Trabalhos Aprovados 2021

Ficha do Proponente

Proponente

    Daniel Felipe Espinola Lima Fonseca (USP)

Minicurrículo

    Doutor (2021) e mestre (2016) em Cultura Audiovisual pelo PPGMPA-ECA-USP; bacharel em Comunicação Social – Habilitação em Jornalismo (2010) e especialista em Comunicação Audiovisual (2011) pela PUCPR. Foi Bolsista Capes e estagiário PAE na disciplina Teorias da Comunicação (CCA-ECA-USP). Participa do Grupo de Pesquisa CNPQ Espaço Semiótico da Cultura Audiovisual. Estuda semiótica e estética da cultura audiovisual e da cultura impressa.

Ficha do Trabalho

Título

    Historicidade sincrônica na poética audiovisual de Valêncio Xavier

Seminário

    Cinema experimental: histórias, teorias e poéticas

Resumo

    O trabalho examina dois materiais do artista multimídia brasileiro Valêncio Xavier (1933-2008): o curta-metragem em película O Corvo (1983) e o vídeo Pinturas Rupestres do Paraná (1992). Observa-se em ambos a centralidade de uma perspectiva sincrônica de historicidade a partir das relações entre as espacialidades captadas com as camadas de memória mobilizadas. As obras analisadas são articuladas com elementos da produção literária do criador.

Resumo expandido

    Uma das marcas da obra literária do brasileiro Valêncio Xavier (1933-2008) é a articulação do arquivo cultural de mídias, que garante à sua produção um caráter experimental na composição de arranjos inusitados que chocam a literatura com procedimentos de outras artes e mídias, bem como legam uma noção de leitura da historicidade a partir de um viés sincrônico. Partindo desse norte apontado por sua literatura, o presente trabalho estuda dois materiais audiovisuais do artista – que, além de autor de livros e idealizador da Cinemateca do Museu Guido Viaro (1975; atual Cinemateca de Curitiba), foi um realizador que deglutiu uma notória influência tardia dos cinemas modernos – à luz da mesma perspectiva de temporalidade.

    No curta-metragem O Corvo (1983), Xavier organiza afinidades que se reportam ao manancial tradutor que circunda o universo do poema The Raven (1845), do estadunidense Edgar Allan Poe (1809-1849). No filme, o Centro Histórico de Curitiba torna-se o cronotopo (BAKHTIN, 2018) local que mergulha na matriz universal de traduções do clássico e soturno poema narrativo. Não se trata de adaptação, mas de uma tradução criadora que se reconhece como tal e que pavimenta seu pertencimento entre os pares que se aventuraram pelo mesmo imaginário.

    Em Pinturas Rupestres do Paraná (1992), a montagem vertical estabelece analogias que aproximam o cinema, compreendido em sentido lato, da arte rupestre a partir das afinidades sincrônicas (JAKOBSON, 1974) operadas pelas texturas e sobreposições eletrônicas executadas em cima dos registros ancestrais. Por meio da deambulação do aparato de filmagem – a câmera é operada por Ozualdo Candeias, interlocução valenciana recorrente – por um sítio arqueológico no Paraná, a obra produz uma leitura singular das relações entre arte, linguagens e tecnologias. Olhando para a ancestralidade, o artista busca por uma pré-história do cinema, que é traduzida videograficamente. A produção tem um caráter ensaístico e articula um repertório que se reporta às formas fílmicas, sem se furtar a investigar especificidades do suporte eletrônico.

    Em ambos os trabalhos, traduzir o mundo a partir de seus códigos e dos meios tecnológicos que se têm à disposição numa determinada época são questões de primeira ordem: o passado, traduzido, ganha vestes contemporâneas e se projeta para o futuro. Acredita-se que o exame das obras contribua para a fortuna crítica do objeto, na medida em que investe em outros ambientes semióticos que não o da página impressa, mostrando lados diversos de um sistema criativo complexo e experimental que tomou a tradução intersemiótica como uma de suas características basilares.

Bibliografia

    BAKHTIN, Mikhail. Teoria do romance II: as formas do tempo e do cronotopo. São Paulo: Editora 34, 2018.
    FERREIRA, Jairo. Cinema de invenção. São Paulo: Azougue Editorial, 2016.
    JAKOBSON, Roman. Lingüística e comunicação. São Paulo: Cultrix, 1974.
    MACHADO, Arlindo (org.). Made in Brasil: três décadas de vídeo brasileiro. São Paulo: Iluminuras, Itaú Cultural, 2007.
    MACHADO, Arlindo. Pré-cinemas e pós-cinemas. São Paulo: Papirus, 2013.
    XAVIER, Valêncio. O mez da grippe e outros livros. São Paulo: Companhia das Letras, 1998.
    XAVIER, Valêncio. O inventivo Candeias. In: PUPPO, Eugênio; ALBUQUERQUE, Heloísa C. Ozualdo R. Candeias. São Paulo: Heco, CCBB, 2002, p. 85-86.

    Referências audiovisuais

    O CORVO. Direção, roteiro e montagem de Valêncio Xavier. Curitiba: Cinemateca do Museu Guido Viaro, Taty Filmes, 1983. 16mm, 12 min.
    PINTURAS Rupestres do Paraná. Direção de Valêncio Xavier, Fernanda Morini e Jussara Locatelli. Curitiba: Cineamericanidad, Realiza Vídeo, 1992. VHS, 24 min.