Ficha do Proponente
Proponente
- Tiago José Lemos Monteiro (IFRJ)
Minicurrículo
- Tiago José Lemos Monteiro é Doutor em Comunicação pela Universidade Federal Fluminense. Desde 2010, exerce a função de Professor Efetivo do Curso de Bacharelado em Produção Cultural e da Pós-Graduação Lato Sensu em Linguagens Artísticas, Cultura e Educação do Instituto Federal do Rio de Janeiro. Atualmente, desenvolve pesquisas em torno do insólito audiovisual, com ênfase no horror artístico, no exploitation brasileiro e iberoamericano e demais cinematografias de bordas.
Ficha do Trabalho
Título
- 1975, o ano do lobisomem no Cone Sul
Mesa
- Perspectivas transversais sobre o Insólito: horror e política
Resumo
- Este trabalho explora as eventuais conexões entre o imaginário audiovisual insólito brasileiro dos anos 70 e 80 e a produção latinoamericana de língua hispânica desta mesma época. Partindo do lançamento, em 1975, de dois filmes em torno da licantropia – Quem tem medo de lobisomem?, de Reginaldo Farias, e Nazareno Cruz y el lobo, de Leonardo Favio – aqui proponho uma aproximação entre ambos, tendo como pano de fundo o turbulento contexto sociopolítico que Brasil e Argentina então vivenciavam.
Resumo expandido
- Este trabalho se insere no contexto de um questionamento sobre as eventuais conexões entre o imaginário audiovisual insólito brasileiro dos anos 1970 e 1980, e algumas de suas manifestações no âmbito da produção latinoamericana de língua hispânica deste mesmo período. O desejo de estreitar os diálogos possíveis com a produção audiovisual insólita dos países da América Latina nasce, por um lado, da identificação de lacunas substanciais no que tange à disponibilidade de reflexões acadêmicas sobre o tema a partir deste viés e, por outro, na percepção de inegáveis ressonâncias entre os respectivos imaginários, sobretudo considerando as sobreposições entre trajetórias políticas caracterizadas pela presença de regimes militares ditatoriais cuja vigência atravessa as décadas de 1960, 1970 e 1980.
De todos os “monstros clássicos”, o lobisomem talvez seja aquele que mais tenha se infiltrado na ficção audiovisual latinoamericana do século XX, dada sua presença inconteste no repertório de mitos e lendas de matriz ibérica. Curiosamente, o ano de 1975 assinala o lançamento de dois longas-metragens em torno da temática da licantropia, sendo um deles no Brasil (Quem tem medo de lobisomem?, de Reginaldo Farias) e o outro na Argentina (Nazareno Cruz y el lobo, de Leonardo Favio). Em que se pesem as muitas diferenças substanciais entre as obras, tanto em termos de estilo quanto da recepção obtida, aqui proponho uma aproximação entre ambas, tendo como pano de fundo o turbulento contexto sociopolítico que tanto Brasil (atravessando o período mais violento de sua Ditadura Militar, na transição entre os governos Médici e Geisel) quanto Argentina (na iminência do golpe que deporia Isabelita Perón e conduziria ao poder o General Jorge Videla) então vivenciavam – e que podem ressoar, de uma forma menos ou mais premente, no texto das respectivas obras.
Cada filme também articula, à sua maneira, traços característicos da produção artístico-cinematográfica hegemônica de seus países de origem, bem como a não-representatividade do horror e do insólito como gêneros ou modalidades narrativas canônicas. Quem tem medo de lobisomem? se constrói, durante boa parte de sua duração, como uma comédia picaresca de aventuras que, apenas na meia hora final, recorre a expedientes horríficos mais explícitos. Nazareno Cruz y el lobo, por sua vez, ornamenta com tintas melodramáticas a jornada de descoberta do protagonista (atravessada por personagens e cenários em muito devedores ao realismo mágico/fantástico que caracteriza uma fração expressiva da produção literária latinoamericana) – muito embora sequências como a da perseguição ao lobisomem ou da visita ao Inferno pareçam traduzir uma apropriação consciente de certos códigos de gênero mais “clássicos”.
A maneira como cada filme repercutiu à época de sua estreia e, posteriormente, se inscreveu (ou não) na historiografia audiovisual de seu respectivo país é algo que também merece uma reflexão. Quem tem medo… pode ser considerado, até certo ponto, como um título quase invisível no que diz respeito às narrativas da história do cinema brasileiro, ainda mais sob o prisma do horror e do insólito: a despeito de ser uma produção de médio porte e capitaneada por um diretor/produtor/ator egresso de alguns êxitos na seara da comédia de costumes, pode-se afirmar que seu desempenho na bilheteria não foi dos mais expressivos (menos de um milhão de espectadores, em uma época na qual o casamento entre o cinema brasileiro e seu público estava no auge). Já Nazareno… figurava como a maior bilheteria da história do cinema argentino até Relatos salvajes, em 2014, tendo pleiteado uma vaga entre os concorrentes ao prêmio de Melhor Filme Estrangeiro nos Academy Awards de 1976. A obra de Favio, entretanto, sequer é mencionada nos (escassos e pontuais) mapeamentos sobre cinema de horror na Argentina, que tendem a enfatizar nomes como Emilio Vieyra e Armando Bo, ou títulos como La casa de las siete tumbas (Pedro Stocki, 1982).
Bibliografia
- CÁNEPA, Laura Loguercio. Medo de quê? Uma história do horror nos filmes brasileiros. Tese (doutorado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Artes. Campinas, SP: [s.n.], 2008.
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RIVERO, Ángel Gómez. Cuando llora el lobo: crónica de los licantropos cinematográficos. Madrid: Alberto Santos, 2010.
RODRÍGUEZ, Carina. El cine de terror en Argentina: producción, distribución, exhibición y mercado (2000-2010). Bernal: Universidad Nacional de Quilmes, 2014.
RUÉTALO, Victoria; TIERNEY, Dolores (org.). Latsploitation, exploitation cinemas, and Latin America. London: Routledge, 2011.