Ficha do Proponente
Proponente
- Matheus Batista Massias (UFSC/USP)
Minicurrículo
- Mestre em Inglês: Estudos Linguísticos e Literários pela UFSC.
Ficha do Trabalho
Título
- Pós-Horror Brasileiro: Propostas para uma História
Seminário
- Cinema brasileiro contemporâneo: política, estética, invenção
Resumo
- A noção de pós-horror, desde de 2017, vem sendo discutida mais cinefílica do que crítica ou academicamente. Pensando o Novíssimo Cinema Brasileiro e destaques como Trabalhar Cansa e O Som ao Redor, é possível trabalhá-los considerando suas peculiaridades e convergências via conceituação embrionária de pós-horror, como ruptura e renovação do horror, sempre concomitante, nunca sucedâneo. Para além de um estudo de gênero, visa-se uma análise histórica preocupada com política, classe, e gênero.
Resumo expandido
- Pós-horror, termo cuja fagulha Steve Rose havia provocado num curioso artigo para o jornal britânico The Guardian em 2017. Desde então, um certo debate tem circulado, onde alguns reconhecem e abraçam o termo, enquanto outros o depreciam e negam. Embora a noção de pós-horror tenha ganhado notório impulso no ano passado abarcando filmes correntes (com destaque àqueles produzidos pela A24), há pesquisadores que identificam filmes sob essa etiqueta em diferentes décadas. A mostra “Sem Susto: O Cinema Pós-Horror” (CCSP, 09/2017), por exemplo, lista, entre outros lançamentos contemporâneos, filmes como Rosemary’s Baby (1968), Don’ Look Now (1973), The Shining (1980), e Sang sattawat (2006). Paralelamente, o novíssimo cinema brasileiro—se demarcado aproximadamente a partir de 2010 (IKEDA, 2012)—tem sido qualitativamente marcado por filmes que podem ser analisados sob a luz do pós-horror: Trabalhar Cansa (2011), O Som ao Redor (2012), Quando Eu Era Vivo (2014), Clarisse ou Alguma Coisa Sobre Nós Dois (2015), Mate-me Por Favor (2015), Lamparina da Aurora (2017), As Boas Maneiras (2017).
Teria o horror se tornado um gênero em esgotamento? Ao contrário do western, por exemplo, cuja safra anual tem sido menor, se comparada à outras décadas, o horror tem mostrado um vigor cambaleante, se, somente se, considerarmos suas convenções e fórmulas, temáticas e estilos. O pós-horror, na atual conjuntura, não nasce, mas floresce. O prefixo “pós” vem para indicar ruptura, não sendo, assim, um sucedâneo do horror, entendido como cânone, clássico. Engatilhado no ensejo filosófico e histórico sobre o horror de Noël Carroll (1990), é relevante pensar em sua etimologia e finalidade, enquanto gênero: do latim, “tremer,” “estremecer,” “arrepiar.” E, assim, por mais banal e prático que seja, a reação da plateia. No lugar do susto, o riso, a chacota. O monstro ou o mal-entidade é visto como ridículo, embora para muitos assustar-se seja parâmetro de bom horror.
A primeira possível ruptura, se pensada a partir de Carroll, seria para com a noção de “monstro.” Em sua multiplicidade—e falta de melhores definições, é verdade—o pós-horror mergulha numa neblina: o que faz estremecer, arrepiar, por vezes, é desconhecido de uma forma não especificamente ontológica, dentro de sua diegese, mas receptiva. Como espectadores, confundimos-nos ou, melhor, uma dúvida paira sobre nosso julgamento. Menos sobre monstros do que sobre atmosferas, climas, e interações humano-mundanas, o pós-horror toma conta se abicorando pelas arestas: a interação e o embate de classes díspares e a noção de trabalho numa era neoliberal em Trabalhar Cansa (2011); o medo urbano e uma questão de classe trabalhada ora pela verossimilhança, ora de forma horrorificada (e aqui, é possível apontar questões neocoloniais e raciais) em O Som ao Redor; dramas familiares e psicanalíticos em Clarisse, onde o corpo (e o seu apodrecimento) é matéria-prima da narrativa retomando questões caras ao horror; reflexos do capitalismo tardio onde o pastiche é a voz do pós-modernismo em Mate-me por Favor.
O objetivo deste trabalho reside mais em apontar preocupações do cinema nacional atual a fim de buscar um entendimento de pós-horror (ao invés de fazer o processo inverso), descrevê-lo a partir das formas que imagem e som adquirem quando pensadas a partir de suas problematizações temáticas. Assim, claro, há uma busca por verificar padronizações do gênero horror e suas possíveis rupturas e despadronizações florescidas no pós-horror. O uso do som, pela trilha e ruídos, além das vozes, é algo paragmático também. Uma vez que fazer “estremecer,” “arrepiar” ainda seja, mesmo que indiretamente, um tropo, é relevante pensar o som e suas reverberações.
Bibliografia
- BURCH, Noël. The Philosophy of Horror or Paradoxes of the Heart. New York: Routledge, 1990.
CÁNEPA, Laura Loguercio. “Medo de Quê? Uma História do Horror nos Filmes Brasileiros.” Tese – UNICAMP, Campinas, 2008.
CHION, Michel. Audio-Vision: Sound on Screen. New York: Columbia UP, 1994.
DORIA, Kim Wilhelm. “O Horror Não Está no Horror: Cinema de Gênero, Anos Lula e Luta de Classes no Brasil.” Dissertação – USP, São Paulo, 2016.
HAYWARD, Philip. Terror Tracks: Music, Sound and Horror Cinema. London: Equinox, 2009.
IKEDA, Marcelo. “O ‘Novíssimo Cinema Brasileiro’: Sinais de uma Renovação.” Cinéma d’amérique latine, Presses universitaires du Midi, vol. 20, p. 136-149, 2012.
JAMESON, Fredric. “Postmodernism, or, The Cultural Logic of Late Capitalism.” Media and Cultural Studies: KeyWorks. Massachusetts: Blackwell, 2006.
KRISTEVA, Julia. Powers of Horror: An Essay on Abjection. New York: Columbia UP, 1982.
ROSE, Steve. “How Post-Horror Movies Are Taking Over Cinema.” The Guardian, 07/2017