Trabalhos Aprovados 2019

Ficha do Proponente

Proponente

    Denilson Lopes Silva (UFRJ)

Minicurrículo

    Professor Associado da Escola de Comunicação da UFRJ, pesquisador do CNPq e autor de Afetos, Relações e Encontros no Cinema Brasileiro Contemporâneo (2016) entre outro. Inúteis, frívolos e distantes: À Procura dos Dândis será seu próximo livro em coautoria com André Antônio Barbosa, Pedro Pinheiro Neves e Ricardo Duarte Filho. No momento realiza a pesquisa Dândis, Decadentes e Modernos a partir de Mário Peixoto.

Ficha do Trabalho

Título

    Mário Peixoto, os diários e as amizades

Resumo

    Nesta comunicação vamos nos deter especificamente nos diários inéditos de Mário Peixoto para compreender a experiência da amizade, como ela se configura, quais seus limites, no espaço de, em grande parte, uma homossociabilidade masculina, cruzando fronteiras da homossexualidade e da heterossexualidade, e ensejando uma configuração não homofóbica, longe do espaço da família, seja na Inglaterra, seja em hotéis ou na praia no Rio de Janeiro, para tentar problematizar o isolamento de Mário Peixoto.

Resumo expandido

    Mário Peixoto deixou dois diários inéditos: Díário da Inglaterra e Cadernos Verdes. Nosso interesse é de a partir desse material buscar sugerir uma rede de relações afetivas que se traduzem num circuito intelectual da cidade do Rio de Janeiro no fim dos anos 20 e no inicio dos anos 30 que o distancia do seu propalado isolamento artístico bem como de seu filme “Limite” (1931). O que podemos apreender desde seu contato com o Teatro de Brinquedo, precursor do teatro moderno, bem como com o Chaplin Club, considerado o primeiro cineclube brasileiro, ainda que pareça não ter sido figura central em ambos. De todo modo, Mario Peixoto busca se inserir no cena cultural modernista, tendo seu livro de poema Mundéu, publicado também em 1931, recebido orelha de Manuel Bandeira e resenha de Mario de Andrade, bem como podemos inferir pela correspondência com seu amigo de infância, crítico e romancista Octavio de Faria, inserida nos Cadernos Verdes. Correspondência esta que diz respeito a todo um esforço de marketing de “Limite”, na busca de publicação de críticas que se traduziu numa grande presença midiática do nome de Mario Peixoto que se estende durante as filmagens do nunca concluído “Onde a Terra Acaba”. Parece que este momento de maior visibilidade de Mario Peixoto se encerra em 1935 com a publicação de uma primeira versão do primeiro volume do roman fleuve O Inútil de Cada Um. Sua presença deve ser pensada dentro de um grupo de intelectuais reunidos por uma sensibilidade associada ao que Miceli chamou de cronistas da casa assassinada. Se Limite parece deslocado ao pensarmos talvez exclusivamente na produção cinematográfica brasileira de então, ele se situa claramente numa tradição literária (e a literatura era a arte definidora do campo intelectual) a qual M[ario Peixoto dedicou muito de seu tempo e energia até o fim da vida. Tradição esta marcada pela crise da cafeicultura, já no fim do século XIX, no vale do Paraiba que não encontra uma atividade econômica que a tenha substituido e que vivenciou uma experiência da decadência de uma elite rural e monarquista que, no caso da família de Mário Peixoto, não encontra lugar nem aliança com a burguesia urbana e industrial ou mesmo com uma classe media alta profissional. A opção, na falta de melhor palavra, de Mário Peixoto pela vida celibatária, pela não profissionalização, por uma vida de diletante é marcada pelo gasto da fortuna herdada e pelo estabelecimento de uma rede de amizades que as cartas e alguns poucos registros parecem indicar paralelamente ao encontro poético e definidor com a paisagem litoral do sul do estado do Rio de Janeiro depois de sua volta da Inglaterra e da França no fim dos anos 20, na passagem da adolescência para a vida adulta. Momento este marcado não só por uma sobrevivência do decadentismo encenada na “cidade morta” (Monteiro Lobato), presente em Limite, mas também do dandismo, no construção de sua própria imagem, no seio mesmo do Modernismo, numa linhagem menos conhecida, mais próxima do catolicismo e da intimidade do que do engajamento político e social de esquerda, mais cosmopolita do que interessada na formação da nação e de uma cultura brasileira, que faz da experiência da natureza não uma marca do regionalismo mas de um encontro sensorial, estético traduzido como experiência da catástrofe que se atualiza nos temos entre as duas guerras mundiais e para além.
    Nesta comunicação vamos nos deter especificamente nestes diários para compreender a experiência da amizade, como ela se configura, quais seus limites, no espaço de, em grande parte, uma homossociabilidade masculina, cruzando fronteiras da homossexualidade e da heterossexualidade, e ensejando uma configuração não homofóbica, longe do espaço da família, seja na Inglaterra, seja em hotéis ou na praia.

Bibliografia

    CASTRO, Emil de. Jogos de armar. Rio de Janeiro: Lacerda, 2000.
    MELLO, Saulo Pereira de. Limite. Rio de Janeiro: Rocco, 1996.
    MICELI, Sérgio. Intelectuais e Classe Dirigente no Brasil (1920/1945). São Paulo: Difel, 1979.
    NAGIME, Mateus. Em busca de um cinema queer no Brasil. Dissertação de Mestrado. São Carlos: Universidade Federal de São Carlos, 2016.
    PEIXOTO, Mário. Diário da Inglaterra. Rio de Janeiro: Arquivo Mário Peixoto.
    PEIXOTO, Mário. Cadernos Verdes. Rio de Janeiro: Arquivo Mário Peixoto.
    PINTO, César Braga-. A Violência das Letras: Amizade e Inimizade na Literatura Brasileira 1888-1940. Rio de Janeiro: EDUERJ, 2008.
    SANTOS, Fabricio Felice dos. “A apoteose da imagem”: Cineclubismo e crítica
    cinematográfica no Chaplin-club. Dissertação de mestrado. São Carlos: UFSCAR, 2012.
    VENANCIO, Paulo. A crise da pessoalidade e o outro” modernismo: Cornélio Penna, Oswaldo Goeldi e Mário Peixoto, Dissertação de Mestrado. Rio de Janeiro: UFRJ, 1992.