Ficha do Proponente
Proponente
- Nathan Laurette Ferreira Costa (UBI)
Minicurrículo
- Nathan Costa é doutorando em Media Artes pela Universidade da Beira Interior (Covilhã, Portugal), onde conduz uma investigação sobre as intersecções entre cinema, política e história na cinematografia brasileira contemporânea. O projeto atual dá continuidade aos trabalhos realizados nos âmbitos da graduação em Comunicação Social (UFES) e do mestrado em Indústrias Criativas (Radboud University, Holanda), focados em diferentes aspectos do cinema documental e político.
Ficha do Trabalho
Título
- A política dos corpos em narrativas cinematográficas transmidiáticas
Seminário
- Cinemas pós-coloniais e periféricos
Resumo
- Este trabalho propõe uma análise da função narrativa dos corpos e da transmidialidade nos curtas-metragens Swinguerra (Bárbara Wagner e Benjamin de Burca, 2019) e Inabitáveis (Anderson Bardot, 2020), que constroem e habitam territórios híbridos onde convivem o cinema documental e ficcional, a dança, a videodança, as artes visuais e performáticas. Os corpos filmados, racializados, periféricos, queer, trazem consigo um discurso de enfrentamento e resistência – são espaços políticos.
Resumo expandido
- O cinema brasileiro contemporâneo tem se dedicado de forma crescente a aspectos sociais, políticos e identitários do Brasil do tempo presente. Essas questões se apresentam nas obras não só como temática, mas também nos modos de produção e nas decisões estéticas e narrativas, muitas vezes aliando-se a outros formatos e disciplinas artísticas como forma de amplificar e potencializar seu discurso. A transmidialidade e o hibridismo revelam-se como aspectos característicos de um cinema focado em grupos minoritários e oprimidos, que apresenta de forma afirmativa a pluralidade do cenário multicultural brasileiro e problematiza questões étnicas, religiosas, econômicas, sociais, políticas, históricas e de gênero.
A forma como o corpo humano é representado nas telas, muitas vezes assumindo o papel de significante e elemento narrativo, é outra tendência que se destaca nesse cinema. Obras como Swinguerra (Bárbara Wagner e Benjamin de Burca, 2019) e Inabitáveis (Anderson Bardot, 2020) constroem e habitam territórios artísticos híbridos onde convivem o cinema documental e ficcional, a dança, a videodança, as artes visuais e performáticas. Os corpos racializados, periféricos, queer e/ou não-binários apresentados nos filmes trazem consigo um discurso de enfrentamento e resistência – são espaços políticos. A expressividade dos movimentos desses corpos e suas interações com outros corpos e espaços tornam-se uma camada extra de significação nos filmes.
Swinguerra apresenta um duelo entre grupos de dança de swingueira pernambucana, estilo musical que é um fenômeno no Nordeste do Brasil. O duo Bárbara Wagner e Benjamin de Burca, que assina o filme, tem se destacado com obras multidisciplinares (fotografias, instalações, curtas-metragens) focadas no universo da cultura popular e realizadas em coautoria com os grupos representados. O filme acompanha os ensaios de três grupos de dança compostos por dançarinos negros e periféricos, com destaque para os corpos trans e/ou não-binários. As cenas dos ensaios nas quadras de esporte de escolas públicas apresentam caráter realista e documental e são intercaladas por momentos imaginados, com cenário, iluminação e figurino artificializados, apresentados como divagações das personagens. Em seguida, o duelo de swuingueira também se dá num ambiente imaginado e é precedido por uma introdução em que os dançarinos batem continência enquanto uma voz off recita os dizeres da bandeira nacional. A tensão da competitividade, do treinamento, do duelo e o teor nacionalista da voz off contrastam com sensualidade, o ritmo e o teor afirmativo das músicas, coreografias e corpos.
Inabitáveis adapta para o formato de curta-metragem um espetáculo de dança contemporânea, ficcionalizando os bastidores da obra adaptada, amplificando sua temática e abordagem. Enquanto o espetáculo foca na homoafetividade negra, criando uma coreografia inspirada nos movimentos de um encontro sexual entre dois homens negros, o curta-metragem adiciona questionamentos sobre o colonialismo e o escravagismo ao expandir seu universo narrativo e transportar a mesma coreografia para espaços públicos da cidade de Vitória (Espírito Santo). Como em Swinguerra, os atores principais interpretam a si mesmos (ou personagens inspirados em si mesmos) e transitam entre territórios realistas e imaginados, provocando reflexões sobre a ancestralidade e as intersecções desses corpos com a sociedade atual e os espaços públicos.
Este trabalho propõe uma análise da função narrativa dos corpos e do hibridismo utilizados pelos realizadores em questão, considerando o contexto do Brasil e do cinema brasileiro contemporâneo. A análise dos filmes levará em consideração textos que abordam identidade e multiculturalismo (por autores como Manuel Castells, Stuart Hall, Castiel Vitorino Brasileiro, Ella Shohat e Robert Stam) aplicadas ao cinema brasileiro contemporâneo e aos filmes em questão (Anderson Bardot, Kênia Freitas, Lucia Nagib).
Bibliografia
- BARDOT, A. (2019) Curta-metragem Inabitáveis: idealização e direção. Vitória: Universidade Federal do Espírito Santo.
BRASILEIRO, C. V. (2020). Ancestralidade sodomita, espiritualidade travesti. PISEAGRAMA, Belo Horizonte, número 14, (pp. 40-47).
CASTELLS, M. (2000). O poder da identidade. São Paulo: Paz e Terra.
FREITAS, K. (2019). Fabulações críticas em curtas-metragens negros brasileiros. In: Multiplot, n.7.
HALL, S. (2006). A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: DP&A.
NAGIB, L. (2020). Passages to Reality: The Case of Brazilian Cinema. In Realist Cinema as World Cinema: Non-cinema, Intermedial Passages, Total Cinema (pp. 173-198). Amsterdã: Amsterdam University Press.
SHOHAT, E; STAM, R. (2016). Crítica da imagem eurocêntrica: multiculturalismo e representação. São Paulo: Cosac Naify.
VIDEODANÇA. (2015) In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. São Paulo: Itaú Cultural.