Trabalhos Aprovados 2019

Ficha do Proponente

Proponente

    Simplicio Neto Ramos de Sousa (ESPM)

Minicurrículo

    Diretor e Roteirista de documentários como “Onde a Coruja Dorme” e “Carioca era um Rio”. Bacharel em Ciências Sociais pela UFRJ, Mestre e Doutor em Comunicação pelo PPGCOM-UFF. Pesquisa o realismo no cinema brasileiro. Foi Professor Substituto no Dep. de Cinema e Video da UFF, de 2008 a 2010. Hoje é Professor Assistente I do Curso de Cinema e Audiovisual da ESPM-Rio. Curador e Editor de Catálogo de Mostras nos CCBBS, como “Cineastas e Imagens do Povo” e “Os múltiplos lugares de Roberto Farias”.

Ficha do Trabalho

Título

    Cor e Tela Panorâmica no Cinema Novo: imersão e distanciamento

Seminário

    Exibição cinematográfica, espectatorialidades e artes da projeção no Brasil

Resumo

    A adoção do “filme colorido” e, em alguns casos, de “formatos panorâmicos” por cineastas ligados ao Cinema Novo, decisão vista como garantia de maior público, depois de um período de dificuldades com o circuito exibidor, é o objeto de nossa investigação. Trata-se de um fenômeno que une questões de linguagem, gênero, e recepção do público. Já detectado por outros teóricos num viés “autorista”, mas revisto agora pela chave dos estudos da exibição cinematográfica.

Resumo expandido

    Nosso estudo se concentra na percepção de um fenômeno social e estético que une questões de linguagem, gênero, recepção e exibição. A adoção do “filme colorido”, geralmente pelo processo Eastmancolor, e, mesmo em alguns casos, de “formatos panorâmicos” de exibição, por cineastas ligados ao Cinema Novo no final dos anos 60. Algo que seus autores tomavam como garantia de “comunicação” com o público, depois de um período de dificuldades com as bilheterias e o circuito exibidor. Na dita “fase alegórica” do movimento, vemos uma série de filmes com alegorizações de vies político, inspirados pela "Terra em Transe" (1967) de Glauber Rocha, e depois pela luta, colorida e em Widescreen, do "Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro" (1969) – que deu a Rocha a Palma de Ouro de Direção em Cannes. Filmes que ostentam a marca “Eastmancolor” nos materiais de divulgação como “Macunaíma"(Joaquim Pedro, 1969), "Pindorama", (Arnaldo Jabor, 1971) e "Os Deuses e os Mortos" (Ruy Guerra, 1971), ou mesmo "Brasil Ano 2000" (Walter Lima Jr, 1969) – que divulgava o processo “Tropicolor”-, abrem também a linha de um "cinema de metáforas", como chamou então Jean Claude Bernardet (2011). A adesão ao que Bertolt Brecht chamava de “realismo amplo”, pleno de alegorias sobre a realidade social, por complexas que fossem, significava "também a aspiração a um cinema mais didático", para Jean-Claude. E para chegar ao público, esse cinema tinha que ser ao mesmo tempo "didático e espetacular", dimensão entendida aqui, não como um aceno a narrativa mais convencional, hollywoodiana. O “espetacular” se via mais na adoção de orçamentos maiores, associados a uma atualização tecnológica do parque de projeção do cinema no Brasil. Tecnologias mais caras de produção e exibição resultariam em impacto comercial, trazendo o povo para as salas, pensava-se. Seriam estratégias inevitáveis, para fazê-lo aceitar e apreciar as inovações formais de tais obras, em termos de linguagem e narrativa, como os efeitos de distanciamento brechtiano próprios do Cinema Moderno de então. Afinal, tais procedimentos eram uma adicional forma de atualização, mas no campo estético. Por isso, esse tipo de filme é chamado de "alegoria-espetáculo", por Fernão Ramos (1987). Com essa pesquisa levantaremos mais informações, e questões, sobre como se deu essa junção, a princípio incompatível, entre alegoria e espetáculo, entre o uso de “efeitos de distanciamento”, e anti-ilusionismo, como preconiza Brecht, e o momento da explosão técnica e comercial do “filme colorido” e do “widescreen”, promessa de maior “imersão” do espectador. Levantamos a hipótese de que há maior complexidade nesse processo além de meras coincidências. Procuramos entender como filmes ao estilo de "Dragão da maldade", dialogavam em termos de técnica cinematográfica e de intertextualidade de gênero e narrativa com outros “nordesterns” comerciais do período, mais até do que com outras alegorias-espetáculos cinemanovistas. Falamos aqui de outros filmes-espetáculo, de cangaço, feitos em “formatos panorâmicos”, imersivos, como “Entre o amor e o cangaço” (1965) de Aurélio Teixeira. Ou em Eastmancolor, como "A morte comanda o Cangaço" (1961) de Carlos Coimbra. Ou, como o caso especial de "Quelé do Pajeu" (1969), de Anselmo Duarte, filmado em 35mm anamórfico e ampliado para 70mm em um laboratório na Espanha. Nesses “nordesterns” também vemos algum nível de conciliação, se não entre o efeito de distanciamento brechtiano e o efeito de imersão no espetáculo Widescreen e Eastmancolor, mas entre o espetáculo visual e alguma outra forma, mais popular, de alegoria. Com um maior entendimento, de apelo massivo, da vida social brasileira. Tipo de esforço que o próprio Glauber Rocha havia testemunhado, ainda em começo de carreira, no pioneirismo de Roberto Pires, seu colega de Iglufilmes, na Bahia, ao querer criar tanto um cinema de gênero, brasileiro e moderno, como também o pioneiro formato “Igluscope”, o Widescreen baiano, em “Redenção” (1958).

Bibliografia

    AUTRAN, Arthur. As concepções de público no pensamento industrial cinematográfico. Revista FAMECOS. Porto Alegre, n. 36, p. 84-90, ago. 2008.
    BERNARDET, J.C. Trajetória Crítica. São Paulo: Martins Fontes, 2011.
    HIRSZMAN, Leon. É bom falar! In: CALIL, Carlos Augusto (Org.). Mostra Leon Hirszman – CineSesc. São Paulo: SESC, 2005.
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