Ficha do Proponente
Proponente
- Maria Cristina Couto Melo (Unicamp)
Minicurrículo
- Maria Cristina Couto Melo é doutoranda pelo Programa de Pós-graduação em Multimeios na Unicamp, onde desenvolve a pesquisa intitulada “Propostas possíveis para o cinema independente no Brasil (1952-2001)” buscando refletir sobre os discursos referentes ao cinema independente a partir de uma perspectiva historiográfica, contemplando suas transformações, rupturas e permanências.
Ficha do Trabalho
Título
- Apontamentos sobre nacional/popular no cinema independente brasileiro
Resumo
- A questão do nacional/popular permeia a história do cinema brasileiro, indicando a necessidade de afirmação do cinema nacional frente à presença do cinema estrangeiro, e a busca por inserção no mercado e conquista de público. A noção de cinema nacional é fundamental, na medida em que legitimiza e resulta desse processo de afirmação. O presente trabalho propõe a reflexão em torno do modo como tais questões foram desenvolvidas no pensamento cinematográfico independente de 1952 a 1980.
Resumo expandido
- É possível observar uma imbricação da questão do nacional/popular em todos os grupos da atividade cinematográfica da década de 1950 – seja na posposta de um cinema industrial pela Vera Cruz, que delineava uma representação do nacional e do popular aliada a formas internacionais, seja nas ideias de um cinema independente apresentado nas teses dos Congressos e sistematizada e expressa de maneira objetiva pela primeira vez pelos realizadores – e nesse caso, ainda que se identifique a presença de posições heterogêneas em relação ao que deveria ser o cinema nacional, há também uma ideia geral de que a atividade cinematográfica brasileira necessitava de alternativas ao modelo empresarial/industrial hollywoodiano exercitado em alguma medida na iniciativa dos estúdios da Vera Cruz.
No entanto, segundo Bernardet e Maria Rita Galvão (1983, p. 83) há uma tensão entre a ideia de cinema popular e a necessidade de industrialização apontada como objetivo nas reflexões dos articulistas dos Congressos. As noções do nacional e do popular nesse momento, se aproximam da ideia de independência que culminaria em um novo modelo de industrialização, mas não há uma sistematização objetiva de que maneira as características do cinema independente, nacional e popular, seriam desdobradas no contexto da industrialização.
Os primórdios do movimento do Cinema Novo e sua primeira fase, no início dos anos 1960, possuíam uma evidente posição anti-industrial. A realização de filmes em um modelo alternativo de produção possibilitaria a representação da problemática contemporânea dos cineastas (AUTRAN, 2005, p. 29) com uma abordagem nacionalista, vinculando as formas de produção a uma estética específica, fora dos padrões da linguagem clássica cinematográfica (RAMOS, 1987, p. 321), então associada ao modelo industrial estrangeiro. A independência, portanto, ocorreria nos temas nacionais, principalmente no que se refere à representação do povo brasileiro e sua realidade social. Há nesse momento um resgate acentuado das tradições populares a partir de uma abordagem crítica. A noção de popular implicada nesse momento do cinema brasileiro se vincula diretamente á uma ideia de povo, e a uma ideia de cinema que seria instrumento de desalienação do mesmo frente a sua realidade social.
Nas décadas seguintes recoloca-se a questão de maneiras distintas, porém ainda a partir da mesma perspectiva de afirmação e desenvolvimento de uma cinematografia em seu próprio mercado. No que se refere à ação do Estado, sua presença nos negócios cinematográficos esteve, desde a década de 1930, pautada pelo desenvolvimento de um cinema nacional que estivesse em contato com o público e representasse a cultura brasileira. A atuação da Embrafilme, a partir de 1969 manteve a característica protecionista de incentivo a uma produção de filmes que abordassem características da cultura nacional, principalmente a partir da literatura. Em paralelo ao exercício da empresa ao longo das décadas seguintes, as produções dos núcleos de realização da Boca do Lixo, e do Beco da Fome, desvinculadas da ação estatal direta e mais próximas de um modelo industrial hegemônico, entendiam o popular a partir da exploração do cinema gênero que garantia o sucesso comercial. O popular e o nacional se conectavam a produção de filmes que atraíssem público e possibilitassem a auto sustentação do cinema brasileiro.
A partir desse panorama é possível identificar que, a noção de cinema nacional torna-se fundamental na compreensão do pensamento cinematográfico independente, pois a proposta de alternativas a um modelo hegemônico passa pela necessidade de entender o cinema como instrumento de identidade e emancipação (HENNEBELE, 1978, p. 16), ainda que em uma lógica de produções comerciais.
Bibliografia
- AUTRAN, Arthur. O Pensamento Industrial Cinematográfico Brasileiro. Campinas, SP: tese de doutorado apresentada ao Programa de Pós Graduação em Multimeios, do Instituto de Artes, Unicamp, 2005.
BERNARDET, Jean-Claude. Cinema brasileiro: propostas para uma história. São Paulo: Companhia das Letras, 2009.
BERNARDET, Jean-Claude e GALVÃO, Maria Rita. Cinema: repercussões em caixa de eco ideológica. São Paulo: Brasiliense, 1983
CHAUÍ, Marilena. O nacional e o popular na cultura brasileira. Seminários. São Paulo: Brasiliense, 1983.
GALVÃO, Maria Rita. “O desenvolvimento das ideias sobre Cinema Independente”. Cadernos da Cinemateca. n°4. São Paulo, 1980.
HENNEBELE, Guy. Os Cinemas Nacionais contra Hollywood. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978.
MARSON, Melina Izar. O Cinema da Retomada. Campinas, São Paulo, 2006.
RAMOS, Fernão (Org.). História do cinema brasileiro. São Paulo: Art Editora, 1987.
SORLIN, Pierre. Existem cinemas nacionais?. Sociètes et Reprèsentation, número 3,1996, pp 409-419.