Trabalhos Aprovados 2019

Ficha do Proponente

Proponente

    Henrique Codato (UFC/UNIFOR)

Minicurrículo

    Doutor em Comunicação Social pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG, 2013), foi bolsista PNPD/Capes (2014-2018) no Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal do Ceará (PPGCOM/UFC), onde atua como professor e pesquisador. Atualmente, é docente do curso de Cinema e Audiovisual da Universidade de Fortaleza (Unifor) e coordenador do Grupo de Pesquisa sobre a Imagem (GPI/Unifor).

Ficha do Trabalho

Título

    Motivos visuais do realismo fantasmagórico no cinema de Weerasethakul

Resumo

    Ao transformar os elementos primordiais – a água, a terra, o fogo, o ar – e também aqueles etéreos, espectrais – a fumaça, o vento, a neblina, a luz – em motivos visuais para seu cinema, Apichatpong Weerasethakul aproxima seu espectador de uma experiência sensorial e afetiva bastante singular. Propomos refletir acerca da presença dessas forças sutis em alguns de seus curta-metragens, buscando entender como elas operam na construção do realismo fantasmagórico que configura sua arte.

Resumo expandido

    Sejam as águas barrentas e agitadas de um rio ou os fogos de artifício de uma festa popular; as chamas de uma bola de futebol incandescente ou a neblina densa e misteriosa que encobre um vilarejo; a oscilante luz de um poste de rua ou a força do vento que sopra e faz dançar as folhas na floresta tropical, é fato que o cineasta tailandês Apichatpong Weerasethakul – chamado por Dominique Païni (2010) de “Ovídio do Século XXI” – encontra nessas forças sutis a matéria-prima mais elementar para seu cinema, uma arte interessada em colocar em cena a efemeridade e a inconstância das coisas e do mundo. A presença destes elementos incorpóreos em seus longas é recorrente, mas é no contexto de seus trabalhos feitos em curta metragem que eles surgem como signos fortes, figuras ainda mais centrais para a composição visual de suas obras. “É nos curtas e nas peças de arte que eu posso filmar sem regras”, diz Weerasethakul. Assim, propomos refletir acerca da presença dessas forças sutis em algumas de suas produções feitas em colaboração ou em parceria com instituições, fundações e festivais diversos, centrando-se principalmente, mas não exclusivamente, nos seguintes curtas: Luminous People (2007); Phantoms of Nabua (2009); A Letter to Uncle Boonmee (2009); Vapour (2015); e Blue (2018).

    Gostaríamos de pensar essas obras como unidades independentes de um mesmo conjunto fílmico, trabalhos passíveis de serem reunidos a partir da manifestação/da configuração de uma série comum de motivos visuais que, como supõem Jordi Balló e Alain Bergala, operam no cinema em uma tripla articulação: “do lado do mundo, da realidade; do lado da especificidade do cinema, de seu tratamento enquanto imagem cinematográfica”; e, finalmente, “do lado mais íntimo, daquilo que conforma a singularidade de um determinado autor” (BALLÓ e BERGALA, 2016, p. 12). No caso preciso de Weerasethakul e de seus curtas, para além dessas três dimensões apontadas, as forças sutis transformadas em motivos visuais parecem querer tocar uma outra camada, relacionada às sombras e à escuridão, abrindo-se, assim, para uma espécie de realismo encantado ou fantasmagórico (SILVEIRA, 2018; MELLO, 2015), no qual se destacam um forte animismo, herança do budismo e da cultura popular khmer que atravessa a Tailândia, e uma surpreendente e harmoniosa coabitação entre os vivos e os mortos. Nossa hipótese é a de que ao transformar os elementos primordiais – a água, a terra, o fogo, o ar – e também aqueles etéreos, espectrais – a fumaça, o vento, a neblina, a luz – em motivos visuais centrais para suas obras, Weerasethakul aproxima seu espectador de uma experiência muito mais sensorial e afetiva do que intelectual ou narrativa, dirigida ao corpo e à percepção dos sentidos (ELSAESSER e HAGENER, 2014, p. 21).

    Alguns destes curtas são parte de obras instalativas, concebidas por Weerasethakul, com circulação em museus, galerias de arte e espaços expositivos; outros integram um projeto maior, desenvolvido, geralmente, a partir de um convite ou de uma proposição. Nesse sentido, é necessário sublinhar que apesar de se configurarem como resultado de um trabalho mais amplo, caracterizado por certo alijamento da experiência da sala escura e do dispositivo cinema, consideramos esses filmes em sua autonomia e singularidade, como os objetos cinematográficos que são. Observando aquilo que eles motivam em termos de experiência visual, trataremos, então, de estabelecer possíveis relações entre as forças sutis registradas e seu papel na construção desse real fantasmagórico que o diretor coloca em cena e que buscamos aqui investigar. Note-se, finalmente, que os curtas de Weerasethakul dialogam de perto com seus longa metragens, como se deles fossem extensões ou intuições, reproduzindo, no mais das vezes, as mesmas histórias, com os mesmos personagens, que, como fantasmas reincidentes, sobrevivem de um filme para o outro, assombrando o espectador.

Bibliografia

    AZZI, D.; AZZI, F. Apichatpong Weerasethakul. São Paulo: Iluminuras, 2014.
    BALLÓ, J.; BERGALA, A. (eds.). Motivos visuales del cine. Barcelona: Galaxia Gutenberg, 2016.
    BORDELEAU, E. et al. Nocturnal Fabulations. Ecology, Vitality and Opacity in the Cinema of Weerasethakul. London: Open Humanities Press, 2017.
    ELSAESSER, T.; HAGENER, M. Teoria do cinema: uma introdução através dos sentidos. Campinas: Papirus, 2018.
    MELLO, Cecília (org.). Realismo Fantasmagórico. São Paulo: Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária, USP, 2015.
    PAÏNI, D. “Cinq Cinéastes pour les années 2000”. In Cahiers du Cinéma, n. 6752, Jan. 2010.
    SILVEIRA, L. V. Realismo Heterocrônico: uma abordagem ao cinema de Apichatpong Weerasethakul. Dissertação (Mestrado). Programa de Pós Graduação em Comunicação. UFMG, 2018.
    VIEIRA JR., E. Por uma exploração sensorial e afetiva do real: esboços sobre a dimensão háptica no cinema contemporâneo. Revista Famecos, UFRGS, v. 21, n. 3, 2014.