginativo, inventou no papel o teor essencial e as estratégias formais do cinema independente americano”. À história dessa aspiração, Michelson deu o nome de “O cinema intelectual e suas vicissitudes”.
Essas duas filmografias são objetos recorrentes nos escritos de Michelson. A chave comparativa, definidora do projeto, é presente tanto na exploração de cada um dos grupos como nas relações entre eles. Em geral, são oposições e divergências que caracterizam os ensaios: nomes que compartilham um mesmo horizonte, ou que operam na mesma época, no mesmo ambiente, mas que recorrem a estratégias contrastantes, revelando as tensões internas daquele recorte. Na União Soviética, é o conceito de “intervalo”, proposto tanto por Eisenstein como por Vertov, que serve como tópico de comparação. Nos EUA, a relação com a linguagem verbal serve para marcar as diferenças entre Brakhage e Hollis Frampton. Outras comparações, com outras figuras (René Clair, Maya Deren, Michael Snow, Richard Serra) e sobre outros temas, são também realizadas, mantendo Eisenstein e Brakhage como centros coordenadores em seus respectivos campos, de modo que, mesmo não citado diretamente, o tema do cinema intelectual parece manter-se de fundo, representando algo como uma armadura comparativa na obra de Michelson.
Bibliografia
- MICHELSON, Annette. “Intellectual Cinema: A Reconsideration”. In: Options and Alternatives: Some Recent Directions in Recent Art. Yale University Art Gallery, 1973.
__________. On the Eve of the Future: Selected Writings on Film. Cambridge, Mass.: The MIT Press, 2017.
__________. On the Wings of Hypothesis: Writings on Soviet Cinema. Cambridge, Mass.: The MIT Press, 2020.