Ficha do Proponente
Proponente
- Naara Fontinele dos Santos (Paris 3 – UFMG)
Minicurrículo
- Naara Fontinele é pesquisadora, educadora e curadora de cinema. Doutora em Estudos Cinematográficos e Audiovisuais pela Université Sorbonne Nouvelle – Paris 3 e em Comunicação Social pela UFMG (cotutela). Mestre em Teoria, História e Estética do Cinema pela Sorbonne Nouvelle (2010-2012) e em Pedagogia do Cinema (2012-2014) pela mesma instituição, com graduação em Cinema pela UFSC. Atuou como professora substituta de Cinema e Audiovisual na Sorbonne Nouvelle entre 2017 e 2020.
Ficha do Trabalho
Título
- Historicizar a estética: um método diante do documentário brasileiro
Seminário
- Cinema no Brasil: a história, a escrita da história e as estratégias de sobrevivência
Resumo
- Este trabalho pretende discutir uma proposta metodológica desenvolvida em tese de doutorado defendida em 2020. A pesquisa articula trabalho historiográfico e análise fílmica, num esforço de “historicizar a estética” do documentário de crítica social e do documentário experimental criado no Brasil nos anos que precedem e atravessam a ditadura civil-militar. Esta comunicação percorrerá alguns documentos essenciais na elaboração das hipóteses e análises.
Resumo expandido
- Este trabalho pretende discutir uma proposta metodológica desenvolvida em tese de doutorado defendida em 2020, em cotutela entre as Universidades Paris 3 e UFMG. Dedicada a revisitar a história formal do cinema brasileiro realizado entre 60 e 70, a pesquisa articula trabalho historiográfico e análise fílmica, num esforço de “historicizar a estética” do documentário de crítica social e do documentário experimental criado no Brasil nos anos que precedem e atravessam a ditadura civil-militar.
“Historicizar a estética” é um termo emprestado de David Faroult (Godard: inventions d’un cinéma politique, 2018). Interessado em investigar detalhadamente os filmes da conhecida “fase vermelha” de Godard (1966-1973), Faroult coloca em prática uma abordagem que busca historicizar cada iniciativa fílmica e as proposições defendidas dentro e fora dos filmes, buscando compreender as contingências que os determinam, ao mesmo tempo em que tenta localizar as invenções estéticas dos filmes e suas fontes. Ao me apropriar dessa caracterização metodológica, confrontando-a ao estudo das invenções de um documentário de cunho político no Brasil, “historicizar a estética” significa pensar a história formal dessa cinematografia – e significa também re-situar essa história das invenções de procedimentos estéticos na história do cinema, na história das questões sociais e políticas que atravessam os filmes e, por último mas não menos importante, na história do documentário brasileiro até então escrita. Em minha leitura, tais empreitadas historiográficas podem variar de filme a filme.
Para “historicizar a estética” desse cinema realizado num período de grande importância para a história das formas documentárias, exploro um método de pesquisa no cruzamento da abordagem estética e da abordagem histórica, interrogando sobretudo a maneira na qual o trabalho formal confere aos filmes uma dimensão crítica. Esse trabalho formal, de acordo com nosso método de abordagem, detém histórias, algumas das quais tento retraçar, em paralelo ao trabalho de análise fílmica. Trata-se de, vendo e revendo os filmes, e atentando para a experiência vivida pelos cineastas, inventar uma abordagem analítica capaz de interrogar as formas do cinema para retornar à história do Brasil, e vice-versa. Como a destruição cada vez mais vertiginosa dos direitos democráticos modificou o teor e a forma das iniciativas documentárias naquele contexto? Por quais vias estéticas os cineastas que fizeram seus primeiros filmes na virada de 60-70 (Aloysio Raulino, João Silvério Trevisan, Ana Carolina, Paulo Rufino etc) recomeçaram a elaboração de um “cinema crítico” iniciado na primeira metade da década de 60 (Linduarte Noronha, Geraldo Sarno, Leon Hirszman, Vladimir Herzog, Sergio Muniz, Helena Solberg)?
Foi percorrendo o conjunto fílmico de Bernardet em Cineastas e imagens de povo (2003), questionando seus limites, que encontrei o corpus de estudo da minha pesquisa. Uma das hipóteses que mobilizou a investigação era a de que, após o golpe de 64, houve entre nós um cinema engajado, fruto de iniciativas individuais singulares, no qual os cineastas criaram alternativas às modalidades e retóricas dominantes, mas também reataram os laços com uma empreitada de invenção de um documentário de crítica social iniciada no início dos anos sessenta. Ou seja, mais do que ruptura, como argumentou Bernarnet, sugiro que há recomeço.
Nesta comunicação, estará à frente a discussão do entrelaçamento, por vezes complexo, das informações oriundas de documentos em arquivos públicos e privados, das memórias pessoais recolhidas em entrevistas com cineastas e daquilo que tiramos das imagens e sons compondo os filmes. Proponho me deter em alguns documentos que agenciaram as elaborações históricas das invenções estéticas apresentadas no trabalho, que se inicia, no âmbito desta pesquisa, com Aruanda de Linduarte Noronha (1959-1960) e se encerra com O Tigre e a Gazela de Aloysio Raulino (1976).
Bibliografia
- BERNARDET, Jean-Claude. Cineastas e imagens do povo. São Paulo: Companhia das Letras, 2003.
BRENEZ, Nicole, JACOBS Bidhan (org.), Le cinéma critique: de l’argentique au numérique, voies et formes de l’objection visuelle. Paris: Publications de la Sorbonne, 2010.
FAROULT, David, Godard: inventions d’un cinema politique. Paris: Les Prairies ordinaires, 2018.
FONTINELE, Naara. Quando o cinema se oculta e se expande no coração da desordem – Potências críticas do documentário brasileiro (1960-1976). Tese (doutorado). Paris, Belo Horizonte: LIRA-Paris 3, PPGCOM-UFMG, 2020.
MESQUITA, Cláudia Cardoso. O presente como história: estéticas da elaboração no cinema brasileiro contemporâneo. In: Encontro da associação nacional dos programas de pós-graduação em Comunicação, 27.,2018, Belo Horizonte, Anais da Compós.
NAPOLITANO, Marcos, Coração civil: a vida cultural brasileira sob o regime militar (1964-1985): ensaio histórico. São Paulo: Intermeios, 2017.