Trabalhos Aprovados 2018

Ficha do Proponente

Proponente

    Natália Lago Adams (UTP-PR)

Minicurrículo

    Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Linguagens na Universidade Tuiuti do Paraná (PPGCom/UTP), na linha de pesquisa Estudos em Cinema e Audiovisual. Graduada pela Universidade Positivo no curso de Comunicação Social – Publicidade e Propaganda (2016). É membro do Grupo de Pesquisa Desdobramentos Simbólicos do Espaço Urbano em Narrativas Audiovisuais (GRUDES – PPGCom/UTP). Pesquisa o cinema contemporâneo, com ênfase no cinema de cotidiano e no cinema de fluxo.

Ficha do Trabalho

Título

    O ensaísmo em Sans Soleil e Viajo Porque Preciso, Volto Porque Te Amo

Resumo

    O trabalho apresenta uma análise comparativa entre o documentário ‘Sans Soleil’ (1983), de Chris Marker, e o drama ficcional ‘Viajo Porque Preciso, Volto Porque Te Amo’ (2009), de Marcelo Gomes e Karim Aïnouz. O objetivo da pesquisa é apontar cruzamentos entre realidade documental e ficção no segundo filme, a fim de aproxima-lo do estilo de filme-ensaio, ao qual pertence a obra de Marker, por meio da identificação elementos desta no longa-metragem brasileiro em questão.

Resumo expandido

    De acordo com Miguel Pereira (2014), no filme-ensaio (ou cinema da experiência) há, de um lado, a observação do mundo fatual e, do outro, a especulação filosófica sobre ele, de modo que a suposta objetividade documental é sedimentada, abrindo brechas para um olhar individual que contamina o concreto com o etéreo. Esse híbrido entre real e imaginário, o ser e o mundo, o ver e o pensar, é expresso por meio de quatro principais elementos: a imagem, o som, as palavras e a montagem. A interação entre eles resulta em diversas formas construir uma narrativa fílmica de ensaio.

    No cinema ensaístico de Chris Marker, a imagem é da ordem da exibição, responsável por apresentar o objeto em questão. O som, as palavras e a montagem, por sua vez, são de natureza reflexiva – esses elementos expressam o raciocínio da mente criadora e conduzem a narrativa. Aqui, o som corresponde não à trilha sonora, mas sim ao áudio em si, tanto da captação, quanto (e talvez mais importante) à narração em off; as palavras dizem respeito ao texto do filme, ao discurso especulativo de cunho filosófico que caracteriza o ensaio; e, por fim, a montagem, horizontal, simula o fluxo de pensamentos, sem compromisso com a continuidade espaço-temporal.

    Esta conjuntura resulta em um tipo de cinema que não se propõe contar uma história por meio das imagens, mas sim comentar elas ou algo associado ao que apresentam, bem como fazer delas, ainda, um comentário sobre algo que as ultrapassa – conforme aponta Perniola (2011), não há, portanto, uma relação rígida entre forma e conteúdo, de modo que o discurso não se limita a desvendar a imagem, como ocorre na montagem de narrativas cinematográficas tradicionais, mas sim acompanhá-la, dizendo o que não é explícito. E se, como prossegue a autora, a ideia precede a imagem em Marker, o presente artigo busca confirmar que o mesmo é verificado em ‘Viajo Porque Preciso, Volto Porque Te Amo’ (2009): parte de suas imagens foram captadas por Marcelo Gomes e Karim Aïnouz durante a viagem em que gravaram o documentário ‘Sertão de Acrílico Azul Piscina’ (2004). “Alguns anos depois, essa longa pesquisa desbravadora viria a ser ampliada no longa metragem da dupla Viajo porque preciso, Volto porque te amo (2009)” (ASSOCIAÇÃO CULTURAL VIDEOBRASIL, [201-?]), onde acrescentaram a história fictícia do geólogo José Renato. ‘Sans Soleil’ (1983), por sua vez, é constituído por imagens captadas por Chris Marker em suas viagens, com foco no Japão contemporâneo, e o texto narrado resulta de fragmentos de cartas enviadas pelo cineasta durante essas viagens.

    Ao identificar essa interface entre ambos os filmes, esta pesquisa elenca ‘Sans Soleil’, devido à sua relevância e indiscutível pertença ao cânone dos filmes-ensaios, como referência comparativa para a análise do longa-metragem de 2009, de modo que nele serão observados exclusivamente esses elementos de interface com a obra de Marker.

    Tanto em Marker, quanto em Gomes e Aïnouz, a ideia central surgiu de suas perambulações e foi observada nas imagens delas captadas para, por fim, se concretizar nos comentários sobre o que é exibido. Ademais, em ‘Viajo Porque Preciso, Volto Porque Te Amo’, jamais vemos José, personagem que reflete sobre as imagens por meio da narração em off, e igualmente em ‘Sans Soleil’, jamais vemos Marker, a dona da voz que narra em off as palavras do cineasta; a opção dele pelo uso de uma pessoa que não o próprio para narrar seu texto cria, então, uma personagem fictícia, tal qual existe no filme de Gomes e Aïnouz.

    Tomando esses exemplos de interfaces nas obras do corpus como ponto de partida para o estabelecimento de um paralelo entre ambas as narrativas, o estudo objetiva, por fim, a confirmação ou negação da hipótese de que ‘Viajo Porque Preciso, Volto Porque Te amo’ pertence à classe dos filmes-ensaios.

Bibliografia

    ASSOCIAÇÃO CULTURA VIDEOBRASIL. Sertão de Acrílico Azul Piscina. Disponível em: . Acesso em: 5 de maio de 2018.

    PEREIRA, Miguel. Filme-ensaio ou cinema da experiência. In: Encontro Anual da Compós, XXIII, 2014, Belém. Anais (online). Belém: XXIII Compós, 2014. Disponível em . Acesso em: 5 de maio de 2018.

    PERNIOLA, Ivelise. Chris Marker o del film-saggio. Torino: Lindau, 2011.

    SANS Soleil. Direção e Roteiro: Chris Marker. França. 1 filme (104 min). DVD. 1983.

    SERTÃO de Acrílico Azul Piscina. Direção e roteiro: Marcelo Gomes e Karim Aïnouz. Brasil. 1 filme (26 min). DVD. 2004.

    VIAJO Porque Preciso, Volto Porque Te amo. Direção e Roteiro: Marcelo Gomes e Karim Aïnouz. Brasil. 1 filme (75 min). DVD. 2009.