Ficha do Proponente
Proponente
- Rogerio Eduardo Moreira Pereira (UNICAMP)
Minicurrículo
- Mestrando em Multimeios na Unicamp, sob orientação do
prof. Dr. Pedro Maciel Guimarães, possui graduação em Tecnologia da Informação pela
Fatec-SP (2010) e graduação em Artes pelo Centro Universitário Claretiano (2014). Participa do Grupo de Estudos sobre o Ator no Audiovisual (GEAs) na Universidade Estadual de Campinas.Tem experiência na área de
Tecnologia da Informação e Artes, com ênfase em Artes Visuais e cinema. Tem
interesse na área de Cinema, com foco em História e Atuação no Cinema.
Ficha do Trabalho
Título
- La Parole Vivant – A declamação no cinema de Eugène Green
Resumo
- Esta pesquisa pretende investigar a declamação inscrita no cinema de Eugène Green, no qual a
palavra se faz protagonista em detrimento da dramaticidade, identificando, relacionando e
contrapondo as diversas características distintas da atuação e de seus locais de manifestação em
sua obra. Para tal serão analisados os elementos formais de representação e apresentação em
seus papeis codificadores e corporificadores da palavra declamada.
Resumo expandido
- Com fortes influências religiosas e sérias criticas à modernidade, Eugène Green
explora a declamação em sua obra, acreditando encontrar ali respostas mais eficientes
em sua busca pela representação do que ele denomina a palavra encarnada, com o
propósito de trazer ao público contemporâneo uma linguagem que segundo ele é a única
capaz de criar um elo do mundano com o divino. Para ele “na declamação, a fala não é
mais uma idéia abstrata e irrelevante, como pode ser visto em sua forma escrita: o
enunciado declamado, e sua sacralidade, existem através da encarnação da palavra no
corpo e no sopro de um homem” (2001:25).
A obra de Green tem como principal característica estética uma atuação em
aberta recusa ao naturalismo, onde o apuro na entonação do texto e o minimalismo da
expressividade produzem para ele uma interiorização dos diálogos, como se cada
personagem, ao falar com o outro, falasse antes consigo mesmo, formalizando assim a
instância declamatória. Em entrevista, ele relata sua poética:
Quando eu filmo uma pessoa, é a energia interior que me
interessa. Quando um ator faz uma interpretação
psicológica, é sempre falso. O ator está constantemente
pensando: o que devo fazer para expressar esta situação,
ou essa emoção. Não há nada real. Uma interpretação
psicológica é sempre intelectual. (Film Quaterly vol 68 n
04)
Para entendermos essa conformidade entre a declamação “encarnadora” da
palavra e esta atuação distanciada da dramatização e da psicologização Stanislavskiana,
recorreremos indubitavelmente à antítese proposta por Brecht, que definia o
distanciamento como método de “retirar do acontecimento ou do caráter aquilo que
parece óbvio, o conhecido, o natural, e lançar sobre eles o espanto e a curiosidade”.
(Brecht apud Bornheim, 1992:243). Assim como na retórica clássica, escola formativa
da declamação, o dialogo provocativo com o espectador era um fundamento basilar do
teatro épico proposto por Brecht, uma forma de discursar com prerrogativas diretas de
interlocução crítica através da recepção da audiência, indo de encontro aos então
estabelecidos referenciais de ação, espaço e linearidade temporal do drama,
fundamentadas na Poética de Aristóteles.
Pretendemos demonstrar que do histriônico ao naturalista, a declamação sempre
teve como matriz a apresentação, o emprego da palavra em sua forma oral em suas
diversas aplicações e intenções, tanto no contexto de um fórum quanto no palco, a
palavra e suas reverberações estabeleciam um diálogo direto com o público,
potencializando a criação de imagens persuasivas.
Dentro da historicidade do cinema essa dicotomia se mostra muito mais complexa
diante das próprias implicações do dispositivo, porém através de um estreitamento de
relação com o teatro, indubitavelmente esta passa hegemonicamente a dar ênfase ao
intimismo, ao realismo do gesto, à psicologia, instaurando e aprimorando o registro
naturalista. Já no cinema moderno, temos como primeiro grande referencial de uma
contracorrente, a obra e os princípios estéticos propostos pelo cineasta francês Robert
Bresson, que queremos evidenciar como influência imediata e paradoxal a Eugène
Green. A aproximação entre as metodologias de atuação de Bresson e Green se
entrelaçam através da evidente busca pela visualidade de algo enigmático que é
concebida e não representada.
O peso da palavra na obra de Green não se propaga apenas através do trabalho
elaborado de entonação, nem através do espaço deixado pelo esvaziamento da
eloquência expressiva do rosto. Sua potencialidade é resignificada muitas vezes pelo
gesto, ou pela ausência dele, prezando pela minúcia da impassibilidade.
Muitas das escolhas formais do cineasta são recriações do teatro barroco, porém,
nos parece essencial para entender o cinema contemporâneo esse embate anacrônico de
uma metodologia clássica como meio de apreender o que escapa da percepção da
experiência espectatorial na modernidade.
Bibliografia
- AMIEL Vincent. Le corps au cinema – Keaton, Bresson, Cassavetes. Paris : PUF, 1998.
AUMONT, Jacques. O cinema e a encenação. Lisboa: Texto & Grafia, 2008
BORNHEIM, Gerd. Brecht: a estética do teatro. Rio de Janeiro: Graal, 1992
BRECHT, Bertolt. Escritos sobre Teatro. Buenos Aires: Ediciones Nueva Visión, 1976
BRESSON, Robert. Notas sobre o cinematográfo. São Paulo: Editora Iluminuras, 2014.
CHION, Michel. La Voix au Cinéma, Cahiers du Cinéma, 1982
CHAOUCHE Sabine, L'Art du comédien – Déclamation et jeu scénique en France à
CRAIG, E. Gordon. “L’acteur et la sur-marionnette”, De L’art du théâtre, Paris, Editions
Lieutier/Librairie Théâtrale, 1951, p. 59-63.
GREEN, Eugène. La parole baroque. Paris : Desclée de Brouwer, 2001
_______. Poetique du cinematographe. Paris: Actes Sud, 2009
MEYERHOLD, Vsevolod. Do Teatro. [s.l.]: Iluminuras. 2012
NAREMORE, J. Acting in the cinema. Berkeley/Los Angeles/London: University of
California Press, 1988