Trabalhos Aprovados 2018

Ficha do Proponente

Proponente

    Marina Cavalcanti Tedesco (UFF)

Minicurrículo

    Diretora de fotografia e professora do Departamento de Cinema e Vídeo e do Programa de Pós-graduação em Cinema e Audiovisual da Universidade Federal Fluminense. Líder do grupo de pesquisa “Cinematografia, Expressão e Pensamento” (CNPq/UFF). Recentemente, coorganizou o livro “Feminino e plural: mulheres no cinema brasileiro” (2017). É autora de diversos artigos sobre cinematografia, publicados nacional e internacionalmente.

Ficha do Trabalho

Título

    Heloisa Passos: interpelando uma trajetória a partir do gênero

Seminário

    Teorias e análises da direção de fotografia

Resumo

    A direção de fotografia é, em todo o mundo, uma área onde as mulheres são sub-representadas, tendo dificuldade em ingressar e também em permanecer nela. Partindo de uma pesquisa sobre mulheres na equipe de fotografia de longas-metragens brasileiros, que realizamos desde 2014, propomos como estudo de caso a carreira da fotógrafa Heloisa Passos. Avaliamos que sua trajetória, dada a longa duração, pode condensar diversas questões com as quais nos deparamos ao longo destes anos de investigação.

Resumo expandido

    Embora sempre tenha havido mulheres na direção de fotografia (as quais em geral não ficaram para a história), diversas pesquisas demonstram que esta é uma das áreas mais masculinizadas do processo de realização fílmica em todo o mundo. Em levantamento realizado nos longas-metragens nacionais de ficção que tiveram exibição pública, vamos encontrar uma assistente de câmera creditada pela primeira vez em 1981 – Luelane Corrêa em “Amor e Traição” (Pedro Camargo, Brasil, 1981). Já na direção de fotografia, as pioneiras são Márcia Lara, em “Louca Utopia” (Márcia Lara, Brasil, 1984), e Kátia Coelho, em “Real Desejo” (Augusto Sevá; João de Bartolo, Brasil, 1990). No que tange à cinematografia, 1990 é um ano histórico em nosso país não apenas por ser a estreia de uma mulher na direção de fotografia profissional (o filme de Márcia Lara foi captado e finalizado em Super-8), mas também por ser quando Heloisa Passos, uma das principais fotógrafas do Brasil, inicia sua carreira.
    Após termos nos dedicado entre 2014 e 2017 a construir, de maneira quantitativa, essa história quase não contada das mulheres na direção de fotografia brasileira, percebemos que seria necessário entrevistarmos algumas delas a fim de compreendermos melhor que fatores possibilitaram: 1) que elas lentamente começassem a conquistar espaço onde até então só havia homens; 2) o que ser mulher significava/significa em termos de mercado e oportunidades de trabalho. Para a elaboração da lista de entrevistadas, utilizamos como critério: longevidade da carreira, prêmios em sua trajetória, diversidade regional e disponibilidade para a realização de entrevista presencial. Heloisa Passos é a primeira de nossas entrevistadas.
    Se hoje o preconceito enfrentado pelas mulheres na cinematografia vem sendo percebido, denunciado e combatido, em um processo que tem como um de seus ápices a criação do Coletivo de Diretoras do Brasil, em 2016, até pouco tempo atrás a situação era profundamente diferente. A maioria delas ou não percebia os obstáculos adicionais que ser mulher trazia ou preferia não falar sobre isso para não aumentar o estigma e as dificuldades cotidianas. É o que verificamos em entrevista relativamente recente de Kátia Coelho ao Programa Zootropo (2014):
    Eu entrei na USP, no curso de cinema, com 17 anos… Então eu não sabia se tinha mulher ou se não tinha mulher, isso não entrou em pauta na minha escolha. Aí com o tempo eu fui vendo que não tinha. Na verdade, eu não encontrei preconceito não, porque eu acabei trabalhando já direto com quem justamente não tinha preconceito. Nos Estados Unidos tinham mulheres diretoras de fotografia, não tinham no Brasil. E o primeiro filme que eu fiz, profissional, foi com um diretor de fotografia que, justamente, trabalhava muito e trabalha no mercado americano, que é o Afonso Beato. E ele estava muito acostumado a trabalhar com mulher, né? E eu fui assistente de câmera dele. Um longa-metragem do Bruno Barreto.
    Também nesse sentido Heloisa Passos é uma pioneira. Segundo relatou em master class na Cinemateca Brasileira, rapidamente percebeu que, não sendo homem, seria muito menos chamada para trabalhar, e que a saída seria viabilizar filmes para, assim, ter onde atuar. Abrir sua própria produtora, ingressar em áreas não consideradas até então, como a direção e a produção, para poder fotografar tem sido uma estratégia adotada por diversas mulheres. O que chama atenção no caso de Heloisa Passos é a precocidade com a qual ela a adota e a clareza que tem desde o primeiro momento de por que estava agindo daquela forma.
    Como se pode perceber, a história oral mais uma vez se mostra fundamental para a história das mulheres. Através dela, temos conseguido avançar na compreensão de como as questões de gênero aparecem na prática da realização fílmica – especificamente na equipe responsável pela captação das imagens. Ademais, fortalece-se a direção de fotografia como área de investigação, especialmente no entrecruzamento gênero-técnica.

Bibliografia

    AGÊNCIA NACIONAL DO CINEMA. Diversidade de gênero e raça nos lançamentos brasileiros de 2016. Disponível em: https://www.ancine.gov.br/sites/default/files/apresentacoes/Apresentra%C3%A7%C3%A3o%20Diversidade%20FINAL%20EM%2025-01-18%20HOJE.pdf
    CASTRO, Bárbara Geraldo de. “Performances de gênero no setor de tecnologia da informação: estratégias de mulheres em um universo de trabalho dominado por homens”. In: Seminário Internacional Fazendo Gênero 10, 2013, Florianópolis. Anais eletrônicos… Florianópolis: UFSC, 2013.
    KRASILOVSKY, Alexis. Women behind the camera: conversations with camerawomen. Westport, CT: Praeger Publishers, 1997.
    SCOTT, Joan. “História das mulheres”. IN: BURKE, Peter. A escrita da história: novas perspectivas. São Paulo: Editora da Universidade Estadual Paulista, 1992.
    TEDESCO, Marina Cavalcanti. “Mulheres atrás das câmeras: a presença feminina na direção de fotografia de longas-metragens ficcionais brasileiros”. Revista Significação, v. 43, n. 46, São Paulo, 2016.