Ficha do Proponente
Proponente
- THIAGO MENDONCA (ECA-USP (PPGMPA))
Minicurrículo
- Thiago é mestrando em Meios e Processos audiovisuais na USP, onde estuda a obra de Andrea Tonacci. Trabalha como diretor, roteirista e montador. Dirigiu diversos filmes, como “Minami em Close-up”, “A Guerra dos Gibis”, “Piove, il Film di Pio”, “Entremundo”, “Belos Carnavais” e “Jovens Infelizes”. Colabora com diversas publicações e possui uma coluna semanal de crítica cinematográfica na Revista Época.
Ficha do Trabalho
Título
- O ECLIPSE DA EXCEÇÃO (Cinema e ditadura na 2a metade dos anos 1980)
Resumo
- Na segunda metade dos anos 1980 o fim da ditadura já era evidente. Celebrada ou colocada em xeque, a transição para a democracia foi pano de fundo de alguns filmes brasileiros deste período, trazendo à cena diversas contradições do processo de redemocratização. Da celebração de um tempo novo à denuncia de um falso rompimento, o cinema trouxe discussões importantes e ainda não superadas sobre as heranças da ditadura.
Resumo expandido
- Data de 1890 o Hino à Proclamação da República, que enunciava em seus versos: “Nós nem cremos que escravos outrora, tenha havido em tão nobre país. Hoje o rubro lampejo da aurora, acha irmãos, não tiranos hostis”. Havia dois anos que a escravatura fora abolida e a situação dos descendentes de escravizados era calamitosa. Mas os versos do hino anunciavam que a discussão sobre as consequências da escravidão era página virada, mesmo que não se tenha enfrentado de frente as vicissitudes trazidas por ela. Não seria uma marca da história do Brasil a celebração da “superação” de um momento traumático antes que suas consequências pudessem ser digeridas? O que falar da memória da ditadura que assolou o Brasil por 21 anos?
O período entre 1985 a 1989 é considerado o dos primeiros anos da redemocratização. Ainda não acontecera eleição direta, mas já se anunciava o eclipse da ditadura. Eclipse não é um fim. É um desaparecimento aparente pela interposição de outro corpo, no caso a volta da democracia. Celebrada ou colocada em xeque, a redemocratização povoou o cinema brasileiro, trazendo à cena diversas contradições presentes no mundo social.
Há uma quantidade razoável de filmes que trataram no período aqui abordado (1985-1989) da questão do fim da ditadura, seja direta ou indiretamente. Procuraremos refletir sobre os discursos que algumas destas obras buscaram construir. São elas: “O beijo da mulher aranha”, de Hector Babenco (1985), ”Pátria amada”, de Tizuka Yamazaki (1985), “Anjos do Arrabalde”, de Carlos Reichenbach (1986), “O país dos tenentes”, de João Batista de Andrade (1987), “Tanga, deu no New York Times”, de Henfil (1987), “Besame Mucho”, de Francisco Ramalho Jr. (1987), “Feliz ano velho”, de Roberto Gervitz (1988), “Romance”, de Sergio Bianchi (1988), “Corpo em delito”, de Nuno Cesar Abreu (1989) e “Kuarup”, de Ruy Guerra (1989). Filmes com propostas e leituras diversas do momento histórico vivido, que vão da celebração de um tempo novo à denuncia de um falso rompimento com o passado. O cinema deste período surpreende por apresentar consciente ou inconscientemente algumas das principais questões que seriam trabalhadas nos anos subsequentes sobre passado e presente diante das heranças da ditadura.
Em grande parte da bibliografia do cinema brasileiro este período aparece como uma sombra, um senão, quase uma mácula, quando não é simplesmente ocultado. Alguns críticos consideram os anos 1980 uma fase de decadência, momento que teve como tiro de misericórdia o fim da Embrafilme. São raríssimas as obras que tratam diretamente do cinema da segunda metade dos anos 1980. Talvez pelas disparidades enormes entre os filmes (estéticas, discursivas e de formas de produção), que trazem obstáculos concretos a um discurso sintético. Mas principalmente por ser um momento de difícil compreensão e com uma quantidade enorme de variáveis que dificultam a cristalização de uma narrativa.
Ao nos depararmos com os filmes que tratam da ditadura e suas heranças realizados no período abordado, observamos um mar de possibilidades ainda pouco exploradas pela crítica. A segunda metade dos anos 1980 se apresenta como um momento em aberto, onde ainda encontramos tanto elementos narrativos típicos do cinema experimental e político dos anos 1960 e 1970, quanto do cinema convencional buscando o mercado, estratégia que tem seus primeiros adeptos no chamado Cinemão dos anos 1970 e reconfigurada a partir do Cinema da Retomada dos anos 1990 e 2000. Uma parte dos filmes trabalhados aqui refletem o otimismo da abertura política. Outra parte desconfia deste discurso, atentando-se às continuidades estruturais entre o período autoritário e a redemocratização. Um discurso que só voltará a aparecer com total clareza após a virada do século XX.
Bibliografia
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