Trabalhos Aprovados 2021

Ficha do Proponente

Proponente

    Estevão de Pinho Garcia (IFG)

Minicurrículo

    Docente do curso de Cinema e Audiovisual do Instituto Federal de Goiás. Doutor em Meios e Processos Audiovisuais pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, mestre em Estudos Cinematográficos pela Universidade de Guadalajara, México, e bacharel em Cinema pela Universidade Federal Fluminense. Foi professor visitante da Universidade Federal da Integração Latino-Americana. Pesquisador atuante em pesquisas e publicações sobre o cinema latino-americano.

Ficha do Trabalho

Título

    Buñuel e Torre Nilsson na contramão do “Neorrealismo latino-americano”

Seminário

    Audiovisual e América Latina: estudos estético-historiográficos comparados

Resumo

    Los olvidados (Luís Buñuel, México, 1950) e El secuestrador (Leopoldo Torre Nilsson, Argentina, 1958) são dois filmes que estabelecem um diálogo incomum com o Neorrealismo italiano. A intensa crueldade e o tom pessimista de suas imagens se distanciam do humanismo esperançoso e da mensagem positiva dos filmes dos realizadores tidos como pioneiros do Nuevo Cine Latinoamericano. O nosso objetivo é examinar de que forma esses filmes estabeleceram uma linha expressiva que não foi continuada pelo NCL.

Resumo expandido

    Na historiografia do cinema o Neorrealismo italiano é frequentemente considerado como um movimento situado entre o cinema clássico dos grandes estúdios e os cinemas novos dos anos 1960. Esta específica e particular tendência do cinema italiano do imediato pós-guerra se tornaria o emblema, portanto, de um período de transição entre dois distintos modelos de cinema: um tido como antigo e ultrapassado e outro, necessariamente defendido como novidade. Nessa permanente e contínua batalha entre o “velho” e o “novo” este movimento de transição seria o precursor do cinema moderno que explodiria na década seguinte. A partir desta compreensão teleológica o cinema moderno não poderia haver existido sem o surgimento do Neorrealismo. Compreensão que, de certa forma, é reproduzida pela historiografia clássica do cinema latino-americano em sua abordagem da década de 1950. Esse período é sentido como uma etapa de transição entre o cinema clássico industrial produzido nos estúdios mexicanos, argentinos e brasileiros e o denominado Nuevo Cine Latinoamericano. Para essa historiografia a fase de transição entre o clássico e o moderno seria essencialmente marcada pela incidência do modelo neorrealista em cineastas que ela rapidamente classifica como os “pioneiros” dos cinemas novos de seus países. O brasileiro Nelson Pereira dos Santos, o argentino Fernando Birri e os cubanos Tomás Gutiérrez Alea e Julio García Espinosa, portanto, seriam os “pais” do Nuevo Cine Latinoamericano. Contrariando essa versão oficial da história que limita o Neorrealismo realizado na América Latina aos setores de esquerda, Paranaguá aponta que o movimento também influenciou determinados estúdios e se serviu de modelo, tanto para a absorção como para o rechaço, a outros cineastas. Paranaguá (2003, p.36-39) define os não neorrealistas Luís Buñuel e Leopoldo Torre Nilsson como os dois grandes cineastas da transição entre os velhos estúdios e os cinemas novos da década de 1960. Para exemplificar o seu argumento cita Los olvidados (México, 1950) do primeiro e El secuestrador (Argentina, 1957), do segundo. Os dois filmes abordam a deliquência infanto-juvenil em grandes metrópoles latino-americanas, são filmados em locações, utilizam atores não-profissionais e promovem um contundente retrato social. Para o historiador, os filmes estabelecem diferentes diálogos com o Neorrealismo: o de Buñuel seria tenso e conflitivo enquanto o de Torre Nilsson seria convergente. Los olvidados, apesar de apresentar os elementos básicos da cartilha neorrealista, sairia de seus trilhos por acionar uma abertura para a subjetividade, o imaginário e o onírico. A poética do banal e do cotidiano, própria da corrente italiana, não seria solúvel ao ser colocada no contexto de uma estética permeada por complexos de Édipo, sonhos e desejos insólitos. Em relação a El secuestrador acreditamos que a sua convergência ocorre até um certo ponto uma vez que a concepção de realismo de Torre Nilsson é visivelmente oposta a da escola italiana. O diretor argentino é notoriamente reconhecido por destilar de forma exemplar uma estética do excesso e do transbordante. Até mesmo em El secuestrador não deixará de compor personagens literários, de manobrar certas marcas de estilo (os famosos planos inclinados) e de executar outros procedimentos não realistas a fim de obter os efeitos que deseja produzir. Entretanto, independente do grau de parentesco com os italianos El secuestrador se aproxima de Los olvidados por ser um fato isolado e por não ter feito escola no interior de sua cinematografia. Podemos afirmar que devido à crueldade e ao tom pessimista de suas imagens, esses dois filmes se afastam do humanismo esperançoso dos filmes da dupla Zavattini/ De Sica, tão caros e influentes aos “pioneiros” do Nuevo Cine Latinoamericano. O nosso objetivo é examinar de que forma esses filmes estabeleceram uma tradição que não foi continuada pelo NCL e que acabou neles mesmos.

Bibliografia

    BUÑUEL, Luís. Escritos de Luis Buñuel. Madrid: Editorial Páginas de Espuma, 2000.
    MONTERDE, José Henrique. Los orígenes del cine moderno in ______; RIAMBAU, Esteve (Orgs.). Historia General del Cine. Volumen IX. Europa y Asia. Madrid: Cátedra, 1996.
    PARANAGUÁ, Paulo Antônio. El neorrealismo latinoamericano in Cinemais, nº 34, Rio de Janeiro, abril/junho de 2003.
    _______. Tradición y modernidad en el cine de América Latina. Madrid: Fondo de Cultura Económica, 2003.
    QUINTANA, Ángel. El cine italiano 1942-1961. Del neorrealismo a la modernidad. Barcelona: Paidós, 1997.
    TORRE NILSSON, Leopoldo. Torre Nilsson por Torre Nilsson. COUSELO, Jorge (Org.). Buenos Aires: Fraterna, 1985.