Ficha do Proponente
Proponente
- Mili Bursztyn de Oliveira Santos (UFF)
Minicurrículo
- Doutoranda do PPGCINE/UFF sob orientação do professor Cezar Migliorin. Mestre em Comunicação e Cultura pelo PPGCOM/UFRJ. Graduada em Comunicação Social pela UFRJ. É produtora, montadora e realizadora audiovisual.
Coautor
- Arthur Ribeiro Frazão (UFRJ)
Ficha do Trabalho
Título
- Hospital Universitário Clementino Fraga Fº: uma construção da memória
Seminário
- Montagem Audiovisual: reflexões e experiências
Resumo
- A partir do processo de realização de uma série de três documentários sobre o Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, apresentamos reflexões teóricas sobre a montagem de arquivo como um espaço possível de organização e elaboração do passado. O trabalho com as fotografias e documentos históricos que registram os 28 anos da construção do hospital, permitiram uma elaboração audiovisual da passagem do tempo e a afirmação da montagem como gesto político e estético.
Resumo expandido
- Em 2015 o grupo Espaço Saúde, do Programa de Pós-graduação em Arquitetura – PROARQ/FAU/UFRJ, nos convidou a acompanhar e filmar entrevistas com médicos, professores e servidores que participaram ativamente da formulação do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho (HUCFF) da UFRJ. Neste momento, a equipe do Espaço Saúde trabalhava no projeto do novo HUCFF e, para isso, buscava embasar a nova proposta na própria história da instituição, repensando o hospital enquanto unidade de saúde e ambiente acadêmico. As entrevistas forneciam detalhes sobre os processos de concepção, implementação e funcionamento do hospital, projetado por Jorge Moreira, arquiteto-chefe do Escritório Técnico da Universidade do Brasil (ETUB) e responsável pelo planejamento geral da cidade universitária da Ilha do Fundão, no Rio de Janeiro. As obras, iniciadas em 1950, foram paralisadas mais de uma vez por falta de recursos, até serem retomadas, em definitivo, em 1975. Em 1978, o hospital foi, finalmente, inaugurado, em plena ditadura militar. As entrevistas motivaram a realização de uma série de três documentários de 50 minutos cada. Na série, o prédio do HUCFF, marco da arquitetura moderna, é o prisma que dá a ver a relação do indivíduo com o espaço, e, a importância da universidade pública e do movimento estudantil na luta pela saúde e educação. Daí em diante, a montagem foi o lugar para elaboração e construção da memória do hospital. A experiência da série nos possibilitou uma reflexão sobre a montagem enquanto exercício prático, mas também teórico, de organização e assimilação do passado.
No decorrer da montagem, incorporamos às 20 horas de entrevistas filmadas, imagens e documentos de origens e formatos heterogêneos, levantados nos acervos da própria UFRJ. No Núcleo de Pesquisa e Documentação (NPD) da FAU/UFRJ tivemos acesso às plantas, relatórios e fotografias de acompanhamento das obras do HUCFF, pertencentes à coleção do ETUB, que se constituíram como uma importante fonte de pesquisa. Grande parte das imagens encontradas continham pouca ou nenhuma informação sobre local e data das tomadas, o que nos exigiu um trabalho investigativo. Foi preciso buscar nos detalhes (GINZBURG, 1989) as pistas que permitissem estabelecer uma continuidade temporal entre as imagens. Os filmes sobre o HUCFF promovem um desarquivamento (LEANDRO, 2015) dos documentos do ETUB que, por meio desta operação, ganham novas camadas de sentido.
Nas fotografias acompanhamos a transformação na topografia da Ilha do Fundão: progressivamente, as praias e a vegetação natural desaparecem sob a areia de aterramento até toda a paisagem se converter em um grande e árido canteiro de obras. Examinadas separadamente, as imagens exibem detalhes da edificação do HUCFF. Porém, organizadas e tomadas em conjunto, elas dão a ver a própria passagem do tempo. A montagem é, de acordo com Didi-Huberman (2016), um gesto estético e ético capaz de um duplo movimento. Há, por um lado, o esforço em restaurar os eventos originários, por outro, o entendimento de que um olhar anacrônico compreende o passado como algo aberto, inacabado. Neste sentido, de uma perspectiva política, “não há força revolucionária sem remontagem dos lugares genealógicos, sem rupturas e reurdiduras dos laços de filiação, sem reexposições de toda a história anterior” (DIDI-HUBERMAN, 2016, p. 4). De uma perspectiva filosófica, as imagens do passado, ao serem montadas e remontadas em uma obra audiovisual, estão constantemente migrando entre temporalidades. Portanto, do gesto político e filosófico que é o de montar imagens, emergem outros passados possíveis, sempre inacabados, nunca definitivos, implicados diretamente na passagem do tempo entre os momentos de tomada e retomada destas imagens.
Bibliografia
- DIDI-HUBERMAN, Georges. Remontar, remontagem (do tempo). Cadernos de Leitura: Belo Horizonte, Chão da Feira, n. 47, 2016.
GINZBURG, Carlo. “Sinais, raízes de um paradigma indiciário”. In: Mitos, emblemas, sinais. São Paulo: Companhia das Letras, 1989, p. 143-179.
LEANDRO, Anita. Montagem e história: uma arqueologia das imagens da repressão. In: BRANDÃO, Alessandra; LIRA, Ramayanna (Orgs). A sobrevivência das imagens. Campinas: Papirus, 2015, p. 103-120.