Ficha do Proponente
Proponente
- Andrea C. Scansani (UFSC)
Minicurrículo
- Professora do curso de Cinema da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)
Ficha do Trabalho
Título
- Uma ilha rodeada de terras: o ostracismo paraguaio e “El pueblo”
Seminário
- Audiovisual e América Latina: estudos estético-historiográficos comparados
Resumo
- Este trabalho busca os poucos rastros deixados pelo cinema paraguaio dos anos 1960-1970 – especialmente a produção do Grupo Cine Arte Experimental idealizado por Carlos Saguier e o seu filme, “El pueblo” (1969) – como forma de olhar para aquelas cinematografias que, mesmo férteis e promissoras, não puderam florescer à sombra das violentas ditaduras que, à época, se impuseram sobre o nosso continente.
Resumo expandido
- Como seria a história do cinema latino-americano se pudéssemos escrevê-la a partir das obras que nunca chegaram a ser feitas? Se nos fosse possível analisá-las apoiadas nas ideias latentes das pessoas cujos sonhos foram esterilizados sem permissão? Ou, ainda, nos roteiros ou mesmo nos argumentos que, por terem sido gestados à sombra de regimes de exceção jamais puderam germinar? E se dentro desta utópica historiografia nos fosse possível resgatar aqueles poucos filmes que, mesmo tendo nascidos, foram logo sufocados, esquartejados e enterrados em latas comuns, sem identificação, para não serem mais abertas?
Jean-Claude Bernardet, ao comentar o filme “Você também pode dar um presunto legal” (1970-2006) de Sergio Muniz, observa: “Você demonstra uma coragem e uma liberdade na feitura do filme que me fazem pensar que se teus filmes tivessem circulado mais e se você tivesse feito mais filmes, a história do documentário brasileiro poderia ser diferente”. Se a afirmação é trágica para pensarmos o que não foi possível ser feito ou apreciado na relativamente vasta filmografia brasileira, imaginemos essa mesma verdade em países cuja perda de uma única obra – ao entrar no esquecimento compulsório – pode significar o apagamento cinematográfico crítico de uma ou mais gerações. Decerto, essas subtrações locais reverberam nas mais bem intencionadas compilações e reflexões sobre a história do cinema latino-americano, perpetuando suas ausências e reiterando nossas fragmentações.
Diante deste estado de coisas, nossa proposta tem como objetivo voltar-se para a pequena “ilha rodeada de terras” (nas palavras de seu poeta Roa Bastos), num resgate dos rastros deixados pelo cinema paraguaio dos anos 1960-1970, especialmente a produção do Grupo Cine Arte Experimental idealizado por Carlos Saguier e de seu filme, El pueblo (1969), restaurado em meados dos anos 2010. Trata-se de um média metragem que, segundo nossa aposta investigativa, foge às classificações de gênero e desfruta de um livre trânsito entre os campos do documentário, do experimental e da ficção; entre fatos e crenças; entre temporalidades materiais e atemporalidades espirituais. Essa autonomia estética, artística e política, ao mesmo tempo em que se afasta do cinema militante explícito – coordenado pelos filmes e manifestos do Nuevo Cine Latinoamericano -, parece conciliar os aspectos fundantes da mais industrial das artes com uma cosmogonia, quiçá guarani, para dar visibilidade aos ecos de uma história de resistência e árdua permanência.
Bibliografia
- BAREIRO SAGUIER, Rubén. “Paraguay”, in HENNEBELLE, G.; DRAGON, A. G. Les cinémas de l’Amérique Latine. Paris: Lherminier, 1981.
COLMÁN, A. ; LÓPEZ, M. H. “Paraguay, el país invisible”, in CUENCA, M. “Historia del audiovisual en el Paraguay”, 2009.
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ENCINA, P. “Que más valga tarde… Paraguay, su historia, su gente y el cine”. La puerta, UNLP-FBA, n. 4, 2010, p. 39-43.
LEEN, C. “The Silenced Screen – Fostering a Film Industry in Paraguay”, in DENNISON, S. Contemporary Hispanic Cinema. Suffolk: Tamesis, 2013.
SAGUIER, C. “Estreno y censura, medio siglo de El pueblo”. Correo Semanal, dez. 2019.
SAGUIER, C. Entrevista concedida para a autora, 2021.