Ficha do Proponente
Proponente
- Fernando Mascarello (UNISINOS)
Minicurrículo
- Doutor em Cinema pela USP (2004) e mestre em Psicanálise pela UFRGS (2020). Organizador dos livros História do cinema mundial (Papirus, 2006, em 7a. ed.) e Cinema mundial contemporâneo (Papirus, 2008, em 2a. ed.). Foi membro, de 1999 a 2010, do Conselho Deliberativo da SOCINE – Sociedade Brasileira de Estudos de Cinema e Audiovisual. Atualmente, é professor do curso de Realização Audiovisual da UNISINOS, do qual foi coordenador de 2004 a 2006.
Ficha do Trabalho
Título
- Entre autor e obra: Cronenberg do feminino ao masculino monstruoso
Seminário
- Teoria de Cineastas
Resumo
- Segundo Linda Ruth Williams e Scott Loren, a abordagem cinematográfica de David Cronenberg à relação entre o abjeto e a sexualidade exibe uma mudança de foco, desde o feminino monstruoso para o masculino monstruoso, concomitante à sua transição do body horror ao cinema de arte. Terão as acusações de misoginia, dirigidas por parcela da crítica feminista aos seus body horror movies, concorrido para essa mutação no tratamento estético e político do embate masculino x feminino pelo sujeito-cineasta?
Resumo expandido
- Durante os anos 1970 e a primeira metade dos 1980, na primeira fase de seu itinerário cinematográfico, David Cronenberg foi um dos artífices, senão o principal protagonista, do chamado body horror film. Logo a seguir, na esteira do seu reconhecimento crítico a partir de Scanners: Sua mente pode destruir (1981) e Videodrome: A Síndrome do Vídeo (1983), parcela da crítica acadêmica feminista, na segunda metade dos 1980, passa a apontar e analisar aspectos supostamente misóginos de sua obra de até então. Um vetor dessa crítica se estabelece, por exemplo, em torno à noção de um certo “feminino monstruoso” construído em seus filmes (Creed, 1993).
Em entrevistas à época, Cronenberg faz comentários sobre estas críticas. Como homem heterossexual, reconhece que, certamente, guarda temores inconscientes com relação ao feminino. Ao mesmo tempo, sendo o seu processo de criação artística caracterizado por uma intensa e manifesta implicação subjetiva, nada seria mais previsível, de acordo com ele, que a materialização fílmica de tais temores – sendo uma das funções facultadas ao artista, em seu entendimento, a problematização, justamente, do universo fantasístico dos próprios criadores, que é trazido a público para fins de diálogo e tensionamento junto ao debate cultural e político (Ramsey, 1998).
Entretanto, como é sabido, a obra cronenberguiana coincidentemente acusa, por essa altura, uma substancial mudança (iniciada com Gêmeos, mórbida semelhança [1988]) desde o body horror como subgênero do cinema de horror em direção a um cinema de arte internacionalmente reverenciado (o qual se desdobrará pelo menos até sua metamorfose criativa seguinte, agora pelo retorno a uma cinematografia de certo apelo comercial e menos investida no abjeto, inaugurada com Marcas da violência [2005]).
Em paralelo à primeira mutação citada de registro estético em sua trajetória (ou seja, do body horror ao cinema de arte), muitos críticos acadêmicos, particularmente os interessados, desde uma visada política, na temática do embate entre o masculino e o feminino em sua obra, assinalam a emergência de mudanças no tratamento estético e político conferidos ao tema, epitomizadas pelo deslocamento para uma nova figura central, o “masculino monstruoso” (Williams, 1999; Loren, 2011).
Nesse horizonte, o presente trabalho procura elaborar e disponibilizar possibilidades de resposta a duas questões principais:
1) Como um autor com as características de Cronenberg, de notória implicação subjetiva na obra, pode ser pensado como sujeito-cineasta em termos da relação que se estabelece, permanentemente, entre suas dimensões psíquico-existenciais e artístico-criativas?
2) Em que medida as críticas feministas mencionadas reverberaram em ambas esses dimensões subjetivas do cineasta, levando o diretor a esse deslocamento desde o feminino monstruoso ao masculino monstruoso?
Com respeito à metodologia, será promovido, mediante o exame de um corpus selecionado de suas entrevistas, um mapeamento e análise de câmbios subjetivos e ideológicos do cineasta que nelas são sugeridos, buscando, em paralelo, confrontá-los com a gradativa implementação das mutações estéticas e políticas em sua obra, na transição desde os body horror films aos filmes de arte.
Bibliografia
- CREED, Barbara. The monstrous feminine: Film, feminism, psychoanalysis. Londres: Routledge, 1993.
LOREN, Scott. Mutating masculinity: re-visions of gender and violence in the cinema of David Cronenberg. In: LÄUBLI, Martina; SAHLI, Sabrina. Männlichkeiten denken: Aktuelle Perspecktiven der kulturwissenschaftlichen Masculinity Studies. Bielefeld: Transkript, 2011, p. 151-170.
RAMSEY, Christine Elizabeth. Masculinity and processes of intersubjectivity in the films of David Cronenberg. Tese (doutorado). York University, Canadá, 1998.
WILLIAMS, Linda Ruth. The inside-out of masculinity: David Cronenberg’s visceral pleasures. In: AARON, Michele (org.). The body’s perilous pleasures: Dangerous desires and contemporary culture. Edimburgo: Edinburgh University Press, 1999, p. 30-48.