Ficha do Proponente
Proponente
- Janaína Oliveira (IFRJ / FICINE)
Minicurrículo
- Pesquisadora e curadora, é doutora em História e professora desta disciplina no Instituto Federal do Rio de Janeiro – Campus São Gonçalo, onde coordena o Núcleo de Estudos Afro-brasileiros e Indígena (NEABI). É membro da APAN (Associação dos Profissionais do Audiovisual Negro), além de idealizadora e coordenadora do FICINE, Fórum Itinerante de Cinema Negro (www.ficine.org). Atualmente é professora visitante no Centro de Estudos Africanos na Universidade de Howard, em Washington D.C. nos EUA.
Ficha do Trabalho
Título
- Cinema Negro brasileiro hoje: narrativas e experiências estéticas.
Seminário
- Cinema Negro africano e diaspórico – Narrativas e representações
Resumo
- Há poucos anos atrás falar em cinema negro no Brasil era falar de um projeto em construção. Hoje, após de quatro décadas de existência, o cinema negro nacional consolida-se em um movimento incontestável. O presente trabalho pretende ir além das análises contextuais que tradicionalmente abordam o tema e compreender o cinema negro em um diálogo interno com as manifestações culturais negras brasileiras e a afirmação de uma estética cinematográfica negra.
Resumo expandido
- Há poucos anos atrás falar em cinema negro no Brasil era falar de um projeto em construção. Um projeto que, articulado às lutas históricas dos movimentos negros, demandava por mudanças na representatividade negra dentro e fora das telas de cinema, tal como ocorreu em outros países da diáspora. Foi assim nos Estados Unidos, quando pela primeira vez realizadores negros passaram a produzir contra-representações às formas hegemônicas que Hollywood construía os personagens negros no cinema. Quando, por exemplo, Oscar Micheaux em 1920 realizou “Nos limites dos portões”, uma espécie de resposta cinematográfica às representações racistas em O nascimento de uma nação de D.W. Griffith, primeiro blockbuster da história do cinema estadunidense lançado em 1915. Ou ainda quando em meados dos anos 1980 na Inglaterra o Black Audio Film Collective iniciou seus trabalhos já numa dimensão de vanguarda, apresentando slides e filmes na universidade, museus, galerias de arte e cinemas, rompendo simultaneamente tanto com os estereótipos nas representações dos negros, como a forma de narrar e os espaços onde tradicionalmente se encontravam as imagens em movimento.
No caso brasileiro, inclusive, este viés analítico que compreende a história do cinema negro na correspondência com as demandas por representação e representatividade dos movimentos negros esta na base das análises efetuadas pela maioria dos pesquisadores do país que se dedicam a estudar essa história. De tal modo que dentre os elementos dessa luta que se associam ao projeto de cinema negro no Brasil, figuram no centro do debate os conflitos em torno da consolidação hegemônica da identidade nacional brasileira empenhada em colocar o negro em posição de subalternidade e não como elemento fundamental na formação cultural do país. Atualmente, após praticamente quatro décadas de existência, o cinema negro nacional finalmente ganhou então forma e corpo, despontando na força de um movimento. E este movimento é incontestável. Como afirmou a pesquisadora Lúcia Monteiro em matéria no jornal Folha de São Paulo em 12 de Maio deste ano, “o Brasil precisa seguir esse ciclo no qual a existência do cinema negro não possa mais ser ignorada” .
No intuito de compreender e ampliar esse ciclo, o trabalhoa qui proposto pretende ir além das análises contextuais que tradicionalmente abordam o tema e explorar a possibilidade de entender o cinema negro em uma perspectiva voltada para o diálogo interno entre as representações e manifestações culturais negras e a afirmação de uma estética negra. A intenção aqui é refletir sobre a construção de uma estética que, mesmo surgida em diálogo e oposição às estéticas hegemônicas e, por extensão, eurocêntricas, possam ser compreendidas e ampliadas de maneira horizontal a partir de experiências culturais negras.
Nesse sentido concordamos quando Yearwood afirma que “enquanto artefato cultural, o cinema negro não pode ser adequadamente compreendido quando removido de sua experiência cultural” (YEARWOOD, 2000, p.8). Ou ainda com bell hooks quando ela nos provoca dizendo: “Nós pensamos sobre a nossa pela como uma sala escura, um lugar de sombras. Nos falamos com frequência sobre as políticas cor e a forma como racismo criou uma estética que nos machuca, uma forma de pensar sobre a beleza que dói. Nas sombras tarde de noite, nós falamos sobre a necessidade de ver a escuridão de uma forma diferente, de falarmos disso de uma nova maneira. Naquele espaço de sombras nos esperamos por uma estética da negritude – estranha e opositiva.” (hooks, 1990). Portanto, quais seriam as dimensões estéticas presentes nos filmes negros brasileiros? É possível estabelecer linhas ou temas comuns às narrativas fílmicas negras que assistimos contemporaneamente nas telas? Em que medida elas dialogam com as manifestações culturais negras e outras referências dos cinemas da África e também da diáspora? São estes alguns dos questionamentos que orientam o trabalho de pesquisa ora proposto.
Bibliografia
- CCARVALHO, Noel/ DE, Jéferson. Dogma Feijoada, o cinema negro brasileiro. São Paulo: Imprensa Oficial, 2005
FANON, Frantz. Pele negra, máscara branca. Salvador: EdUFBA, 2008.
HOOKS, bell. Yearning: Race, Gender and Cultural Politics. New York: Routledge ,1990.
______ . Black Looks: Race and Representation. Boston: South and Press, 1992
OLIVEIRA, Janaína. “Kbela” e “Cinzas”: o cinema negro no feminino do “Dogma Feijoada” aos dias de hoje. In FLAUZINA, Ana; PIRES, Thula (org.). Encrespando (ONU, 2015-2024). Brasília: Brado Negro, 2016, p.175-198.
REID, Mark A. Redefining Blackl Film. Berckley: University of California Press, 1993.
SOUZA, Edileuza Penha de. Cinema na panela de barro: mulheres negras, narrativas de amor, afeto e identidade. Tese (doutorado). UNB, 2013.
SHOHAT, Ella/ STAM, Robert, Crítica da imagem eurocêntrica. São Paulo: Cosac&Naify, 2006.
YEARWOOD, Gladstone. Black Film as a Signigying Practice. New Jersey,African World Press, 2000