Trabalhos Aprovados 2021

Ficha do Proponente

Proponente

    Pedro Vaz Perez (UFF / PUC Minas)

Minicurrículo

    Doutorando em Estudos do Cinema e Audiovisual pelo Programa de Pós-Graduação em Cinema e Audiovisual da Universidade Federal Fluminense (PPGCine-UFF). É jornalista e mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social da PUC Minas. Professor do curso de Cinema e Audiovisual da PUC Minas.

Ficha do Trabalho

Título

    Garota de Ipanema, o mercado e a modernização da comédia musical

Resumo

    Buscaremos compreender “Garota de Ipanema” para além da chave autorista comum em suas revisões. Porque o marxista Hirszman filmou em cores, na Zona Sul, o mito da bossa nova? Apresentaremos a obra como uma das propostas comerciais da Saga Filmes, alinhadas à disputa do mercado de distribuição, pelos cinemanovistas, com a criação da Difilm. Ao mesmo tempo, veremos como a fita compartilha a tendência de atualização da comédia musical, e de amplo trânsito entre o cinema e a música popular no Brasil

Resumo expandido

    Garota de Ipanema (1967) é um dos poucos trabalhos concluídos de Hirszman ainda não restaurados. Pouco visto, quando avaliado, quase sempre em chave autorista, parece destoar do conjunto da obra, mais política, do diretor – e do cinema novo. Motivado por propostas de revisão historiográfica, como Bernardet (2008) em Historiografia clássica, apresentaremos um contexto histórico e cultural no qual o filme possa ser melhor compreendido, a partir de pesquisa bibliográfica, documental e do cotejo entre filmes, vislumbrando práticas culturais. Por que, em 67, o marxista Leon vai à Zona Sul filmar, em fortes cores, o mito da Bossa Nova?

    O filme, realizado após Pedreira de São Diogo, Maioria Absoluta e A Falecida parece surpreender pelas diferenças. Do popular à zona sul, do samba à Bossa Nova, do preto e branco ao colorido, Garota, escrito por Leon, Vinícius de Moraes, Eduardo Coutinho e Glauber Rocha, se alinha a um projeto mercadológico do CN após a criação da Difilm, e à tendência de modernização da comédia musical. Além de apontar para o intenso trânsito entre nomes da música e do cinema naquela década.

    Com a Difilm, os cinemanovistas passavam a se preocupar com o mercado, buscando consolidar um cardápio de realizações para competir com as grandes distribuidoras, em ocasião na qual a viabilização de suas produções se via ameaçada. Momento de forte dilema estético-político.

    Da aventura alternativa e jovem, do baixo custo e do privilégio à produção despreocupada com a distribuição e a exibição de seus primeiros anos, os cinemanovistas agora acenavam ao público e ao mercado. As apostas da Difilm se fazem evidentes em ensaios como os de Gustavo Dahl (1966; 1966a) ou de Glauber (2004): a adequação na linguagem dos filmes em busca das potencialidades de bilheteria – sem abrir mão de certos traços de um cinema político.

    O contexto é marcado pela vontade de “industrialização” do cinema nacional, vista em iniciativas como o CAIC na belacap, Rio, e defendida por nomes como Carlos Diegues (1965) e Ely Azeredo (1965). Ao mesmo tempo, há uma guinada na proposta da Saga Filmes, já sob o comando de Hirszman e Marcos Farias, privilegiando projetos mais comerciais que pudessem sustentar e consolidar a realização cinematográfica do grupo.

    Garota foi lançado com expectativa no natal de 67, após mais de um ano se fazendo presente em colunas sociais e reportagens, cheio de estrelas e com músicas que vão desde Baden e Vinícius a Roberto Carlos e The Mamas and the Papas. Alcançou a terceira maior bilheteria de 68, atrás apenas de Roberto Carlos e Mazzaropi – apesar do insucesso com a crítica. A existência e realização da fita faz sentido dentro da lógica Saga-Difilm: “Foi uma experiência um tanto industrial. Consegui uma série de condições técnicas e financeiras que acreditei serviriam de base para um projeto muito maior: iniciar a filmagem de uma série de filmes” (HIRSZMAN, 1969, p. 17).

    A obra, musical, antecede outros projetos com gêneros populares e bem demarcados da Saga, que já havia produzido o policial Perpétuo contra o esquadrão da morte (1967), de Miguel Borges, e investiria na comédia sci-fi O homem que comprou o Mundo (1968), de Coutinho, e nos filmes de cangaço Faustão (1970), de Coutinho, e A vingança dos doze (1970), de Marcos Farias.

    Ao mesmo tempo, Garota acenava para uma tendência de meados da década: a modernização da comédia. Gênero de sucesso nas décadas anteriores, elas ganhavam novas roupagens, alinhando-se às temáticas, ao estilo jovem e à música dos sessenta. Nesta trilha, além dos mais conservadores Crônica da cidade amada (1965), de Christensen e Rio, Verão e Amor (1966), de Watson Macedo, também vemos Toda donzela tem um pai que é uma fera (1966), de Roberto Farias, Todas as mulheres do mundo (1966), de Domingos de Oliveira, a fita em episódios As cariocas (1966) e as adaptações de Nelson Rodrigues dirigidas por J.B. Tanko. É a partir de todo esse contexto que buscaremos investigar a Garota de Ipanema.

Bibliografia

    AZEREDO, Ely. “Defesa de um Rio-cinema”. Guanabara em Revista, n. 4, janeiro de 1967. Rio de Janeiro: Museu da Imagem e do Som, p. 27-29

    BERNARDET, Jean­-Claude. Historiografia clássica do Cinema Brasileiro. São Paulo: Annablume, 2008.

    DAHL, Gustavo. “Cinema nôvo e estruturas econômicas tradicionais”. Revista Civilização Brasileira. Rio de Janeiro, n. 5/6, março, 1966, p. 193-204.

    DAHL, Gustavo. “Cinema Nôvo e Seu Público”. Revista Civilização Brasileira. N. 11/12. Rio de Janeiro, dezembro, 1966a, p. 192-202.

    DIEGUES, Carlos. “Um cinema carioca”. Guanabara em Revista. N. 1, agosto de 1966. Rio de Janeiro: Museu da Imagem e do Som, p. 8-10.

    HIRSZMAN, Leon. “Leon Hirszman: entrevista a Federico de Cárdenas”. Hablemos de Cine, n49, set-out 1969, p. 16-20.

    ROCHA, Glauber. “O Cinema Novo e a aventura da criação”. In: ROCHA, Glauber. Revolução do Cinema Novo. São Paulo: Cosac Naify, 2004.