Trabalhos Aprovados 2021

Ficha do Proponente

Proponente

    Márcia Bessa (Márcia C. S. Sousa) (UFF)

Minicurrículo

    Doutora em Memória Social (UNIRIO/UChicago), Mestre em Ciência da Arte, Bacharel e Cinema & Vídeo (IACS/UFF) e Licenciada em Artes Visuais (FAMOSP). Foi pesquisadora-residente PNAP-R/FBN. Em 2018, concluiu seu primeiro estágio pós-doutoral no CIEC/ECO/UFRJ. Participa como pesquisadora associada no GP-CNPq, Coordenação Interdisciplinar de Estudos Contemporâneos (UFRJ). Atualmente é produtora no Coletivo DUO2X4, docente na Escola de Cinema Darcy Ribeiro (ECDR/IBAv) e Pós-Doutoranda no PPGCINE/UFF.

Coautor

    Wilson Oliveira da Silva Filho (UNESA)

Ficha do Trabalho

Título

    A projeção na tela grande e a percepção do erro de continuidade

Seminário

    Exibição cinematográfica, espectatorialidades e artes da projeção no Brasil

Resumo

    A partir de conceitos e características da experiência cinematográfica e da sala de exibição tradicional, esse trabalho tenta pensar a dispersão perceptiva em relação aos erros de continuidade existentes nos filmes projetados na tela grande; ressaltando o papel decisivo desempenhado pelos efeitos psicológicos da “situação cinema” no comportamento do espectador comum, sobretudo frente a narrativas mais afinadas com o modelo clássico em uma simples ida ao cinema na contemporaneidade.

Resumo expandido

    Partido de definições e especificidades que envolvem o estabelecimento das bases da psicologia da experiência cinematográfica de Hugo Mauerhofer na “situação cinema” (1983, p. 375), depreendemos que arquiteturas e projeções cinematográficas levam o espectador comum a uma outra ambiência apartada de sua rotina e que pode viabilizar uma mudança em seu estado de consciência – na fronteira entre vigília e sono, espécie de sonhar acordado, temática também cara a Christian Metz (1972) –, ativando subjetivamente uma busca por distração, entretenimento ou instrução. Esses aspectos legitimam feições dominantes e estratificadas tanto para sala de cinema como para a própria representação cinematográfica desde a década de 1910 até os dias atuais.
    Das vanguardas ao cinema de fluxo, discursos dissonantes e rupturas propostas, que possibilitaram reflexões e avanços essenciais à evolução e sobrevivência da produção cinematográfica não romperam completamente com os ditames do sistema de continuidade, através da manutenção de certos princípios que consolidaram o cinema clássico-narrativo. A essência do paradigma clássico permanece viva nos raccords centrados nos eixos de ação e olhar e na montagem que respeita a intenção dramática e a causalidade. Como para transgredir qualquer regra é necessário conhecê-la profundamente, o cinema dominante absorve muitas dessas inovações, incorporando-as ao próprio sistema e garantindo sua manutenção. Assim, podemos dizer que a continuidade se faz presente em sua essência de manutenção da coerência e coesão em diversas propostas fílmicas.
    Ademais, o cinema dominante ainda é o mais difundido mundialmente e sua produção cinematográfica – aquela mais ancorada em preceitos clássico-narrativos – ainda ocupa a maior parte dos nossos circuitos comerciais. Como nos diz Amiel (2007), a historiografia do cinema, assenta-se no próprio princípio da decupagem clássica. “E ainda hoje, evidentemente, a maioria dos filmes utiliza esta convenção, segundo a qual as imagens devem contar uma história, participar num projecto de narrativa”. A história mantém o espectador suspenso e impõe uma escrita fílmica que liga os planos entre si, dando-lhes equilíbrio individual para que só possam ser apreciados e entendidos em sua sucessão contínua. Qualquer elemento estranho a esse processo ou que o rompa de alguma forma pode vir a ser considerado um erro de continuidade. E, nos parece bem mais difícil a mobilização espectatorial na busca e identificação dessas falhas quando se está assistindo a um filme pela primeira (e única) vez e plenamente envolto nos meandros da “situação cinema”. Um espectador distraído está muito mais propenso a notar erros de continuidade. Consequentemente, poder assistir ao filme por mais de uma vez – parando, retrocedendo e avançando a mídia de suporte –, fora da sala de cinema tradicional, em um ambiente menos imersivo e em telas diversas amplia as possibilidades de detecção de falhas de raccord e de enredo.
    Os erros de continuidade são inerentes ao processo de realização cinematográfica, que prima pela ruptura, desordem e descontinuidade (XAVIER, 2005). Dos mais sutis aos mais explícitos, as suas repercussões no espectador podem ir de um simples estranhamento ao seu completo deslocamento para fora da história. Há anos nos deparamos com uma verdadeira obsessão pela caça ao erro de continuidade (KOS, 2004). Buscar essas falhas nos filmes e denunciar os bastidores das produções cinematográficas trariam quais motivações e consequências para o futuro das salas de exibição como as conhecemos hoje? Transformações na espectatorialidade, nos cinemas e nas cada vez mais novas tecnologias audiovisuais podem influir na evolução da técnica e estética fílmicas? Acreditamos que as potencialidades da tela grande podem trazer respostas a esses e a outros questionamentos.

Bibliografia

    AMIEL, Vincent. A estética da montagem. Lisboa, PT: Edições Texto & Grafia, 2007.

    KOS, Cesar. Falha nossa: as maiores gafes do cinema. São Paulo: Panda Books, 2004.

    MAUERHOFER, Hugo. A psicologia da experiência cinematográfica. In: XAVIER, Ismail (org.). A experiência cinematográfica: antologia. Rio de Janeiro: Edições Graal/Embrafilme, 1983. p. 373-380.

    METZ, Christian. A significação no cinema. São Paulo: Editora Perspectiva, 1972.

    XAVIER, Ismail. O discurso cinematográfico: a opacidade e a transparência. 3 ed. São Paulo: Paz e Terra, 2005.