Ficha do Proponente
Proponente
- Jéssica Patrícia Soares (UFRGS)
Minicurrículo
- Jéssica Patrícia Soares é mestranda em Comunicação na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, sob orientação da Professora Drª. Miriam de Souza Rossini, e graduada em Jornalismo pela ULBRA. Vinculada ao Grupo de Pesquisa Processos Audiovisuais (PROAv UFRGS), é bolsista do CNPq e atualmente estuda o cinema de horror contemporâneo e seu movimento no Brasil.
Ficha do Trabalho
Título
- Horror cotidiano: O social e político nos filmes brasileiros de horror
Resumo
- Partido de exemplos fílmicos como As Boas Maneiras (2017) e Animal Cordial (2017), esse trabalho propõe uma discussão sobre o cinema de horror produzido atualmente no Brasil, através da contribuição de autores como Carlos Primati e Laura Cánepa. Este trabalho parte da dissertação de mestrado que visa compreender como essas narrativas discutem questões de ordem política e social do país no presente, temáticas latentes nos filmes nacionais do gênero produzidos na última década.
Resumo expandido
- O cinema brasileiro vivencia um crescimento na realização de filmes de horror a partir da última década, uma produção que apresenta particularidades que permitem visualizar uma certa continuidade neste cinema de gênero no país. O interesse deste trabalho é refletir sobre esse movimento atual, marcado por filmes de narrativas mais abertamente políticas e centrados em um horror do cotidiano, de atritos interpessoais e suas consequências em meio a contextos urbanos fortemente relacionáveis à realidade do espectador.
O horror como gênero cinematográfico é marcado por ciclos temporais que constituem sua filmografia, apresentando características específicas em uma “série de filmes associados entre si através de imagens compartilhadas, personagens, configurações, enredos e temas” (PEIRSE apud KLEIN, p. 4). Além de estabelecer um elemento essencial na compreensão do horror cinematográfico, os ciclos são indicativos dos momentos históricos e sociopolíticos no qual estão inseridos, reflexo do que Kracauer (1947) pondera sobre como os filmes de uma nação refletem sua mentalidade de um modo mais direto que qualquer outra produção artística. Exemplos desse diálogo são vistos em todos os ciclos, como a recente vertente do found footage, que trouxe ao gênero a realidade hipervigiada e virtual que reflete no excesso de registros videográficos caseiros e na disseminação deste material em redes sociais digitais.
Ao considerarmos o cenário nacional, não há uma continuidade na produção do gênero de horror, dificultada por diferentes problemáticas, como questões de ordem política e orçamentária (CÁNEPA, 2008). Assim, esse crescimento atual possibilita analisar a formação de um movimento cinematográfico de horror, aspecto no qual esta pesquisa busca debruçar-se para entender as particularidades desse conjunto de filmes e se há, efetivamente, o início de um ciclo de horror propriamente nacional.
Neste panorama, é possível destacar títulos que alcançaram reconhecimento no circuito de festivais, como As Boas Maneiras (Juliana Rojas e Marco Dutra, 2017), vencedor de cinco prêmios no Festival do Rio 2017, e Animal Cordial (Gabriela Amaral Almeida, 2017), um dos 22 filmes selecionados para a lista de candidatos brasileiros ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro. Tais obras não são classificadas somente como filmes de horror, porque transitam entre outros gêneros cinematográficos, uma tendência nas produções contemporâneas que exploram o horror em diálogo com diferentes possibilidades narrativas.
Igualmente destaca-se um caráter político na abordagem de temáticas relativas à questões caras ao nosso tempo, como gênero, raça e classe social. Em As Boas Maneiras, o tensionamento racial é latente e atravessa toda a obra, do mesmo modo que confronta a desigualdade social a partir das duas protagonistas, uma patroa branca de classe média alta e uma empregada doméstica negra, moradora da periferia. As situações em que ambas interagem é a principal origem de inquietude da narrativa, mesmo em relação ao crescimento de um bebê lobisomem na barriga da personagem Ana (Marjorie Estiano). Já Animal Cordial exacerba a intolerância em um cenário cotidiano, a partir de uma narrativa que aborda a forte estratificação social da sociedade brasileira e a violência legitimada por determinados discursos. A produção traz a figura do ser humano como monstro, capaz de provocar uma perturbação no senso de realidade do espectador, que vê na tela um acontecimento banal transformar-se em carnificina. Nesse contexto, é possível analisar o personagem Inácio (Murilo Benício) à luz das discussões sobre a figura do “cidadão de bem” no Brasil, e de como determinados discursos que tem criado forma no país legitimam as ações violentas e autoritárias do protagonista. O trabalho parte da dissertação de mestrado que está em andamento junto ao Programa de Pós-Graduação em Comunicação da UFRGS, com bolsa do CNPq e apoio da CAPES.
Bibliografia
- CÁNEPA, Laura. Medo de quê? Uma história do horror nos filmes brasileiros. Tese de doutorado do Programa de Pós-Graduação em Multimeios do Instituto de Artes da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). 2008.
DORIA, Kim Wilhelm. O Horror Não Está no Horror: Cinema de Gênero, Anos Lula e Luta de Classes no Brasil. Dissertação de mestrado – USP, São Paulo, 2016.
LOWESTEIN, A. Schocking Representation: Historical trauma, national cinema and the modern horror film. Columbia University Press, 2005.
KRACAUER, Siegfried. De Caligari a Hitler: uma história psicológica do cinema alemão. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1988.
NDALIANIS, Angela. The Horror Sensorium: Media and the Senses, Jefferson: McFarland & Company, 2012.
PEIRSE, Alison. After Dracula: The 1930s Horror Film. Londres: I.B.Tauris. 2013.
PRIMATI, Carlos. O filme de horror brasileiro: anatomia de uma transformação. Catálogo da Mostra “Medo e Delírio no Cinema Brasileiro Contemporâneo”. Belo Horizonte, 2014, p. 08-17.