Trabalhos Aprovados 2018

Ficha do Proponente

Proponente

    LUIZ ADRIANO DAMINELLO (UFPA)

Minicurrículo

    Mestre pelo Depto. de Multimeios da Unicamp, graduado em Cinema pela Universidade de São Paulo, atualmente é professor efetivo da Faculdade de Cinema e Audiovisual da UFPA ministrando as disciplinas relativas à Fotografia, Cinematografia, Antropologia Visual e Documentário nos Cursos de Cinema, Multimídia e Artes Visuais. Desenvolve projeto de extensão e pesquisa em Estudos Culturais, Pós-colonialismo, Cinema Etnográfico, Indigenous Media e Imagem Compartilhada.

Ficha do Trabalho

Título

    A realização de “filmes de Improvisação” com os povos da floresta

Seminário

    Cinemas pós-coloniais e periféricos

Resumo

    Os filmes de ficção e improvisação de Jean Rouch sugeriram modelos de realização que podem ser ideais para a afirmação de identidades regionais e étnicas. Inspirado nesse conceito de cinema, é apresentado o Projeto NORTEAR, que consiste em experimentações audiovisuais com os jovens ribeirinhos habitantes da Floresta de Caxiuanã.

Resumo expandido

    Certo dia, voltando de uma oficina de cinema para jovens da Comunidade de Heliópolis em SP, fiquei me indagando se aquilo a que estávamos nos propondo naquele momento, um “cinema da comunidade” ao invés de um “cinema da indústria” ou um “cinema de autor”, não corresponderia mais a um “cinema do futuro”, quando as pessoas estariam mais envolvidas em fazer filmes (ou qualquer outra forma de arte) do que em assistir a filmes. Se não estávamos entrando, finalmente, de modo lento, numa época de tal democratização das expressões artísticas que caminhávamos para o abandono do ato passivo de espectadores para nos tornarmos todos artistas amadores, atingindo, dessa maneira, o sonho dos surrealistas de transformar a arte em expressão de qualquer cidadão.
    Jean Rouch, um eterno otimista nessa questão, se diz vitorioso ao final do seu filme La pyramide humaine. Da análise do filme ficaram algumas questões e a identificação de uma característica bem interessante da obra ficcional ou de improvisação do cineasta: esses seus filmes eram mais preocupados com a experiência vivenciada por ele e os outros participantes durante a realização, do que com o produto resultante para exibição pública. Não buscavam profissionalismos, mercados ou modelos de sucesso. Não tendo a intenção de se relacionar com um grande público, os filmes ficavam restritos a pessoas com interesses específicos. Mas, além desse público, outros objetivos puderam ser atingidos. Através da improvisação, o filme abria espaço para que os participantes resolvessem suas relações, explorando-as ficcionalmente. E, nessa dinâmica, talvez estivesse uma proposta atual para as indagações antigas de Rouch sobre “O cinema do futuro”.
    O modelo de produção de filmes de Jean Rouch poderia servir para a afirmação de identidades regionais, étnicas, sociais e ajudar essas populações a localizar-se melhor dentro de um mundo onde tem que conviver com imagens dominantes desenvolvidas pelo sistema industrial do cinema e da televisão e que transformam a vida dos seres comuns em algo insignificante. Assim como os Hauka, no filme “Os Mestres Loucos” de Rouch, faziam seus rituais para superarem essas relações de dominação, os “filmes de improvisação” podem ter a mesma função ritualística dentro de uma comunidade de “excluídos”. Essa categoria de cinema permite a reflexão, o espelhamento, para que um dia as pessoas deixem de estar organizadas em “pirâmides humanas” e possam se sociabilizar com o Outro a ponto de dizerem como Jean Rouch: “Eu, um Negro”.
    Inspirado nesse conceito de cinema, o NORTEAR surgiu como Projeto de Extensão do Curso de Cinema e Audiovisual da UFPA. Consiste em várias atividades de trocas de experiências, oficinas e experimentações audiovisuais com os jovens ribeirinhos habitantes da Floresta de Caxiuanã, geralmente culminando com uma realização compartilhada de filmes de improvisação.
    Caxiuanã é a primeira floresta nacional da Amazônia, encravada no interior da Ilha do Marajó e que ficou conhecida recentemente por aparecer nos noticiários como o local de pior IDH do Brasil. Fica distante um dia inteiro de viagem de barco de Belém, a capital do estado do Pará. Nela, o Museu Emílio Goeldi tem a Estação Científica Ferreira Penna, base de vários projetos de pesquisa científica e também do projeto de educação que atende as escolas das onze comunidades sediadas no interior da Floresta Nacional de Caxiuanã.
    Com o desenvolvimento do Projeto NORTEAR pretendemos criar um ciclo contínuo de discução de como isso pode ser útil para que comunidades distantes dos centros urbanos possam se apoderar da criação de suas imagens e usar o audiovisual como ferramenta de expressão.

Bibliografia

    DAMINELLO, Luiz Adriano. Entre Duas Margens. Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Multimeios do Instituto de Artes UNICAMP. Campinas, 2010.
    BALLOT, Nadine. “La pyramide humaine”. Nadine Ballot. In: BRINK, Joram ten (Ed.). Building Bridges. The Cinema of Jean Rouch. London e New York: Wallflower Press, 2007.
    ROUCH, Jean . The Cinema of the Future? In FELD, Steven. Visible Evidence, volume 13. Ciné- Ethnography Jean Rouch, Minneapolis, London: University of Minnesota Press, 2003. p. 272
    FILMOGRAFIA
    LA PYRAMIDE humaine. Direção de Jean Rouch. Cinematografia de Louis Mialle. Som de Michel Fano. Editação de Marie-Josèphe Yoyotte, Geneviève Bastide. Filmado em Abidjan, Níger em 1959. Films de la Plêiade. Interpretes: Nadine, Denise, Alain, Jean-Claude, Elola, Nathalie, Dominique, Landry. 1 Filme (90 min) sonoro, colorido, 16mm