Trabalhos Aprovados 2019

Ficha do Proponente

Proponente

    Afrânio Mendes Catani (USP)

Minicurrículo

    Afrânio Catani: mestre, doutor e livre-docente em sociologia (USP). Sócio fundador da SOCINE, é professor titular na FEUSP e no PROLAM-USP. Pesquisador do CNPq. Autor de A chanchada no cinema brasileiro (1983, com J. I. Melo Sousa); A sombra da outra: a Cinematográfica Maristela e o cinema industrial paulista nos anos 50 (2002); História do cinema brasileiro: 4 ensaios (2004) e A revista de cultura Anhembi (1950-62): um projeto elitista para elevar o nível cultural do Brasil (2009).

Ficha do Trabalho

Título

    António Lopes Ribeiro: a câmara do poder do cinema português

Seminário

    Cinemas pós-coloniais e periféricos

Resumo

    António Lopes Ribeiro (1908-1995), diretor e produtor português, foi homem de mil instrumentos no cinema, tendo também trabalhado no rádio, na televisão e na crítica, além de escrever, traduzir e desenhar. Dirigiu cerca de uma centena de curtas e 10 longas (documentário e ficção). Notabilizou-se pela produção de documentários oficiais, que enalteciam o Estado Novo. Pioneiro da televisão em Portugal apresentou, de 1957 a 1974, o programa “O Museu do Cinema”, dedicado à difusão do cinema mudo.

Resumo expandido

    Jean-Claude Bernardet, em Cinema Brasileiro: propostas para uma história (1979), aborda temática relevante acerca da trajetória do cinema nacional que, respeitadas as diferenças de tempo e de lugar, pode ser estendida à história do cinema português. Escrevia que nas décadas iniciais do século XX o mercado era dominado pelo produto importado, que não precisa do filme brasileiro para existir (p. 23). Às vezes surge um filme de ficção, embora ele “não seja suficientemente regular e lucrativo para sustentar um quadro de produtores com o mínimo de equipamento, laboratórios, know-how. No entanto, os cineastas estão aí e produzem sem interrupção. Parece que se dá um fenômeno que só poderia ocorrer numa cinematografia dominada” (p. 23). As produções abordavam o cotidiano das cidades, interesses locais, criando-se “uma área livre, fora da concorrência dos produtores estrangeiros (…) Desenvolveu-se a produção de documentários – ou ´naturais` como chamados na época – e de cinejornais” (p. 24). São tais filmes, e não os de ficção, que sustentam a produção brasileira, produzidos a partir do dinheiro obtido junto a pessoas ricas “que querem promover seu nome, empreendimentos, produtos, atos políticos e mundanos (…) A produção assenta-se num documentário ligado a uma elite mundana, financeira, política, militar, eclesiástica, de que os cineastas são dependentes” (p. 23-24). Se operários, camponeses, soldados aparecem, é apenas como complemento de atos das elites. Para Bernardet, “a câmara do documentarista da época era a câmara do poder” (p. 26).
    Ao se estudar a trajetória de António Lopes Ribeiro (1908-1995), e de outros cineastas portugueses atuantes a partir do final dos anos 1920, constata-se que Brasil e Portugal vivenciaram situações semelhantes. A bibliografia preliminar examinada mostra que Ribeiro foi realizador de realce em vários campos de atuação. Para João Pedro Bénard, “é impossível falar de cinema português sem se referir a António Lopes Ribeiro. Figura imprescindível, é conspirador, instigador, lutador e visionário. Trabalha em cinema, rádio e televisão, cria periódicos, produz teatro, é compositor, tradutor e poeta” (p. 245). Atuou na imprensa como crítico desde 1926 e fundou a revista Kino (1930). Em 1928, contratado pela Paramount, fez legendas de filmes mudos. Seus 3 primeiros documentários (curtas) são de 1928. Foi assistente de direção de Leitão de Barros em Nazaré, Praia de Pescadores (1929), Lisboa, Crônica Anedótica e Maria do Mar, ambos de 1930.
    Estagia no exterior e volta a Portugal, trazendo o modelo do futuro Secretariado de Propaganda Nacional. Convence o governo a fornecer a ajuda necessária para criar, em colaboração com a Alemanha, os estúdios da TÓBIS/Lisboa Filme, funcionando a partir de 1935, para fazer filmes sonoros (Bénard, p. 246). Dirigiu o filme Gado Bravo (1934), com elenco protagonista, argumento, fotografia, cenários e música à cargo de profissionais judeus.
    1935: cria-se a Secretaria de Propaganda Nacional, capitaneada por António Ferro, teórico do regime salazarista, que entendia o cinema como arma eficaz de propaganda. A carreira de Ribeiro deslancha: dirige A Revolução de Maio (1937), ficção enaltecendo o regime e, depois, ao longo de quase 40 anos, fez cerca de 100 documentários de curta-metragem enaltecedores ao salazarismo – exemplos: Guiné, Berço do Império (1940), Portugal na Exposição de Paris de 1937 (1942), Viagem ao Porto do Senhor Marechal Carmona (1949), O Jubileu de Salazar (1953), Viagem Presidencial à Guiné (1955), Portugueses no Brasil (1968), O Encontro Presidencial na Ilha Terceira (1971). Dirigiu comédias exitosas (O Pai Tirano (1941) e A Vizinha do Lado (1945), adaptações de obras clássicas – Amor de Perdição (1943), O Primo Basílio (1959), produziu filmes de prestígio – O Pátio das Cantigas (1941), Aniki Bóbó (1942) e longas documentais – Viagem de Sua Exa. o Presidente da República a Angola (1939), Feitiço do Império (1940) e A Viagem Presidencial ao Brasil (1957).

Bibliografia

    BÉNARD, J. P. Lopes Ribeiro, António. In: CASARES RODICIO, E. (Edit. y Coord.). Diccionario del Cine Iberoamericano: España, Portugal y América. Madrid: SGAE/Fund. Autor, v. 5, 2011, p. 245-249.
    BERNARDET, J. C. Cinema Brasileiro: propostas para uma história. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979.
    COSTA, H. A. Breve História do Cinema Português: 1896-1962. Lisboa: Instituto de Cultura Portuguesa, 1978.
    COSTA, J. B. Cinema Portughese in Storia del Cinema Mondiale, Vol. I (III-XX) – L´europa i la Cinematographie Nazionale. Turín: Giulio Einaudi, 2000-03, p. 1415-1458.
    COUTINHO e COSTA, J.; COSTA, J.M. (Coords.). A Comédia Clássica Portuguesa. A Coruña: CGAI/Xunta de Galicia/Cinemateca Portuguesa, 1994.
    PINA, L. de. História do Cinema Português. Lisboa: Europa-América, 1986.
    TORRES, A. R. Ribeiro, Francisco [Ribeirinho]. In: CASARES RODICIO, E. (Edit. y Coord.). Diccionario del Cine Iberoamericano. España, Portugal y América. Madrid: SGAE/Fund. Autor, v. 7, 2011, p. 350-351.