Trabalhos Aprovados 2021

Ficha do Proponente

Proponente

    Daniel Matos (UFMG)

Minicurrículo

    Mestre em Artes pelo Programa de Pós-Graduação em Artes da UFMG. Graduado pela mesma universidade Bacharel em Comunicação Social, com habilitação em Jornalismo. É estudante do primeiro ano do curso técnico em Teatro do CEFART/FCS. Tem interesse por cinema, televisão, dramaturgia e teatro. É integrante do grupo de pesquisa Poéticas Femininas, Políticas Feministas do PPGCOM/UFMG desde sua fundação, em 2018. Email: danielaugustodematos@gmail.com

Ficha do Trabalho

Título

    Pode a subalterna cantar? A empregada doméstica nas chanchadas

Resumo

    O universo ficcional das chanchadas é povoado por sujeitos subalternizados (SPIVAK, 2010, CATANI; AFONSO, 1983). A empregada doméstica é uma dessas personagens. Para o presente trabalho escolhemos três filmes da filmografia de Dercy Gonçalves, reconhecida por interpretar inúmeras empregadas domésticas. Partindo destes filmes este trabalho pretende compreender quais são as imagens que as chanchadas brasileiras produziram das empregadas domésticas.

Resumo expandido

    O universo ficcional das chanchadas é povoado por sujeitos subalternizados (SPIVAK, 2010). Essas comédias com números musicais produzidas no Brasil entre as décadas de 20 e 50 (AUGUSTO, 1989), além de serem um inegável fenômeno comercial, elas construíram um imaginário acerca da sociedade brasileira, por meio do seu humor satírico e carnavalesco, ridicularizando também diversas hierarquias sociais (DIAS, 1993).
    Os homens e mulheres que vivem e habitam as chanchadas são, na maioria das vezes, pessoas do povo, oriundos de classes mais baixas, trabalhadores sem vínculo empregatício, pessoas que não fazem parte de um jogo desenvolvimentista (CATANI; AFONSO, 1983) e, cujas vidas, não importam (SPIVAK, 2010).
    A empregada doméstica é uma dessas personagens. A classe de trabalhadoras se constitui a partir de uma confluência de três fatores: o gênero (FEDERICI, 2019 e ENGELS, 1984), a raça e a classe social (RONCADOR, 2008). Esta interseção revela um processo histórico, experienciado pela sociedade brasileira, que culmina na constituição da classe de trabalhadoras.
    Os atores e atrizes das chanchadas muitas vezes compartilhavam com os personagens dos filmes uma origem simples, em diálogo com o próprio gênero cinematográfico, que investia em personagens arquetípicos (o malandro, o sambista, a empregada doméstica). Um desses exemplos é a atriz que mais interpretou trabalhadoras domésticas nas chanchadas, Dercy Gonçalves. Sua filmografia é composta por diversas personagens de classe baixa e em situação de marginalização, semelhantes a vivenciadas por ela antes de trabalhar profissionalmente como atriz.
    Dercy interpretou empregadas domésticas em: Samba em Berlim (Brasil, 1943) de Luiz de Barros; Cala a boca, Etelvina (Brasil, 1958/1959), de Eurides Ramos; Minervina vem aí (Brasil, 1960) de Eurides Ramos e Hélio Barroso; Só naquela base (Brasil, 1960) de Ronaldo Lupo; Sonhando com milhões (Brasil, 1963), de Eurides Ramos. Em outras obras ela é uma figura marginalizada: uma mulher interiorana e analfabeta em Abacaxi azul (Brasil, 1944) de Ruy Costa e Wallace Downey; favelada em Depois Eu Conto (Brasil, 1956) de José Carlos Burle e Watson Macedo; costureira em Uma certa Lucrécia (Brasil, 1957) de Fernando de Barros; manicure em Baronesa Transviada (Brasil, 1957) de Watson Macedo; a procura de um homem rico para casar e ascender socialmente em Entrei de gaiato (Brasil, 1959) de J.B. Tanko e A viúva Valentina (Brasil, 1960) de Eurides Ramos e uma dona de bordel em Dona Violante Miranda (Brasil, 1960) de Fernando de Barros.
    Para o presente trabalho, Cala a boca, Etelvina; Minervina vem aí e Sonhando com milhões, filmes nos quais Dercy interpretou empregadas domésticas e com cópias disponíveis serão analisados. Partindo destes filmes e pensando o cinema como um campo de forças e um lugar no qual uma sociedade não apenas reproduz discursos, mas também cria imagens, possibilidades e narrativas, este trabalho pretende, portanto, compreender quais são as imagens que as chanchadas brasileiras produziram das empregadas domésticas. Entendendo a classe de trabalhadoras como um grupo subalternizado (SHOHAT e STAM, 2006) de quais maneiras os filmes escolhidos reiteram ou rompem com os estigmas sociais relacionados à profissão e estereótipos presentes no imaginário coletivo?

Bibliografia

    AUGUSTO, Sérgio. Este mundo é um pandeiro: a chanchada de Getúlio a JK. São Paulo: Cinemateca Brasileira: Companhia das Letras, 1989.
    CATANI, Afrânio M. e SOUZA, José I. de Melo. A chanchada no cinema brasileiro. São Paulo: Editora Brasiliense, 1983.
    DIAS, Rosangela de Oliveira. O Mundo como Chanchada: Cinema e Imaginário das Classes Populares na Década de 50. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 1993.
    ENGELS, Friedrich. A origem da família, da propriedade privada e do Estado. São Paulo: Centauro, 1984.
    FEDERICI, Silvia. O ponto zero da revolução: trabalho doméstico, reprodução e luta feminista. São Paulo: Elefante, 2019.
    RONCADOR, Sônia. A Doméstica Imaginária: literatura, testemunhos e a invenção da empregada doméstica no Brasil (1889-1999). Brasília: Editora UnB, 2008.
    SHOHAT, Ella; STAM, Robert. Crítica da Imagem Eurocêntrica. Tradução: Marcos Soares. São Paulo: Cosac Naify, 2006.
    SPIVAK. Gayatri G. Pode o subalterno falar? Belo Horizonte: Editora UFMG, 2010.