Ficha do Proponente
Proponente
- Haroldo Ferreira Lima (USP)
Minicurrículo
- Haroldo Ferreira Lima é mestre em Clínica e Subjetividade (PPGPSI-UFES) e doutorando no Programa de Pós-Graduação em Meios e Processos Audiovisuais da Universidade de São Paulo (PPGMPA-USP). Atualmente pesquisa as múltiplas dimensões da amizade no cinema queer brasileiro a partir da filosofia de Michel Foucault.
Ficha do Trabalho
Título
- Dimensões do visível em Filme Para Poeta Cego
Resumo
- A comunicação aborda os aproveitamentos da lírica e da biografia de Glauco Mattoso em Filme Para Poeta Cego (Gustavo Vinagre, 2012) a partir do conceito foucaultiano de amizade (1981) e de sua leitura feita por Francisco Ortega (1999). Neste movimento, amarramos os quatro para deixar ver a ereção de imagens sobre modos de vida dissidentes no cinema queer brasileiro.
Resumo expandido
- Em Filme Para Poeta Cego (Gustavo Vinagre, 2012), a cegueira do poeta Pedro José Ferreira da Silva é trabalhada como dispositivo de visibilidade que mostra um encontro de imagens da poesia e do cinema, e deixa ver as afecções entre grande poeta e jovem realizador. Ao biografar o ídolo, Vinagre toma parte das experiências que dão forma à lírica e cede espaço para que o poeta ensaie, entre memórias do visível e imagens do cinema, sobre a materialidade de sua personagem literária, o incorrigível sátiro, encarnação contemporânea de Boca do Inferno em sua única possibilidade: Glauco Mattoso.
A comunicação dá continuidade à investigação sobre a ideia de amizade formulada pelo último Michel Foucault (1981) no cinema queer brasileiro. Neste momento, gostaria de aproximá-la de um de seus mais estritos sentidos por meio de procedimento quase hagiográfico.
O investimento de Foucault sobre as subculturas leather e BDSM em sua temporada californiana apostam no traçado de um campo de experiência que tornaria possível algo obliterado pela civilização cristã, o cultivo de artes eróticas um pouco mais ricas em relação à performance reprodutiva, vanilla, disciplinar do sexo (Ortega: 1999), em si, a serviço do biopoder (Foucault: 2010). Entendida como tática fundamental para resistir aos poderes sobre a normalização dos corpos, é por meio dessas práticas que Foucault vislumbra a invenção de modos de vida, formas de existir e coabitar um presente sensível, à flor da pele, com os prazeres da carne.
O curta parece exemplar para tal trabalho. Ao investir sobre Mattoso, Vinagre abre espaço para o poeta tecer considerações sobre as relações entre prazeres vividos e aqueles formulados em imagens poéticas, e traçar consideração sobre uma vida dedicada à arte e às artes do sexo. Isto amparado também por meio das relações afetivas e de cuidado explicitamente convocadas por Foucault quando trata das possibilidades da amizade. A partir da escuridão leitosa em que vive o poeta, o curta deixa visível a imanente relação de Mattoso e Akira, seu parceiro de vida e composição, e empurra o realizador para a participação prazerosa em cena, sob o comando dos dois e a ação de um carrasco.
Entrementes, Filme Para Poeta Cego coloca em exposição a partir da memória e da poética da personagem imagens fílmicas e literárias para se pensar tanto o pacto participativo que mobiliza as performances de si (Comolli: 2006) no quadro e a prática documental, quanto um pensamento sobre o visível a partir da perda da visão: neste caso, a multiplicação de olhos sobre seu corpo, aqui tomado em extensão como fonte inesgotável de prazeres da carne e tecnologia determinante para desembaraçar o prazer e a sexualidade de suas limitações genitais.
Bibliografia
- COMOLLI, Jean-Louis. Ver e poder. A inocência perdida: cinema, televisão, ficção, documentário. Belo Horizonte: Ed. da UFMG, 2008.
FOUCAULT, Michel. História da sexualidade I: A vontade de saber. São Paulo: Ed. Graal, 2010.
____. A amizade como modo de vida. Entrevista de Michel Foucault a R. de Ceccaty, Jj. Danet e J. Bitoux, publicada no jornal Gai Pied, abril de 1981. Trad. por Wanderson Flor do Nascimento. Disponível em: Acesso em 20 de abril de 2021
ORTEGA, Francisco. Amizade e estética da existência em Foucault. Rio de Janeiro: Graal,
1999.