Ficha do Proponente
Proponente
- Angelita Maria Bogado (UFRB)
Minicurrículo
- Graduada em Com. Social e Letras. Mestre em Estudos Literários. Doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas (UFBA). Profa. adjunta e atual Coord. do Curso de Cinema e Audiovisual da UFRB. Tem experiência na área de narrativas com ênfase em análise fílmica. Atualmente se dedica ao estudo do entrelugar no cinema brasileiro contemporâneo. Participa do Grupo de Estudos em Experiência Estética: Comunicação e Artes (GEEECA-CNPq) com a pesquisa Cinema do entrelugar: experiência e estética.
Ficha do Trabalho
Título
- Cinemas do entrelugar: Filmes de Plástico e Rosza Filmes
Resumo
- Filmes de Plástico e Rosza Filmes, além do reconhecido destaque no cenário nacional, escolheram enquanto lugar de fala, espaços invisibilizados pelos grandes centros: Recôncavo da BA e Contagem. Nossa proposta é pensar como a relação entre os afetos e as territorialidades permite a materialização de um cinema híbrido, capaz de criar modos de passagem entre elementos fronteiriços. Realizadores que expressaram as fraturas do seu tempo e a complexidade deste momento de disputa e dissenso.
Resumo expandido
- No Brasil é significativo o número de produções cinematográficas que se lançaram em um espaço de trânsito entre o vivido e o imaginado, muitas vezes, negociando as visibilidades e as invisibilidades da história como forma não apenas de estar em um espaço híbrido, mas sobretudo de refletir sobre esse espaço. Branco sai, preto fica (Queirós, 2014), Orestes (Siqueira, 2015) Ela volta na quinta (Novais, 2016), Arábia (Uchôa e Dumans, 2017), Ilha (Rosa e Nicácio, 2018) são alguns dos filmes mais recentes que trouxeram experiências limiares para discutir espaços fronteiriços de diversas ordens no cinema. Um cinema que quando encontra o silêncio fala, quando se depara com histórias ocultas as desenterra. Entre a memória subjetiva e a histórica, seus personagens, diretores e espectadores caminham pelas narrativas fílmicas carregando as histórias para “além da fronteira de nossos tempos”. (BHABHA, 2007, p. 23).
Dando sequência a pesquisa realizada no doutorado O cinema do entrelugar: imaginários de um passado em fluxo na obra documental brasileira (BOGADO, 2017) este artigo consiste em ampliar o estudo do fenômeno do entrelugar também para as obras ficcionais. Partiremos do estudo de Silviano Santiago sobre o conceito de “entre-lugar” . Santiago pensou o processo identitário, como um tecido de ligação entre diferentes culturas.
O entrelugar possibilita o diálogo entre vozes e espaços dinâmicos, promovendo uma passagem entre elementos fronteiriços como presença e ausência, lembrar e esquecer, ficção e documentário, centro e periferia. O conceito de cinema do entrelugar pode realizar um vasto campo de conexões. Para esta pesquisa construímos uma ligação importante entre as ideias de Santiago, o pensamento de Benjamin – limiar (Schwelle) e fronteira (Grenze), o entendimento de John Dewey sobre a problemática do afastamento entre arte e experiência e os estudos da relação entre estética e política em Jacques Rancière.
Para este trabalho, selecionamos a filmografia dos longa metragens das produtoras/coletivos Filmes de Plástico e Rosza Filmes. São cineastas que além do reconhecido destaque no cenário nacional , escolheram enquanto lugar de fala, espaços invisibilizados pelos grandes centros: Recôncavo da Bahia e Contagem.
Neste sentido, esta pesquisa se propõe a promover o debate sobre as linguagens artísticas que atravessam, profanam, pulverizam fronteiras erguidas por mecanismos de poder, ao mesmo tempo em que a geometria dos olhares e dos corpos em cena aponta para uma possível organicidade, em busca de reaver uma “continuidade da experiência estética com os processos normais do viver” (DEWEY, 2010, p. 70).
A ascensão de forças políticas e econômicas mais conservadoras tem promovido uma polarização de ideias, mergulhando o país em uma cisão, na qual pessoas com ideologias distintas não podem (não conseguem) mais se sentar à mesa para debater. Qual o espaço, a possibilidade e a importância de se praticar um cinema do entrelugar em um ambiente onde muros interditam o diálogo, muitas vezes impossibilitando o seu transbordamento? Os filmes, aqui estudados, reviram os escombros e trazem para o primeiro plano histórias adormecidas, sejam nacionais, familiares ou individuais. Contudo, será que o fenômeno cinematográfico do entrelugar sofrerá algum tipo de abalo ou transformação diante de um mundo de extremos? Os personagens desse mundo serão aprisionados em limiares como Dildu, em A cidade é uma só? ou viverão num mundo fronteiriço como Emerson, em Ilha? Para tentar pensar sobre essa questão, é preciso olhar para a natureza das imagens produzidas no frescor do agora e, ainda, pensar a relação entre os afetos e as territorialidades que permitem sua materialização.
São filmes que se lançam, corajosamente, na experiência de trazer para a tela a essência indivisível das coisas. Uma geração de realizadores que através da estética cinematográfica percebeu e expressou as fraturas do seu tempo e a complexidade deste momento de disputa e dissenso.
Bibliografia
- BENJAMIN, Walter. O anjo da história. Belo Horizonte: Autêntica, 2012.
________. Passagens. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2006.
________. On language as such and on the language of man. In: Reflections Walter Benjamin. (Org). Peter Demetz New York: Shoken Books, 1986, p. 314-332.
BHABHA, Homi. O local da cultura. Belo Horizonte: UFMG, 2007.
BRASIL, A. A performance: entre o vivido e o imaginado. In: Experiência estética e performance. PICADO, B; MENDONÇA, C. M.; CARDOSO, J. (Orgs.). SSA: EDUFBA, 2014, p. 131-145.
DEWEY, J.Arte como experiência. SP: Martins Fontes, 2010.
GAGNEBIN, Jean-Marie. Limiar, aura e rememoração. SP: Editora 34, 2014.
LOPES, Denilson. Afetos, Relações e Encontros com Filmes Brasileiros Contemporâneos. SP: Hucitec, 2016.
RANCIÈRE, Jacques. O inconsciente estético. Rio de Janeiro: Editora 34, 2018.
_________. A partilha do sensível: estética e política. Rio de Janeiro: Editora 34, 2009.
_________. Políticas da escrita. Rio de Janeiro: Editora 34, 1995.