Ficha do Proponente
Proponente
- ROBERTA AMBROZIO DE AZEREDO COUTINHO (UFPE)
Minicurrículo
- Graduada em jornalismo e especialista em estudos cinematográficos pela UNICAP-PE. Mestra pelo programa de pós-graduação em comunicação da UFPE, onde produziu uma dissertação sobre a representação dos sons do mundo no cinema de Lucrecia Martel. Atualmente é doutoranda no mesmo programa onde concluiu o mestrado e desenvolve uma pesquisa acerca do papel do efeito sonoro no cinema contemporâneo. Sua área de interesse acadêmica se concentra na teoria e história do cinema e nos estudos do som fílmico.
Ficha do Trabalho
Título
- POR UMA ESCUTA DO SILÊNCIO:O ESTILO SONORO DE LISANDRO ALONSO
Seminário
- Estilo e som no audiovisual
Resumo
- Nesta comunicação, a partir da perspectiva de estilo trazida por Bordwell, nos propomos a refletir sobre o efeito de silêncio como um recurso estilístico recorrente na produção do diretor Argentino Lisandro Alonso. Para o alcance deste fim e por meio da análise fílmica, intencionamos investigar as estratégias de criação sonora exploradas nas películas do diretor como uma forma de problematizar a existência de um estilo sonoro em sua obra baseado no engendramento de um efeito de silêncio ubíquo.
Resumo expandido
- No âmbito científico do cinema, as pesquisas que adotam uma perspectiva estilística, seguindo uma tendência hegemônica deste campo, tendem a eleger aspectos imagéticos da criação fílmica como guias para uma decodificação do estilo de seus objetos de análise. Tal tendência pode ser observada mesmo em estudos que se debruçam sobre ciclos\cineastas que conferem um papel determinante ao som. Neste rol, destacamos Lisandro Alonso, cineasta Argentino cuja sedimentada obra autoral já foi objeto de uma gama expressiva de estudos, que, no entanto, ou ignoram ou discutem de maneira secundária a potência sonora que permeia a constituição de seu cinema. Assim, a fim de contribuir para o preenchimento desta lacuna científica e em afinidade com a noção conceitual de estilo trazida por Bordwell (2009), que o entende como o conjunto de práticas narrativas e estéticas recorrentemente exploradas por cineastas na construção de seus universos fílmicos, nos propomos a problematizar o uso do efeito de silêncio como um recurso basilar na composição estilística do cinema de Alonso, tendo em vista que esta estratégia de criação sonora parece se repetir em todos os seus cinco longa-metragens. Falamos em “efeito de silêncio” a partir do pensamento do teórico e músico John Cage, bastante disseminado nas práticas e estudos do som fílmico, de que na realidade tangível é inconcebível a ausência completa de sons, tendo em vista sua natureza física – fenômeno ondulatório que se propaga em meio materiais – sendo, portanto, onipresente, uma vez que tudo no mundo que nos circunda é matéria, inclusive nós mesmos. Assim, o que o que há, portanto, é uma sensação de silêncio fruto de contextos acústicos específicos (HELLER, 2011).
Neste sentido, já se encontra reificada no âmbito cinematográfico a ideia de que o silêncio enquanto fenômeno circunstancial é representado em um filme, primordialmente, a partir de certas configurações estratégicas dos elementos sonoros. “Não há tal coisa como um silêncio verdadeiro, ou absoluto, somente um sistema de silêncios relativos e estruturados – silêncios que são feitos para ter significado no contexto relacional e de representação da própria trilha sonora” (THÉBERGE, 2008, p. 67, apud, TEREZANI, 2013, p.17). Dentro desta perspectiva, Chion (2011) elenca táticas de produção de silêncios convencionadas na lógica da narrativa clássica, destacando aquela mais simples e, consequentemente, a mais explorada. “A impressão de silêncio numa cena (…) só se produz quando é trazida por um contexto e por toda uma preparação, que consiste (…) em fazê-la preceder de uma sequência barulhenta. (…) é o produto de um contraste” (CHION, 2011, p.50).
Na filmografia analisada, embora estratégias tradicionais como esta por vezes sejam exploradas, o efeito de silêncio é concebido, primordialmente, de uma forma peculiar, qual seja, a partir da composição excessivamente detalhista e destacada em termos de potência e frequência do som ambiente e dos foleys, a qual impõe ao espectador uma escuta ininterrupta da massa sonora onipresente que circunda a rotina dos personagens. Dessa maneira, somos levados a ouvir de forma atenta e imersiva sonoridades banais que geralmente nos passariam despercebidas em um contexto de escuta tangível o que, segundo a concepção Cageana, também opera uma percepção de silêncio. (HELLER, 2011).
Ademais, enquanto no cinema hegemônico o uso de tal efeito geralmente se limite a cenas pontuais que requerem um reforço da dramaticidade da ação (CHION, 2011), na obra do cineasta Portenho ele permeia toda a narrativa, imprimindo uma identidade sonora aos filmes. Diante do exposto, este artigo se propõe a discutir o efeito de silêncio como um recurso recorrente na produção de Alonso, e, portanto, determinante para a composição do estilo do cineasta. Para isto nos propomos a investigar as estratégias de criação sonora exploradas em suas películas a partir do arcabouço metodológico que compõe a análise fílmica.
Bibliografia
- BORDWELL, D. Sobre a história do estilo cinematográfico. Campinas: Editora da Unicamp, 2013.
CAMPERO, A. Nuevo cine argentino. Buenos Aires: Universidad Nacional de Sarmiento, 2009
CARREIRO, R; ALVIM, L. Uma questão de método: notas sobre a análise de som e música no cinema. Matrizes (USP), v. 10, n. 2, São Paulo, p. 175-193, 2016
CAPELLER, I. Raios e trovões: hiper-realismo e sound design no cinema contemporâneo. In: Catálogo da mostra e curso O Som no Cinema. Rio de Janeiro: Tela Brasilis/Caixa Cultural, pp. 65-70, 2008
CHION, M. A Audiovisão. Lisboa: Texto & Grafia, 2011
HELLER, A.A. John Cage e a Poética do Silêncio. Blumenau: Letras Contemporâneas, 2011
KERINS, M. Beyond Dolby (Digital): cinema in the digital sound age. Bloomington: Indiana University Press, 2010
SONTAG, S. A estética do silêncio. São Paulo: Cia das Letras, 1987
TEREZANI, J. H. T. Ouvindo Vazios: reflexões sobre o silêncio no cinema. Anais do II Seminário Nacional Cinema em Perspectiva. Curitiba, n.1,v.1.