Ficha do Proponente
Proponente
- Rafael de Luna Freire (UFF)
Minicurrículo
- Professor no Departamento de Cinema e Vídeo e no Programa de Pós-Graduação em Cinema e Audiovisual da Universidade Federal Fluminense. Coordenador do Laboratório Universitário de Preservação Audiovisual (Lupa-UFF).
Ficha do Trabalho
Título
- Paz e Amor (1910): reexaminando os filmes cantantes e a “Bela época”
Seminário
- Cinema no Brasil: a história, a escrita da história e as estratégias de sobrevivência
Resumo
- Apesar dos filmes cantantes – em que artistas dublavam as projeções, ao vivo, atrás da tela – constituírem um objeto já largamente analisado pelos historiadores, eles ainda sofrem de várias limitações. O objetivo dessa comunicação é trazer uma nova interpretação sobre a origem e o fim da chamada Bela época do cinema brasileiro, particularmente dos cantantes, assim como aprofundar a análise de “Paz e amor”, com novos elementos que ampliam nossa compreensão sobre seu impacto e características.
Resumo expandido
- Apesar dos filmes cantantes – em que artistas dublavam as projeções, ao vivo, atrás da tela – constituírem um objeto já largamente analisado pela historiografia do cinema brasileiro (Araújo, 1976; Souza, 2004; Costa, 2008; Pereira, 2014), eles ainda sofrem de duas limitações básicas. A primeira é resultado de estarem inseridos dentro do período da chamada “Bela época do cinema brasileiro”, entre 1908 e 1911, cuja conceituação já foi questionada (Bernardet, 1995; Souza, 2004), mas que ainda carece de maiores explicações sobre as causas desse momento marcado pelo inegável aumento e posterior declínio na produção de filmes na cidade do Rio de Janeiro.
A segunda se deve à restrita pesquisa sobre eles para além do pioneiro levantamento de informações de Vicente de Paula Araújo (1976), o que fica evidente pelos estudos acerca do mais bem-sucedido de todos os filmes cantantes, “Paz e amor”, não terem até hoje ido muito além do que esse autor – e antes dele, Magalhães Júnior (1971) – escreveram, como comprovam Moura (1987), Velloso (1996) ou Costa (2008).
O objetivo dessa comunicação, portanto, é trazer uma nova interpretação sobre a origem e o fim da chamada “Bela época”, particularmente dos “filmes cantantes”, assim como aprofundar a análise de “Paz e amor”, com novos elementos que ampliam nossa compreensão sobre seu impacto e características.
A partir de nosso estudo sobre a distribuição de filmes nesse período, elaboramos a hipótese de que o aumento da produção local foi resultado da tentativa de diferenciação dos exibidores frente à escassez de filmes novos estrangeiros. Em 1908, a empresa Marc Ferrez & Filho obteve enorme êxito fechando contrato com exibidores como Arnaldo Gomes de Souza, Jácomo Rosário Staffa, Cristovão Guilherme Auler, Paschoal Segreto, entre outros, para o aluguel de filmes inéditos da Pathé Frères, baseado no contrato de representação exclusiva para o Brasil obtido por essa firma. Esse processo de certo modo homogeneizou a programação dos melhores cinemas da cidade, num momento em que, mesmo nos Estados Unidos, a oferta de novos filmes por importadores e distribuidores era inferior à demanda dos exibidores (Musser, 1990).
Embora essa “escassez” de filmes novos tenha estimulado a produção local – como exemplificado pelos filmes de Ferrez e Leal, produzidos para o cinema Pathé e o Cinema-Palace, respectivamente –, entendemos os filmes cantantes não simplesmente como um tipo ou gênero de filme nacional, mas como um “modo de apresentação”, colocado em prática particularmente (mas não apenas) por Auler, proprietário do Cinema Rio Branco, para diferenciar sua sala dos concorrentes. Entre 1908 e 1909, além de dar início à produção própria, Auler apresentou como “cantante” filmes estrangeiros que eram projetados normalmente (isto é, acompanhados pelos músicos da sala) em outros cinemas.
Por fim, as explicações para o declínio dos filmes cantantes em 1911, ao invés de serem localizados em fatores externos supostamente responsáveis pelo fim da “Bela época” como um todo, podem ser melhor buscadas dentro do circuito de diversões e entretenimentos carioca. Defendemos como causas para seu declínio, dentre outros fatores, a substituição dos filmes cantantes pelo chamado “teatro por sessões” a “preços de cinema”, que seria explorado pelos mesmos empresários responsáveis pela produção de cantantes (Serrador, Segreto, Auler).
Nossa análise do filme Paz e Amor pretende demonstrar ainda como individualmente os filmes cantantes também foram insuficientemente analisados. Iremos apresentar um conjunto mais amplo de fontes que revela o caráter profundamente intermidiático desse cantante (sua ligação com o teatro, imprensa, literatura e o próprio cinema), suas tensas relações com as autoridades políticas do país, e as questões raciais que o atravessam através do seu protagonista, o personagem fictício do coronel Tibúrcio da Anunciação.
Bibliografia
- Araújo, Vicente de Paula. A bela época do cinema brasileiro. São Paulo: Perspectiva, 1976.
Bernardet, Jean-Claude. Historiografia clássica do cinema brasileiro. São Paulo: Annablume, 1995.
Costa, Fernando Morais da. O som no cinema brasileiro. Rio de Janeiro: Sette Letras, 2008.
Magalhães Júnior, Raimundo. O fabuloso Patrocínio Filho. 2ª ed. São Paulo: Lisa, 1971.
Moura, Roberto. “A bela época (primórdios-1912)”. In: Fernão Ramos (org.). História do cinema brasileiro. São Paulo: Círculo do Livro, 1987.
Musser, Charles. The Emergence of Cinema: The American Screen to 1907. New York: Charles Scribner’s Sons, 1990.
Pereira, Carlos Eduardo. A música no cinema silenciosos brasileiro. Rio de Janeiro: Museu de Arte Moderna, 2014.
Souza, José Inácio de Melo. Imagens do passado: São Paulo e Rio de Janeiro nos primórdios do cinema. São Paulo: Senac, 2004.
Velloso, Mônica Pimenta. Modernismo no Rio de Janeiro. Turunas e quixotes. Rio de Janeiro, Editora da Fundação Getúlio Vargas, 1996