Ficha do Proponente
Proponente
- Juliano Rodrigues Pimentel (IFRS)
Minicurrículo
- Juliano Rodrigues é formado como roteirista e diretor de fotografia no curso de Realização Audiovisual (UNISINOS), doutor em comunicação com pesquisa em história do cinema brasileiro e filosofia (UFRGS). Atualmente é docente dos cursos de produção de áudio e vídeo, processos fotográficos e produção multimídia no Instituto Federal do Rio Grande do Sul.
Ficha do Trabalho
Título
- Uma certa angústia personiana: fundamentos narrativos em SP/SA
Seminário
- Teoria dos Cineastas
Resumo
- Este estudo investiga a possibilidade de uma teoria narrativa a partir da obra São Paulo Sociedade Anônima (1965), de Sérgio Person, considerando seu diálogo com a estética de um espírito do tempo pós-segunda guerra e na larga influência de uma crise existencial do indivíduo enquanto matriz narrativa e seus reflexos na construção dos espaços fílmicos simbólicos como caracterização da noção de angústia.
Resumo expandido
- Este estudo tem como objetivo discutir uma possível autoria teórica no cinema de Sérgio Person. Para tanto, parto da possibilidade do eixo criação-sustentação teórica inerentes a potência de uma única obra, ao contrário do que a legitimação de traços teóricos ao longo de um conjunto de filmes costumeiramente possibilitam averiguação. Propõe-se aqui, então, a teoria fílmica particular de uma obra como fenômeno de instante. Não se trata de uma consideração de marca estilística como potência de autoria, mas a composição como um todo enquanto um instrumento teórico na sua encarnação audiovisual – o filme, propriamente, enquanto instrumento teórico-filosófico.
Frente a esta condição, o problema guia do estudo se organiza da seguinte maneira: como o filme São Paulo Sociedade Anônima (PERSON, 1965) inaugura uma possibilidade teórica ao apontar para uma poética muito particular do próprio autor sobre a construção narrativa?
A hipótese de uma teoria personiana a partir de São Paulo Sociedade Anônima (1965) parece se caracterizar por uma maneira muito específica com que o diretor costura fluxos narrativos, conflitos internos aos personagens caracterizados por uma angústia muito aguda, e os reflexos destes fundos na própria relação dos personagens com os espaços que habitam. Parte deste contexto se dá também na medida em que a teoria é assumida no seu escopo crítico e acadêmico, mas não gestada ou premeditada como marca de autoria e produção. Dentro do que foi encontrado na pesquisa para o estudo, não há indícios de que Person estava esquematizando uma teoria para praticá-la na construção do filme, fato este que importa muito pouco, visto que este caso aparenta se aproximar da criação teórica espontânea, algo comum às expressões artísticas.
A condição para o surgimento, ou disponibilidade teórica, do que nasce com SP/AS aparenta estar vinculada ao espírito de um tempo. As marcas e modulações da humanidade no período pós-segunda guerra reinauguram um humanismo em decadência frente a destruição externa, das cidades e nações, mas com reverberações ensurdecedoras na dimensão interna do indivíduo. O Brasil recebe estas influências por diversas frentes, muito em particular pela influência de um pensamento europeu na estruturação da educação e das poéticas artísticas nos anos 1950 e 1960.
Embora em retrospectiva, analisando o que foi feito a partir do filme finalizado e exibido, alguns marcos teóricos ajudam a traçar o mapa estabelecido pela obra, e é desta amarração que parece surgir a teoria personiana em SP/SA. Primeiro, há a condição estética de possibilidades vinculadas ao espírito do tempo, o zeitgeist do pós-guerra e um tipo particular de crise humanística que ele estabelece. Segundo, tal espírito do tempo é fortemente influenciado pela reflexão existencialista a partir de Jean Paul Sartre, enquanto teoria, e Albert Camus, enquanto experimentação estética narrativa. Por terceiro, a simbologia dos espaços enquanto engrenagem narrativa a serviço deste tipo de conflito interno ao personagem demarcado pela noção de angústia.
A marca de autoralidade de Person ultrapassa sua condição de estilo e possibilita um olhar aprofundado sobre as engrenagens e fluxos da contação da história. O próprio filme pode ser encarado como uma possibilidade teórica da estética audiovisual na medida em que nos entrega uma organização estética original e particular a respeito dos conflitos dos personagens e seus cos nos espaços em uma linguagem dominada por regras outras que as da construção teórica verbal. O próprio filme, nas suas potências estéticas, inaugura uma angústia urbana que se sustenta na sua própria condição fílmica.
Bibliografia
- BACHELARD, Gaston. A poética do espaço. São Paulo, SP: Martins Fontes, 2012.
BORDWELL, David; THOMPSON, Kristin. Film History: An Introduction. Nova Iorque: Mcgraw-Hill Education, 2012.
BORNHEIM, Gerd. Sartre. São Paulo: Perspectiva, 1971.
RAMOS, Fernão (Org.). História do Cinema Brasileiro. São Paulo: Círculo do Livro, 1987.
SARTRE, Jean-Paul. Existentialism is a Humanism. Londres: Yale University Press, 2007.