Trabalhos Aprovados 2021

Ficha do Proponente

Proponente

    Joice Scavone Costa (UFF e FACHA)

Minicurrículo

    Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Cinema e Audiovisual | PPGCine da Universidade Federal Fluminense | UFF, consultora técnica no Brazilian Film and Video Preservation Project | BFVPP e leciona nas Faculdades Integradas Hélio Alonso | FACHA e na Academia Internacional de Cinema | AIC do Rio de Janeiro, onde é também coordenadora do curso livre Filmmaking.

Ficha do Trabalho

Título

    Doce Amianto: Disjunções entre o corpo e a fala

Seminário

    Estilo e som no audiovisual

Resumo

    Pretendemos construir um percurso das relações – com tensões e liberdade – estabelecidas entre a imagem e o som no filme “Doce Amianto”. Durante o estudo pormenorizado de cada parte da elaboração sonora em relação ao todo, tentaremos conhecer melhor a natureza, as funções, as relações e as causas do elemento sonoro diante da premissa estética da obra: de como ela se apresenta ao espectador e dá suporte à intenção e ao afeto dos diretores e equipe e do afeto das personagens em si.

Resumo expandido

    Pretendemos construir um percurso das relações – com tensões e liberdade – estabelecidas entre a imagem e o som a partir da apreciação, problematização e análise do filme Doce Amianto (Guto Parente & Uirá dos Reis, 2013). Durante o estudo pormenorizado de cada parte da elaboração sonora do filme em relação ao todo, tentaremos conhecer melhor a natureza, as funções, as relações e as causas do elemento sonoro diante da premissa estética da obra: de como ela se apresenta ao espectador e dá suporte à intenção e ao afeto dos diretores e equipe para com e durante a feitura do longa-metragem e do afeto das personagens em si.
    O estudo da linguagem cinematográfica durante nossa pesquisa está diretamente relacionado à perspectiva que o som no cinema evoca para construir um pensamento, um conhecimento filosófico, político e sociocultural no tecido fílmico. De formas diferentes, trouxemos conceitos de outros campos do conhecimento sobre o universo de sons no cinema, buscamos em Roland Barthes (2012), Jacques Derrida (2012), Don Ihde (2007), Robert Frost (1995) e Tim Ingold (2011), dentre outros, outro modos de pensar a voz e a escuta, para além do signo lingüístico ou padrão sintático. E, além disso, para tentarmos entender as potências do “lugar” que esta voz ocupa no tecido fílmico. Ingold (2011) atenta para a escuta no momento do contato entre o espectador (ou a sociedade) e o filme e defende que o som é o meio para o espectador sentir a imagem escutada e tateia, tal como Ihde (2007, pg. 15), explicitar que uma filosofia da escuta não deve ter como objetivo substituir o espaço dado à visão e sim entender como essas áreas da percepção se superpõem ou divergem.
    Escolhemos dentro da década de 2010 , profícuo momento de produções audiovisuais nacionais (EDUARDO, 2018), o filme Doce Amianto (Guto Parente & Uirá dos Reis, 2013), que contém “condições de estranheza” da fala que tencionam a relação visual e sonora no filme, de forma que explicita efeitos de incômodo, contrariedade e desconforto a partir do funcionamento da linguagem cinematográfica, cujas percepções, o pensamento, as emoções e o comportamento dos personagens em cena são afetados e podem causar ao espectador uma aparente sensação de delírios, alucinações e desorganização narrativa durante toda a duração do filme. No específico do estudo do som, em nosso corpus as vozes nunca condizem com os espaços dos demais elementos sonoros ou da tela, nem com os corpos em cena. A disjunção é reinventada a cada plano e o sonoro povoa sem necessariamente preencher o visto e o não-visto visual com uma presença específica.
    A experiência da artificialidade (STAM, Introdução à teoria do cinema, 2015, pg. 47) no filme ultrapassa os limites da linguagem para que a personagem, uma mulher no corpo de um homem, tencione territórios e culturas sem qualquer desejo de explicação. O excesso (WILLIAMS, 2004 [1991]) que transborda esta disjunção (BALOGH, 1996) é, em si, um ato de resistência (DELEUZE, 1990), pois a voz vem do outro lado da imagem, de alhures (BARTHES, 1989), e está sempre próxima ao espectador, independente da profundidade da imagem ou da perspectiva dos outros elementos sonoros.
    O uso das fonações por Guto Parente, Uirá dos Reis e os profissionais de som e preparadora de elenco do filme carrega um rico valor estético e emotivo arranjados pela dramaticidade, a dicção, o emprego das pausas, o uso dos pulmões, da língua, da boca, do nariz, o esforço físico de soltar e prender da respiração que demarcam o ritmo, o timbre, a entonação e espacialização da voz dos personagens do filme desde a captação até a projeção e apreensão do espectador.

Bibliografia

    ALTMAN, R. “Nascimento da recepção clássica: a campanha para padronizar o som”. 
    In: Imagens, n.o 5, ago/dez. Campinas: UNICAMP, 1995; pp. 41-47
    ANDACHT. F.; OPOLSKY, D. “A representação audiovisual do real a partir de uma 
    abordagem das falas dos personagens” In: Comunicação&Inovação n.36 , v. 18. São Caetano 
    do Sul: USCS, 2017.
    APOLONIO, C. “O Som de ‘Relato Selvagens’ – Parte IV” In: Artesãos do Som. São
    Paulo: 5 de janeiro de 2015. Disponível em: http://www.artesaosdosom.org/?p=2812
    AUMONT, J. O Cinema e a Encenação. Rio de Janeiro: Texto & Grafia, 2008. 
    BARTHES, R. “The grain of the voice”. In: STERNE, J. (Ed.). The sound studies reader. New York: Routledge, 2012. p. 504-510.
    CHION, M. La voix au cinema, Cahiers du cinéma – Editions de l’Etoile, pp. 13-14.
    DELEUZE, G. A imagem-tempo. São Paulo: Brasiliense, 1990.
    NASCIMENTO, F. A voz em estúdio: O uso audiovisual da Dublagem e do Diálogo Pós-Sincronizado no Brasil.