Ficha do Proponente
Proponente
- ana rosa marques (UFBA e UFRB)
Minicurrículo
- Ana Rosa Marques é pesquisadora e professora da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia onde ministra as disciplinas de documentário e montagem. É também coordenadora do Cachoeiradoc – Festival de Documentários de Cachoeira. Mestre pela Universidade Federal Fluminense ( 2006) e recém-doutora pela Universidade Federal da Bahia (2018).
Ficha do Trabalho
Título
- Montagem, ética e adversário
Seminário
- Montagem Audiovisual: reflexões e experiências
Resumo
- Nossa proposta é discutir, do ponto de vista ético, os desafios vividos e as soluções encontradas na montagem para se mostrar, conhecer ou confrontar o adversário em três documentários. São eles Theodorico, Imperador do Sertão (1978), Um lugar ao Sol (2009) e Por trás da linha de escudos (2017). Analisaremos esses filmes à luz de reflexões já empreendidas por teóricos que também se debruçaram sobre o cinema de caráter mais adversativo como Jean Louis Comolli, François Niney e Geráld Collas
Resumo expandido
- Nossa proposta é discutir, do ponto de vista ético, os desafios vividos e as soluções encontradas na montagem para se mostrar, conhecer ou confrontar o adversário em três documentários brasileiros. Como bem reflete o cineasta e teórico Jean-Louis Comolli, “filmar o inimigo é fazê-lo entrar em um filme junto comigo” (2013), mas como compartilhar uma experiência em uma situação na qual quem filma e quem é filmado encontram-se em campos opostos e divergentes do pensar ou do agir na vida? Para viabilizar os filmes nessas condições, os cineastas vão administrando sua perspectiva adversativa de acordo com as circunstâncias. Há alguns que inclusive não declaram seu posicionamento crítico no momento da tomada para assim poder instituir um território mais receptivo à aproximação. Filmar o adversário parece então complexificar a questão ética para a montagem: como conciliar o pacto firmado na filmagem que permite a constituição de uma cena com uma postura opositiva que é o gesto fundador do filme?
A ética é um dos temas mais importantes e discutidos dentro do campo de estudos do documentário. Por lidar com questões reais de pessoas reais há uma especial preocupação com as consequências que as representações construídas possam trazer para os sujeitos filmados. Como será impactada a vida das pessoas exibidas na tela? O que do mundo privado pode se tornar público? Até onde se pode mostrar e como? Que espécie de pressões podem interferir nas condutas e com quais consequências?
A reflexão ética também deve considerar o lugar que o filme desenha para o espectador e como ele o afeta. Se as imagens invocam o olhar, o pensamento, a crença e até mesmo a ação do espectador, a representação deve pensar sobre suas responsabilidades sobre quem assiste e o modo como organiza essas imagens. Até onde vai o direito do espectador de saber e ver sobre os sujeitos filmados? Como mostrar evitando uma posição cômoda, passiva, indiferente ou sádica? São algumas das questões éticas para as quais o cineasta tem que encontrar respostas estéticas.
A preocupação com os efeitos do filme duplica a cobrança que se tem com a montagem. Se há uma cumplicidade entre cineasta e personagem na cena e esse sentimento é fundamental para que exista filmagem, na montagem o diretor fica a sós com o material produzido e tem o controle das imagens e sons, restando ao sujeito filmado apenas confiar no pacto firmado na cena. Desta maneira, a ética atuaria com o propósito de restringir o poder do cineasta na organização dos sentidos na montagem para preservar os laços construídos na tomada. No entanto, por esse viés, se o princípio ético for exclusivamente a avaliação de quanto o cineasta é capaz de manter a cumplicidade criada na filmagem, o documentário que filma o adversário estará condenado a sempre abrir mão do gesto crítico que dá origem a um dos propósitos do fazer fílmico.
Aqui apresentamos as situações de três documentários brasileiros nos quais o cineasta filma o(s) adversário(s) para a avaliar os desafios e a postura ética do cineasta a partir das operações realizadas na montagem. São eles Theodorico, Imperador do Sertão (1978), de Eduardo Coutinho, Um lugar ao Sol (2009) de Gabriel Mascaro e Por trás da linha de escudos (2017), de Marcelo Pedroso. Analisaremos esses filmes à luz de reflexões já empreendidas por teóricos que também se debruçaram sobre o cinema de caráter mais adversativo como Jean Louis Comolli, François Niney e Geráld Collas.
Bibliografia
- COLLAS, Gérald. Un bien mauvais sujet. Images documentaires. n. 23 Paris: BPI, 1995. p.11- 22.
COMOLLI, Jean-Louis. Filmar o inimigo é fazê-lo entrar em um filme junto comigo. Entrevista para Cláudia Mesquita e Ruben Caixeta de Queiroz. Catálogo 170 FORUMDOC – Festival do Filme Documentário e Etnográfico Fórum de Antropologia e Cinema. Belo Horizonte, 2013, p. 277-287.
FREIRE, Marcius. A estética contra a ética. In: FURTADO, Beatriz (org). Imagem contemporânea. São Paulo: Ed. Hedra, 2009, p. 191- 214.
NINEY, François. Confondre l’ennemi sans se confondre avec lui. Images documentaires. n. 23 Paris: BPI, 1995. p. 23- 44.
PEDROSO, Marcelo. Três suposições sobre a adversidade no documentário. Devires, Belo Horizonte, v. 10, n. 2, p. 24-41, Jul/Dez 2013.
SOUTO, Mariana. Documentários terroristas?Inimigos de classe no cinema brasileiro contemporâneo. Catálogo 170 FORUMDOC Festival do Filme Documentário e Etnográfico Fórum de Antropologia e Cinema. Belo Horizonte, 2013. p. 293-301