Ficha do Proponente
Proponente
- Marina Cavalcanti Tedesco (UFF)
Minicurrículo
- Doutora em Comunicação e docente do Departamento de Cinema e Vídeo e do Programa de Pós-Graduação em Cinema e Audiovisual da Universidade Federal Fluminense. Tem experiência como roteirista, diretora de fotografia e diretora. Entre suas principais publicações, destaca-se a organização do livro “Feminino e plural: mulheres no cinema brasileiro”, finalista do Prêmio Jabuti 2018. Seus temas de pesquisa são cinema latino-americano, direção de fotografia, direção, mulheres no cinema e gênero.
Ficha do Trabalho
Título
- Maternidade: uma possibilidade para diretoras de fotografia no Brasil?
Seminário
- Teorias e análises da direção de fotografia
Resumo
- Nesta comunicação, articularemos trechos de entrevistas que realizamos com diretoras de fotografia de diferentes idades e regiões do país entre 2017 e 2019 com estudos sobre mulheres e mercado de trabalho para refletirmos sobre um aspecto do machismo na direção de fotografia que tem sido pouco estudado e discutido: a maternidade. É possível ser fotógrafa de cinema e mãe no Brasil?
Resumo expandido
- A maternidade foi objeto, na história da humanidade, de diversas construções sociais, que variaram no tempo e no espaço, e em função de classe, religião, cor, etc. No Brasil e em grande parte do mundo vemos, hoje, uma desestabilização do ideal de maternidade que emergiu nos séculos XVIII e XIX, o qual glorificava o dar à luz e atribuía enormes responsabilidades para as mães (ARIÈS, 1986).
Esta retomada de atribuição de responsabilidades, “calcada na idéia antiga de que ‘mãe é mãe’, de que ela é a pessoa mais adequada para cuidar dos filhos e que, em última análise, identifica maternidade e feminilidade” (ROCHA-COUTINHO, 2005, p.122), tem a ver com a inscrição da maternidade no corpo da mulher (ROCHA-COUTINHO, 2005), mas também com o próprio capitalismo, posto que parte do “preço de mercado da força de trabalho… é constituído pela parte não paga produzida pelo trabalho doméstico não remunerado das mulheres “ (GAMA apud MOREIRA; MOSER, 2017, p.6).
No que se refere à desestabilização acima referida, destacamos entre suas causas a militância feminista e o aumento da participação das mulheres no mercado de trabalho. Ambos têm trazido para as mulheres a possibilidade de outras centralidades de vida, como, por exemplo, a realização profissional, em novos processos marcados por tensões subjetivas e objetivas.
No que diz respeito às classes médias e altas em nosso País… embora algumas diferenças de gênero persistam… as meninas hoje são educadas… para competir e buscar um crescimento profissional cada vez maior… Ao mesmo tempo, diferentes discursos sociais continuam a reforçar seu papel na família como esposas e, principalmente, como mães… Assim, que, no que diz respeito à mulher contemporânea, uma das questões mais complexas, problemáticas e conflitantes continua a ser a maternidade (ROCHA-COUTINHO, 2005, p.125).
Tal diagnóstico é fundamental para se pensar a maternidade entre diretoras de fotografia, questão que emergiu com força nas entrevistas que realizamos com profissionais de diferentes idades e regiões do país entre 2017 e 2019. Os dados produzidos por nós (TEDESCO, 2016) e pela ANCINE (2016) demonstram que as mulheres têm fotografado no último período apenas 8% dos audiovisuais (um percentual baixíssimo e que poucas vezes foi maior), e basta circular pelo meio para perceber que a imensa maioria das poucas que conseguem entrar e se manter em uma profissão ainda tão masculina são brancas, cisgêneras, com alto grau de escolaridade e oriundas das classes média e alta – o que nos remete às afirmações de Rocha-Coutinho.
Ademais, tamanha desigualdade de gênero exige uma enorme dedicação das mulheres à profissão. A veterana Heloisa Passos afirma: “São poucas mesmo [as fotógrafas mães]. Os fotógrafos se eu fiz assistência todas são pais, né? Então quando eu digo ‘me distraí’ é quase uma forma irônica de dizer o tanto que eu tive que por de mim nesse lugar que eu decidi conquistar”.
As condições de trabalho no set de seis dias por semana e 12 horas por dia também foram apontadas por parte significativa das entrevistadas como impeditivas para conciliar maternidade e carreira. A revisão da literatura sobre o tema feita por Oliveira et al (2011) corrobora a percepção das fotógrafas: “o regime de trabalho em tempo integral tende a dificultar a conciliação da maternidade com a vida profissional, dada a menor flexibilidade no manejo do tempo” (OLIVEIRA et al, 2011, p.275). E “os estudos também verificaram que a presença de benefícios trabalhistas [os quais não fazem parte da vida de freelancer da maioria das profissões de set], em especial da licença-maternidade, estava associada ao maior retorno das mães ao trabalho após o nascimento do filho (OLIVEIRA et al, 2011, p.275).
Nesta comunicação, articularemos trechos das entrevistas realizadas com estudos sobre mulheres e mercado de trabalho para refletirmos sobre a maternidade, um aspecto do machismo na direção de fotografia que tem sido pouco estudado e discutido.
Bibliografia
- ANCINE. Diversidade de gênero e raça nos lançamentos brasileiros de 2016. 2018. Disponível em: https://www.ancine.gov.br/sites/default/files/apresentacoes/Apresentra%C3%A7%C3%A3o%20Diversidade%20FINAL%20EM%2025-01-18%20HOJE.pdf
MOREIRA, T. A.; MOSER, L. Conflito entre trabalho e vida familiar no contexto da produção e reprodução social capitalista. Anais do II Seminário Nacional de Serviço Social, Trabalho e Políticas Sociais, UFSC, Florianópolis, 2017.
OLIVEIRA, S. C. et al. Maternidade e trabalho, revisão da literatura. Revista Interamericana de Psicologia, 42(2), 2011.
ROCHA-COUTINHO, M. L. Variações sobre um antigo tema: a maternidade para mulheres com uma carreira profissional bem-sucedida. In: FÉRES-CARNEIRO, T. (org.). Família e casal: efeitos da contemporaneidade. Rio de Janeiro: Editora PUC-Rio, 2005.
TEDESCO, M. C. Mulheres atrás das câmeras: a presença feminina na direção de fotografia de longas-metragens ficcionais brasileiros. Significação, v.43, n.43, 2016.