Trabalhos Aprovados 2021

Ficha do Proponente

Proponente

    Thalita Cruz Bastos (Unisuam)

Minicurrículo

    Professora no INFNET, graduação de Cinema e Audiovisual. No Centro Universitário Augusto Motta (UNISUAM), graduação de Comunicação Social /Jornalismo. Membro do Conselho Deliberativo da SOCINE. Doutora em Comunicação Social pela UFF, com doutorado-sanduíche pela University of Reading (UK). Pesquisadora Audiovisual de imagens de arquivo, conteúdo e personagens. Pesquisa realismo no Cinema Contemporâneo, com ênfase nas relações de intermedialidade entre cinema e outras mídias. (NEX/PPGCINE/UFF).

Ficha do Trabalho

Título

    Toque e Afetos: dança, corpo e sexualidade em “E então nós dançamos”

Resumo

    “E Então nós dançamos”, de Levan Akin (2019) narra a história de descoberta sexual de Merab, bailarino do Corpo de Dança Nacional Georgiana. Nossa proposta é compreender a relação entre afetos, dança e sexualidade desenvolvidas na narrativa. As principais referências teóricas são a circulação cultural dos afetos (Ahmed), os limites da ressonância carnal através da encenação dos corpos na dança (Paasonen), a questão háptica (Vieira Jr.) e as reflexões sobre performatividade de gênero (Butler).

Resumo expandido

    No contexto mundial de 2021, e especialmente o brasileiro, a arte em suas mais variadas formas tem mostrado sua importância em agenciar afetos e manter viva e pulsante nosso desejo de encontros, de trocas de afetos enquanto sociedade. O cinema é uma das principais ferramentas de alimentar desejos e imaginários, ideais de passado, de presente e de futuro, de forma que narrativas inicialmente banais confluam intensidades expressivas e emocionais. A potência de afeto contida na performance dos corpos ganha uma outra proporção em tempos de distanciamento. Memórias sensórias e afetivas são acionadas e produzem experiências de espectatorialidade não previstas, exatamente por terem sido pensadas em um momento histórico anterior. À primeira vista o filme “E então nós dançamos”, de Levan Akin (2019), pode parecer apenas mais um filme LGBTQIA+ de amadurecimento e descoberta sexual, mas ele é muito mais do que isso. Gravado em Tbilisi, Georgia por um diretor sueco com ascendência, o filme desenvolve uma narrativa sobre sexualidade, dança e descoberta de si num dos países mais homofóbicos do mundo. Produzir um filme nesse contexto, com um ator não profissional no papel principal, sofrendo ameaças constantes durante as gravações e com baixo orçamento, o filme consegue empregar soluções belíssimas de mise-en-scène para traduzir sensações e emoções dos personagens e da narrativa através da dança, da expressão dos corpos em cena, da troca de olhares e da câmera próxima aos corpos dos atores, especialmente nas performances de dança. Uma obra sensível, resultado de pesquisa extensa por parte do diretor e realizada de forma semelhante à estética neorrealista exatamente pela impossibilidade de planejamento de locações e pelos riscos constantes, pelo uso de iluminação natural. “Um filme realizado no momento”, como define o diretor Levan Akin. “E então nós dançamos”, conta a história de Merab, bailarino do Grupo de Dança Nacional da Georgia, e que deseja ascender na sua carreira e chegar ao corpo de baile principal. Seus planos são estremecidos pela chegada de Irakli, um bailarino vindo de outra cidade, que além de performar melhor que Merab, desperta nele desejos inesperados. A narrativa se concentra no conflito vivido por Merab entre o ideal de masculinidade presente na sociedade georgiana e presentificado na Dança Georgiana como espírito da nação, da ideia de força masculina que constitui o senso comum da Georgia, e a descoberta de desejos e sensibilidades subjetivas e corpóreas que excedem os limites desse ideal de masculinidade nacionalista. A fim de compreender como a relação entre dança, cinema e sexualidade atuam no interior da obra fílmica e como essas tensões e intensidades extravasam o corpo fílmico e chegam ao corpo do espectador serão agenciados os conceitos de economias afetivas e circulação cultural dos afetos de Sara Ahmed. Além disso, a noção de ressonância carnal proposta por Susan Paasonen nos auxiliará a compreender a relação entre corpo, dança e mise-en-scène, bem como as reflexões de Erly Vieira Jr. a partir de Laura Marks sobre a dimensão háptica das imagens e sons. As questões sobre a sexualidade e as performatividades queer serão amparadas pelos estudos de Judith Butler e Sara Ahmed. A proposta desse artigo é refletir sobre como os afetos agenciados durante o filme extrapolam os limites da cena e do tempo fílmico para os corpos dos espectadores, quais memórias sensórias esses afetos evocam, especialmente num contexto de pandemia e distanciamento social em que ações simples como tocar, roçar, estar fisicamente próximo do corpo do outro se tornaram oníricas.

Bibliografia

    AHMED, Sara. The cultural politics of emotions. New York: Routledge, 2004.
    AHMED, Sara. Queer Phenomenology: orientations, objects, others. Durkham and London: Duke University Press, 2006.
    BUTLER, Judith. Problemas de gênero. Feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2020.
    MARKS, Laura. Touch: Sensuous Theory and Multisensory Media. Minneapolis: University of Minnesota Press, 2002.
    PAASONEN, Susan. Carnal Ressonance. Affect and Online Pornography. Cambridge, Massachussets: The MIT Press, 2011.
    VIEIRA JR, Erly. Exercícios do olhar, exercícios do sentir: ensaios e críticas sobre artes visuais. Vitória: Cousa, 2019.