Ficha do Proponente
Proponente
- Alexandre Camargo Scarpelli (UFSCar)
Minicurrículo
- Alexandre Scarpelli é graduado em Audiovisual pela ECA-USP e mestrando do Programa de Pós-graduação em Imagem e Som da UFSCar (PPGIS). Sob orientação da Professora Dra. Suzana Reck Miranda, desenvolve pesquisa de mestrado sobre o som e a música em filmes brasileiros de ficção científica. Músico graduado pelo Conservatório Musical Souza Lima, atuou como compositor musical e como editor de som em curtas e longas documentários e de ficção.
Ficha do Trabalho
Título
- Bomba de som e música: o discurso distópico de Branco Sai, Preto Fica
Seminário
- Estilo e som no audiovisual
Resumo
- Este trabalho pretende observar qual é o papel do som e da música na construção do discurso fílmico de Branco Sai, Preto Fica (2014, Adirley Queirós) especificamente naquilo que o configura como narrativa de ficção científica – em termos gerais, quanto à essência do gênero – avaliando, ao mesmo tempo, de que forma som e música cristalizam elementos particulares da mitologia brasileira de ficção científica.
Resumo expandido
- O filme Branco Sai, Preto Fica (2014), de Adirley Queirós, constrói o cenário da cidade de Brasília em um futuro próximo, indefinido, distópico e violento. Apesar do hibridismo com a linguagem documental, pode ser entendido como uma obra de ficção científica brasileira.
Nesse sentido, nota-se um importante papel do som e da música no desenvolvimento do caráter extrapolativo da estória: uma das motivações principais dos personagens do enredo é explodir o Palácio do Planalto com uma bomba de som e música, construída com sucata tecnológica e composta de paisagens sonoras e músicas da região da Ceilândia, populares e socialmente marginalizadas. Percebe-se, também, a confecção de sons para diversos elementos tecnológicos do filme – precários, em consonância com a estética de distopia “terceiro-mundista” – e a “polícia do bem-estar social”, autoridade policial cuja presença se dá exclusivamente na banda sonora; apenas para citar alguns exemplos de elementos sonoros e musicais que compõem o filme.
No entanto, trata-se de uma narrativa de ficção científica não apenas (propositalmente) distante das convenções norte-americanas, mas, imbuída de questões estéticas e sociais pertinentes à realidade brasileira. Avaliar essa obra nos mesmos paradigmas pelos quais são observados filmes canônicos da ficção científica internacional pode acentuar ainda mais a desvalorização da ficção científica brasileira perante obras consideradas “modelares” do gênero. São necessárias outras perspectivas quanto às funções do som e da música em um filme de ficção científica.
Sendo assim, este trabalho pretende observar o papel do som e da música na construção do discurso fílmico de Branco Sai, Preto Fica, especificamente naquilo que o configura como narrativa de ficção científica, mas, ao mesmo tempo, pautando-se por especificidades da ficção científica brasileira.
Primeiramente, faz-se oportuna a utilização de teorias da ficção científica, adaptáveis a diferentes mídias e diversos contextos culturais e que buscam encontrar no discurso a essência definidora do gênero. Os elementos ausentes que estimulam a imaginação especulativa (ANGENOT, 1979), a composição do fator de estranhamento cognitivo e suas potencialidades críticas (SUVIN, 1972) e a abertura a uma grande variedade de formas podem ser alcançadas lançando mão de teorias próprias da investigação acerca do gênero. Ao considerar som e música como elementos constituintes do discurso fílmico, pode-se compreender melhor seu papel na composição dessa essência discursiva do gênero.
Mais especificamente, pretende-se avaliar o trabalho de som e música do filme com foco nos aspectos mais pertinentes à ficção científica brasileira, sua mitologia, seus temas e ícones específicos. Mary Elizabeth Ginway, em seu livro Ficção Científica Brasileira, investiga obras literárias de várias fases do gênero entre 1960 e 2000 sob uma perspectiva que considera esses textos como parte de um discurso maior sobre nacionalidade e mitos culturais (GINWAY, 2005). Apesar de estudar majoritariamente obras literárias, Ginway entende seus objetos de maneira ampla, como artefatos culturais, realizando um mapeamento que serve de suporte a este trabalho.
Pretende-se demonstrar, portanto, que o desenho de som e as estratégias musicais de um filme brasileiro de ficção científica – mesmo afastando-se das convenções sonoras de sua contraparte anglo-americana – continuam em harmonia com aspectos essenciais do discurso narrativo que caracteriza o gênero, ao mesmo tempo em que cristalizam elementos particulares da mitologia brasileira de ficção científica.
Esta pesquisa aponta para uma análise sonora que escape da busca pela iconografia e estratégias formais da tradição anglo-americana de filmes do gênero, procurando observações mais adequadas a cinematografias de ficção científica externas à hollywood, como a europeia, a latino-americana de maneira geral e, especificamente no recorte deste trabalho, o cinema brasileiro de ficção científica.
Bibliografia
- ANGENOT, M. The Absent Paradigm: An Introduction to the Semiotics of Science Fiction (Le Paradigme absent, éléments d’une sémiotique de la SF). Science Fiction Studies (1979) Volume: 6, Issue: 1, Pages: 9-19
CHION M. Audio-Vision: Sound on Screen. Columbia University Press, 1994
GINWAY, M. Elizabeth. Ficção Científica Brasileira: Mitos culturais e nacionalidade no país do futuro. São Paulo: Devir, 2005
GORBMAN, C. Unheard Melodies: Narrative Film Music. Indiana University Press, 1987
SUPPIA, A. “Acesso negado: circuit bending, borderlands science fiction e lo-fi sci-fi em Branco Sai, Preto Fica” Famecos, Porto Alegre, v. 4, n.1, janeiro, fevereiro, março e abril de 2017
_______. Atmosfera Rarefeita: A ficção científica no cinema brasileiro. São Paulo: Devir, 2013
SUVIN, D. On the Poetics of the Science Fiction Genre. College English, Vol. 34, No. 3 (Dec. 1972), pp. 372-382
WHITTINGTON, W. Sound Design and Science Fiction. University of Texas Press, 2007