Trabalhos Aprovados 2019

Ficha do Proponente

Proponente

    richard dos anjos tavares (PUCRS)

Minicurrículo

    Mestrando em comunicação social na PUCRS, é formado em Cinema também pela PUCRS. Atua como roteirista, diretor e diretor de arte. É corroteirista do filme Rifle (67ª Berlinale – Fórum), Melhor Roteiro no 49º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro. Dirigiu os curtas Gaveta (28º Festival de curtas de São Paulo), Garry (CineBH 2012), Na hora dos Morcegos (21º Cine Vitória). Em 2012 foi selecionado pelo Talent Campus/BAFICI. É um dos idealizadores do Festival Diálogo de Cinema de Porto Alegre.

Ficha do Trabalho

Título

    Fantasmas, rastros e memórias. 10 anos do filme de André Novais.

Resumo

    Fantasmas, curta-metragem realizado por André Novais Oliveira está prestes a completar uma década. Desde a sua primeira exibição na Mostra de Tiradentes em 2010, o filme gera debates em torno de sua forma e sobre sua maneira concisa de discutir um tema através da linguagem audiovisual. Uma história simples e direta que funde realizador e personagem, propondo ao espectador a um diálogo denso e ao mesmo tempo irônico sobre rastros e memória.

Resumo expandido

    A geração formada após a consolidação do que ficou conhecido como novíssimo cinema brasileiro acabou por construir uma nova e complexa cadeia de produção de curtas-metragens. São muitos os fatores que contribuíram para que o novíssimo obtivesse reconhecimento como um importante momento dentro da história do cinema brasileiro. Para enumerá-los é preciso estabelecer uma forma de classificar o que se entende por Novíssimo.
    “É o caso de pensar menos em um movimento, como em geral se organiza a historiografia do cinema, e mais em um momento, uma geração, ou segmentos dela, aglomerada aqui pela proximidade temporal de afinidades cinematográficas que não necessariamente compartilham o mesmo espaço físico.” (Arthuso, 2015.)

    Isto posto, pode-se então citar alguns dos motores que tornaram possível este importante momento. São eles: a facilitação do acesso e da operação dos equipamentos audiovisuais por conta da evolução das tecnologias digitais; a obtenção de orçamento através políticas públicas voltadas para o audiovisual; a descentralização que permitiu um maior alcance da linguagem cinematográfica; a expansão dos cursos de cinema e a ampliação do circuito de festivais que passaram a abarcar a produção universitária.
    Desse contexto surge em 2010 o curta-metragem Fantasmas, dirigido por André Novais Oliveira. Vê-se durante todo o filme em um enquadramento estranho em uma esquina mal iluminada, um posto de gasolina e carros subindo e descendo a rua do que parece ser uma região periférica de uma grande cidade. Ouve-se então o diálogo despretensioso entre dois amigos carregados de sotaque mineiro, eles conversam sobre temas cotidianos como a próxima partida de futebol, o paradeiro de velhos amigos do bairro e talvez o mais relevante dos seus assuntos: uma dívida no valor de dez reais. No momento em que um deles descobre uma câmera de vídeo, entende-se então que a estranha imagem está sendo registrada, junto de todo o áudio da conversa. Se estabelece então a ideia da ausência do privado. O personagem se usa do mesmo artifício que o realizador: registrar uma ideia e transpor a subjetividade da angustia particular para a narração audiovisual, usando como ferramenta uma simples câmera de vídeo.
    “Essa câmera funciona como uma espécie de câmera de vigilância para seu dono, na verdade uma câmera de confirmação de suspeita, sem, no entanto, ter nada a ver com proteção do posto ou da casa do rapaz. O rapaz quer apenas uma prova de que sua ex-namorada de meses passa por ali. Uma vizinha parece tê-la visto. Ele quer uma confirmação. Por que? Para que? Não importam as respostas ou bom senso. Ele apenas precisa ver essa imagem. Para depois esquecê-la.” (Cleber Eduardo, revista cinética 2010)

    A inteligibilidade com que André Novais conduz a metalinguagem, torna este filme de ficção uma espécie de documento comprobatório da relevância do novíssimo e abre caminho para que demais obras afluentes desaguem no mar do cinema brasileiro contemporâneo.
    O curta-metragem toma um certo cuidado com o espectador por não subestilmá-lo. A imagem despretensiosa se torna instigante por conta da potência narrativa e de sua proximidade com o real, abrindo mão de virtuosidade imagética e de técnicas que se empregadas soariam apenas como amparo na atração do olhar. O filme causa interesse pela crueza na forma de se comunicar.
    “O espectador também age, tal como aluno ou intelectual. Ele observa, seleciona, compara, interpreta. Relaciona o que vê com muitas outras coisas que viu em outras cenas, em outros tipos de lugares. Compõe seu próprio poema com os elementos do poema que tem diante de si.” (Rancière, 2012).

    Os filmes podem ser independentes, tais como seus espectadores. E os trajetos que diluem a faísca motivacional de cada história devem instigar a comunicação e não interferi-la. Fantasmas é um exemplo bem sucedido porque mantém em sua gênese uma estrutura de emoção primária que por vezes parece se perder no processo de realização de um curta-metragem.

Bibliografia

    ARTHUSO, Raul Lemos. Cinema independente e radicalismo acanhado: ensaio sobre o novíssimo cinema brasileiro. São Paulo, 2016. Dissertação (Mestrado) – Programa de pós-graduação em Meios e processos audiovisuais – Escola de Comunicações e Artes / USP;

    BERNARDET, Jean-Claude. O Autor no Cinema. São Paulo: Brasiliense, 1994;

    CALVINO, Ítalo. Seis propostas para o próximo milênio. São Paulo: Companhia das letras, 2004.
    EDUARDO, Cleber. Mais que plano único. 2010. Disponível em http://www.revistacinetica.com.br/taurifantasmas.htm;

    OLIVEIRA, Maria Carolina Vasconcelos. “Novíssimo” cinema brasileiro: práticas, presentações e circuitos de independência. São Paulo, 2016. Tese (doutorado) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo;

    ZUMTHOR, Paul. Performance, recepção, leitura. São Paulo: Cosac Naify, 2007.