Ficha do Proponente
Proponente
- Virgínia Jangrossi (UFSCar)
Minicurrículo
- Virgínia Jangrossi é mestranda pelo programa de pós-graduação em Imagem e Som na Universidade Federal de São Carlos – UFSCar (bolsista Capes). Graduada pela mesma instituição, realizou um intercâmbio pelo programa Ciência sem Fronteiras na faculdade California College of the Arts, em San Francisco. Atualmente pesquisa feminismo na série Grey’s Anatomy.
Ficha do Trabalho
Título
- Relações maternas dialéticas e o empoderamento feminino
Resumo
- Apesar da maternidade ser uma das temáticas mais recorrentes nos melodramas familiares canônicos, a existência de fissuras nas representações maternas esboçava ímpetos subversivos. Será, porém, que melodramas contemporâneos, como Grey’s Anatomy, mantiveram e explicitaram este viés? Por meio da análise das relações entre mães e filhas, visa-se verificar se a série tem perpetuado o mito da maternidade, ou se tem ajudado a construir uma forma de arte menos repressiva para as mulheres.
Resumo expandido
- A tentativa de desmistificar as características que a sociedade patriarcal atrelou como sendo intrínsecas às mulheres não é algo novo no século XXI. No entanto, por ainda serem perpetuadas, se faz necessário questioná-las. Como exposto por Chodorow, “a maternidade das mulheres é um dos poucos e duradouros elementos [vistos como] verdades universais na divisão do trabalho” (1978, p.3). Considerando que a diferença sexual existe, os defensores do patriarcado usam a fisiologia das mulheres como principal argumento para associá-las a figuras maternas. Contudo, o mito da maternidade não apenas diz que as mulheres são capazes de gerar um bebê, como também que o “instinto materno” proporciona a elas as características necessárias para criar e cuidar dos filhos com ternura. No entanto, caso uma mulher não se sinta apta, em um nível consciente ou não, a se tornar mãe, não há nada que possa obrigá-la a ser (CHODOROW, 1978).
Partindo desta dicotomia, este trabalho visa questionar como Grey’s Anatomy tem retratado a temática materna. Seria possível afirmar que a série esboça uma representação crítica em relação a um tema tão recorrente nos melodramas familiares? Será que a maternidade ainda aparece como desejo universal na diegese? Para obter uma compreensão mais ampla sobre o assunto, se faz necessário analisar as relações entre mães e filhas, bem como os anseios de realização pessoal e profissional de algumas personagens. Tendo, ou não, um teor feminista, a maternidade é uma das principais temáticas retratadas nos melodramas familiares. No entanto, como observado por Kaplan (1983), na maioria destas obras, era possível notar um ímpeto subversivo na representação destas figuras maternas. Objetiva-se, portanto, discutir se a série contemporânea que será aqui estudada segue, ou não, o mesmo viés. Além disso, considerando que o capitalismo explora “as mulheres como trabalhadoras e consumidoras, [enquanto] lamenta sua ausência no lar” (KAPLAN, 1990, p.142), visa-se debater também a relação entre carreira e maternidade.
Por meio da análise da série televisiva e do uso das teorias feministas expostas por Kaplan, Chodorow e Smith, será observado o comportamento de Meredith em dois momentos: ao exercer o papel de filha e, posteriormente, o papel de mãe. Ao julgar o comportamento da própria mãe, Ellis Grey, como frívolo e associá-lo ao fato de Ellis ser uma mãe de carreira, Meredith “repet[e] a omissão patriarcal da mãe enquanto mãe, falando somente da posição de filha” (KAPLAN, 1983, p.173), reiterando a estrutura social vigente. Como exposto por Kaplan, “independente de sermos, ou não, mães, viémos ao feminismo como filhas, e nós falamos dessa posição. Por isso, não é nenhuma surpresa que tenhamos demorado tanto para chegar em uma posição onde podemos nos identificar com a mãe e começarmos a olhar [as coisas] do ponto de vista dela” (1983, p.172). Assim, somente ao sair da posição de filha, a série será narrada do ponto-de-vista de uma personagem que é mãe. Paralelamente ao momento em que Meredith decide se tornar mãe por meio da adoção de um bebê, será feito um estudo comparativo entre ela e sua melhor amiga, Cristina Yang, visto que, ao descobrir-se grávida, Yang opta por realizar um aborto. Apesar de não condenar a atitude da amiga, após se tornar mãe, Meredith passará a ser a parte julgada quanto à sua capacidade de conciliar ambos os setores de vida. Sendo antes a antes a primeira a condenar a postura das mães de carreira, somente a partir da mudança de local de Grey nesta díade, o espectador terá acesso a uma visão menos maniqueísta, nem por isso menos dialética, sobre a maternidade.
A partir deste momento, nota-se que a narrativa passa a enfatizar o respeito a individualidade e as diferenças no modo de pensar das mulheres. Reitera-se, portanto, a possibilidade de utilizar uma obra destinada à cultura de massa para construir formas de arte desmistificadas e menos repressivas para as mulheres.
Bibliografia
- DOANE, Mary Ann. The Desire to Desire: The Woman’s Film of the 1940s. Bloomington & Indianapolis: Indiana University Press, 1987.
FRIENDAN, Betty. The feminine mystique. New York: 2nd Edition. Dell book, 1979.
KAPLAN, E. Ann. Mothers and daughters in two recent women’s films: Mulvey/Wollen’s Riddles of the Sphinx (1976) and Michelle Citron’s Daughter-Rite (1978). In: Women in Film: Both sides of the camera. London and New York. Routledge, 1983, p. 171-188.
___. Motherhood and Representation: From Postwar Freudian Figurations to Postmodernism. In: KAPLAN, E.Ann. Psychoanalysis and Cinema. London and New York. Routledge, 1990, p.128-142.
___. Theories of melodrama: A feminist perspective. Women & Performance: a journal of feminist theory. No 1,Vol.1. Spring-Summer, 1983, p. 40-48.
SMITH, Sharon. Women and Socialism – Essays on Women’s Liberation. Chicago: Haymarket Books, 2005.
SNITOW, Ann. Feminism and motherhood: An American reading. Feminist Review. No 40. Spring, 1992, p 32-51.