Ficha do Proponente
Proponente
- NINA VELASCO E CRUZ (UFPE)
Minicurrículo
- Professora do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e do curso de cinema da UFPE. Suas pesquisas se voltam principalmente para a relação entre a Comunicação e a Arte, mas especificamente no que diz respeito à temporalidade das imagens técnicas.
Ficha do Trabalho
Título
- Hopper e Wenders: temporalidade das imagens em “Duas ou três coisas”
Mesa
- Hibridismos e formas impuras: temporalidades e estéticas da imagem
Resumo
- O curta-metragem em 3D “Duas ou três coisas que eu sei sobre Hopper”, dirigido por Wim Wenders e exibido como uma instalação, servirá aqui como ponto de partida para discutirmos a questão da temporalidade na pintura de Hopper e sua relação com o tempo cinematográfico de Wenders. O dispositivo do tableau vivant será a chave para essa discussão, bem como os conceitos de instante pregnante e gesto.
Resumo expandido
- A relação entre as pinturas do artista americano Edward Hopper e o cinema já foi tema de artigos, seminários e ensaios cinematográficos. Parece evidente que há algo de cinematográfico em suas pinturas, que remetem especialmente a uma ambientação e uma iluminação dos filmes noir, contemporâneos à obra do pintor. Sabe-se, inclusive, que Hopper era assíduo frequentador das salas de cinema, espaço que foi tema de algumas de suas pinturas (como New York Movie, de 1939), e que era um cinéfilo adorador de filmes policiais, de suspense e de terror (FOUBERT, 2012). Não é de se espantar que alguns cineastas façam referências indiretas ou diretas a suas pinturas, como é o caso de Wim Wenders, que se diz inspirado pelo pintor americano desde que o “descobriu”, no início da década de 70, quando visitou pela primeira vez os museus nova-iorquinos Whithney e MOMA.
O curta-metragem em 3D “Duas ou três coisas que eu sei sobre Hopper”, dirigido por Wim Wenders e apresentado na exposição “Edward Hopper” (Fondation Beyeler, jan. a jul. 2020), atesta mais uma vez o interesse que a pintura de Hopper desperta em diversos cineastas. Partindo de algumas telas conhecidas do artista, Wenders constrói uma pequena narrativa ao criar tableaux vivants conectados entre si de forma sutil, mantendo, no entanto, a abertura de sentido contida nas pinturas a que faz referência. Trata-se, na verdade, de uma videoinstalação, já que Wenders ressalta a importância de que o filme não seja exibido em uma sala de cinema, mas sim em um museu, no contexto da exposição.
A videoinstalação reflete uma tendência recorrente da arte contemporânea em que imagens em movimento convivem com imagens fixas, coabitando exposições de pinturas, exposições fotográficas, e bienais de arte: o “efeito cinema” descrito por Philippe Dubois (2009). Não apenas obras cinematográficas são ressignificadas ao serem expostas em galerias e museus, como uma série de trabalhos artísticos tematizam o cinema, seja através do uso de seu aparato técnico ou em instalações que se apropriam de filmes de diversas formas diferentes.
Essa tendência coincide também com outro fenômeno já bastante discutido e que tem se intensificado ao longo dos anos 2000, o da hibridização dos meios: o surgimento e proliferação de entre-imagens (BELLOUR, 1997). Ao apresentar a ideia de “entre-imagem”, Bellour evoca a potência do congelamento da imagem no cinema, chamada por ele “tomada fotográfica do filme” (BELLOUR, 1997, p. 13) e percebe uma coincidência entre a invasão do fotográfico no cinema da virada da década de 60 e as transformações que surgiram com a imagem eletrônica do vídeo. Esse conceito, que pode parecer datado, já que possui quase três décadas (o livro foi publicado pela primeira vez em 1990) passa a ter sua acepção renovada na contemporaneidade pelos atravessamentos que a imagem digital proporciona (FATORELLI, 2013). Hoje, estamos diante de uma miríade de possibilidades de hibridizações entre fotografia, cinema, vídeo e digital e falar da especificidade de cada linguagem se torna anacrônico e pouco produtivo. É nesse contexto que as passagens entre as imagens fixas e as imagens em movimento se proliferam, tanto nas práticas vernaculares (vide gifs, stories, boomerangs) como nas produções da indústria do entretenimento e nas práticas artísticas.
É nesse contexto que a prática do tableau vivant reaparece com uma recorrência significativa. A dialética entre imagem estática e imagem em movimento é certamente uma das características mais fundamentais do que estamos considerando que seja o “dispositivo tableau vivant”. Pretendemos aqui relacionar esse dispositivo ao conceito de gesto, de forma a analisarmos as tensões entre pintura e cinema, imagem estática e imagem em movimento, na versão animada das pinturas de Hopper criada por Wim Wenders.
Bibliografia
- AGAMBEM, G. “Notas sobre o gesto” In: AGAMBEM, G. Meios sem fim: notas sobre a política. Belo Horizonte: Editora Autêntica, 2017.
BELLOUR, R. Entre-imagens: foto, cinema, vídeo. São Paulo: Papyrus, 1997.
FOUBERT, J. Edward Hopper : film criminel et peinture. Transatlantica: Revue d´études américaines. v. 2, n. 2, 2012.
LESSING, G. E. Laocoonte, ou sobre as fronteiras da pintura e da poesia. São Paulo: Editora Iluminuras, 1998.
MACHADO, A. Pré-cinemas e pós-cinemas. São Paulo: Papirus, 1997.
POIVERT, M. La Photographie Contemporaine. Paris: Flammarion, 2010.
_____________ .« Notes Sur l´Image Performée » In : Les Tableaux vivants ou l´image performée. Catálogo co-editado pelo INHA (Institut National d´Histoire de l´Art) e Mare &Martin, 2015.
WENDERS, Wim. Entrevista “Wim Wenders influencié par Hopper”, 2012. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=SakYrQaOLJQ Acesso em: 23/04/2020