Ficha do Proponente
Proponente
- Rodrigo Hubert Leme (UFMG)
Minicurrículo
- Atualmente cursando mestrado em artes na UFMG, sua pesquisa foca nas representações de imagens coletivas no cinema brasileiro contemporâneo. Escreveu e dirigiu alguns curtas, dentre eles Eu sou o ditador e Ferida, todos exibidos em festivais ao redor do Brasil. Foi montador dos curtas Broto e Um Estranho no Escuro e trabalhou na equipe de coordenação de pós-produção na O2 Filmes.
Ficha do Trabalho
Título
- Comunidades em negativo: caminhos da coralidade no cinema
Resumo
- A partir do entendimento do termo “coralidade” tal como empregado em diversos estudos nos campos das artes, esse trabalho evidencia a existência de instâncias corais no cinema observando suas presenças na crítica sobre o neorrealismo italiano e em cena no atual cinema documentário-ficcional brasileiro. Através dessas relações, busca-se entender as possibilidades da coralidade em tela e como suas questões se revelam pertinentes para o compreendimento de imagens coletivas no cinema nacional.
Resumo expandido
- Uma tensão entre indivíduo e coletivo que atua através do abismo entre um e outro; a impossibilidade de se representar a comunidade em cena no contemporâneo; um princípio de criação coletivo, sem hierarquias, que dissolve a autoria e a agência da composição do que está em cena; uma amplificadora de aflições individuais através da multiplicidade de vozes: a coralidade, sem dúvidas, possui diversas formas de compreensão que derivam das suas diversas maneiras de ser. Enquanto termo, surge em trabalhos, relatos e críticas nas mais diversas formas de arte, mas de formas pontuais ao longo da história. Teóricos do teatro francês vão compreender sua presença na cena contemporânea: Jean-Pierre Sarrazac e Megevánd vão explorar o termo em seus estudos sobre a cena teatral moderna e contemporânea; a revista francesa Alternatives Theatráles dedicará uma de suas edições inteiramente ao tema, com a tradução do artigo de Christophe Triau sendo particular fonte de contato para a pesquisa contemporânea da coralidade no Brasil. Autores nacionais, como Fábio Cordeiro, também vão se debruçar sobre o assunto na cena teatral brasileira.
O cinema não é estranho ao termo. A crítica italiana irá utilizar com frequência a palavra coralitá em seus textos a respeito do neorrealismo italiano. Pode-se observar as mesmas características que compõem a coralidade conforme descrita pelos autores acima no cinema de Peter Brook – não à toa também diretor de teatro – em obras como Marat/Sade, onde o próprio ato de atuar torna-se força de um processo coral quando, na narrativa, os pacientes de um hospício são colocados para encenar o assassinato de Jean-Paul Marat e, dessa forma, tornam-se aos olhos do público indivíduos unidos pela sua condição de pacientes. No Brasil, encenações que flertam com a coralidade revelam-se cada vez mais frequentes na tela grande: ficções vão se preocupar menos com protagonistas individuais e mais com a relação entre indivíduos e o grupo que compõem, como pode-se observar em Bacurau, de Juliano Dornelles e Kleber Mendonça Filho, No Coração do Mundo, de Maurílio Martins e Gabriel Martins e Corpo Elétrico, de Marcelo Caetano. Muito antes: há grande potência coral em filmes como Terra em Transe, de Glauber Rocha ou Orfeu Negro, de Marcel Camus.
A capacidade de uma imagem coral em friccionar individualidades através de um processo de tensionamento entre indivíduo e coletivo não encontra paralelos exatos no estudo do cinema nacional. Dessa forma, o trabalho tenta compreender algumas das formas em que a coralidade aparece na teoria de diferentes suportes artísticos e de meios de comunicação, do teatro à etnografia das vozes, da literatura ao cinema, para tentar evidenciar algumas de suas características em comum e apresentar algumas de suas possíveis interpretações, levantando aspectos que podem ser úteis como ferramentas para se explorar a coralidade no cinema. Tomando essa discussão como base, analisa-se a presença de imagens corais no cinema, a partir do uso do termo em italiano coralitá como presença frequente na discussão e na crítica a respeito do neorrealismo italiano, entendendo suas qualidades “fantasmagóricas” e suas particularidades no cinema. Em seguida, utilizo o termo para iniciar uma análise do cinema documental, não-ficcional e híbrido brasileiro a partir da coralidade que ele apresenta. Através dessa análise, serão evidenciadas algumas características específicas que o processo coral produz quando se encontra dentro dessa cinematografia, que dão abertura a reflexões e análises que podem por muitas vezes fugir de uma teoria tradicional do cinema.
Bibliografia
- ALSOP, Elizabeth. “The Imaginary Crowd: Neorealism and the Uses of Coralità. The Velvet Light Trap”. n. 74, p. 27–41, 2014.
CONNOR, Steven. Choralities. In: Twentieth-Century Music. Vol 13. Cambridge University Press, Londres, 2016.
LAMPERT, Cristian. “A coralidade como princípio de criação cênica: notas para uma discussão”. Santa Catarina, UDESC, 2021.
PIRRO, Robert. “Cinematic Traces of Participatory Democracy in Early Postwar Italy: Italian Neorealism in the Light of Greek Tragedy”. Disponível em: http://www.thefreelibrary.com/Cinematic+traces+of+participatory+democracy+in+early+postwar+Italy%3A…-a0218658340. Acessado em: 25 de fevereiro de 2021.
SARRAZAC, “Jean-Pierre. Léxico do drama moderno e contemporâneo”. 1ª Edição Eletrônica. COSACNAIFY. São Paulo, 2013.
TORRANO, Jaa. “O mito de Dionísio”. In: EURÍPEDES, “Bacas: O mito de Dionísio”. São paulo: Editora Hucitec, 1995.
TRIAU, Christophe. “Coralidades difratadas: a comunidade em negativo”. Alternatives théátrales p. 11, 20