Ficha do Proponente
Proponente
- Gilmar Adolfo Hermes (UFPel)
Minicurrículo
- Gilmar Hermes é professor do Curso de Bacharelado em Jornalismo da Universidade Federal de Pelotas. Graduado em Comunicação Social – Habilitação Jornalismo, pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos (1987), mestre em História e Crítica da Arte pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1996) e doutor pelo Programa de Pós Graduação em Ciências da Comunicação, na Unisinos (2005). Suas pesquisas acadêmicas tratam de temas como jornalismo cultural, cinema, artes visuais e semiótica.
Ficha do Trabalho
Título
- A “caixa” do cinema e a sociedade na abordagem jornalística de Bacurau
Resumo
- Problematiza-se os textos do jornalista e crítico de cinema Luiz Carlos Merten sobre o filme Bacurau, em 2019. Observa-se as formas de produção de sentidos sobre a produção. Nota-se o trabalho do jornalista como o compartilhamento de vivências da cultura cinematográfica, tendo em conta a obra “Filosofia da Caixa Preta” de Wilém Flusser (2002). Em decorrência da narrativa contundente, percebe-se a dificuldade para contemplar a potência do filme para a produção de sentidos.
Resumo expandido
- Este artigo faz parte de uma pesquisa sobre os textos do jornalista e crítico de cinema Luiz Carlos Merten no jornal O Estado de S. Paulo entre os anos de 2018 e 2019. Problematizando-se seus textos do ponto de vista retórico em uma análise semiótica, observa-se as formas de identificação estabelecidas com os leitores de maneira a produzir sentidos sobre os filmes tratados. Neste trabalho, é considerada a abordagem do filme Bacurau em duas oportunidades, quando ocorre a sua apresentação no Festival de Cannes, no mês de maio de 2019, e quando acontece o seu lançamento no circuito das salas de exibição brasileiras no mês de agosto do mesmo ano.
Tomando-se como referência a obra “Filosofia da Caixa Preta”, de Wilém Flusser (2002), observa-se o trabalho do jornalista como resultado de vivências no interior da cultura cinematográfica. Merten estabelece diálogos com um público mais amplo, como se estivesse a desvendar os mecanismos inacessíveis que correspondem à produção de filmes. Com o termo “caixa”, Flusser (2002) pressupõe que a mediação do aparelho fotográfico, com seus modelos e programas, leva à produção de sentidos em relação às imagens e o papel crucial delas na cultura contemporânea. No contexto desta pesquisa, é feita a analogia entre o “aparelho fotográfico” e a “indústria cinematográfica”.
Por um lado, Merten estabelece comumente em seus textos vínculos na abordagem dos filmes com a “realidade social” do contexto brasileiro. No entanto, por outro lado, também é frequente a imersão no universo cinematográfico em particular, muitas vezes, buscando estabelecer formas de identificação através da descrição dos processos criativos dos cineastas. Nesta abordagem da reportagem sobre Bacurau, o jornalista faz a imersão na “caixa” com mais evidência.
O filme “Bacurau” pode ser considerado como um dos mais importantes lançamentos do cinema brasileiro no ano de 2019, em decorrência de várias premiações, entre as quais o Prêmio do Júri, na sua participação no Festival de Cannes, e da cogitação de sua indicação para o Oscar. O jornal O Estado de S. Paulo fez inúmeras menções ao título no decorrer de 2019, entre as listas de melhores filmes, notas, reportagens, referências a eventos cinematográficos, críticas, etc.
Merten escreveu duas críticas sobre Bacurau nos meses de maio e agosto de 2019. Quando ocorreu o lançamento nos cinemas, em agosto, também produziu uma reportagem. Pelo fato do diretor Kleber Mendonça Filho ser um dos mais respeitados no Brasil atualmente, os textos são repletos de referências que remetem à carreira do diretor, seus filmes anteriores e ao próprio meio cinematográfico, com ênfase nas participações no Festival de Cannes e as cogitações para a indicação ao Oscar. Mais do que ocorre em outros textos do jornalista, estão em conta nas suas abordagens nestes textos o universo cinematográfico, a narrativa do filme e os processos de criação e produção, apesar do significado que o filme “Bacurau” tem em relação ao contexto político da atualidade brasileira.
Citando nomes célebres, o universo cinematográfico é apresentado como um círculo íntimo para o qual o leitor é convidado a participar. O jornalista usa signos como a declaração da atriz Sônia Braga em que ela dedica a sua participação no filme à vereadora Marielle Franco, morta no Rio de Janeiro no ano anterior. Também usa referências ao conceito de “western ideológico”, de Glauber Rocha, e à trilha sonora, com música de Geraldo Vandré.
Com estes signos, o jornalista faz aproximações da abordagem do filme ao contexto político atual, mas, neste caso, de forma mais indireta, apresentando sobretudo sugestões de interpretação. Em decorrência da narrativa contundente do filme, observa-se que alguns sentidos só podem ser produzidos pelos filmes e pelo cinema, cabendo aos críticos e jornalistas apenas indicar o potencial de ação dos filmes como signos.
Bibliografia
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