Trabalhos Aprovados 2018

Ficha do Proponente

Proponente

    Bernadette Lyra (UFES)

Minicurrículo

    Doutorado em Cinema, ECA/USP. Pós-doutorado na SORBONNE, Paris, França. Professora do PPG Comunicação Audiovisual, da Univ. Anhembi Morumbi, SP. Professora Emérita da UFES, ES. Membro do Comitê Científico da Socine. Lider do GP Sexualidades, identidades e sociabilidades no audiovisual, CNPq/UAM. Curadora das Mostras de Cinema de Bordas Itaú Cultural. Membro de comissões julgadoras de Mostras de Cinema. Autora de livros, capítulos de livros e artigos em revistas sobre cinema e audiovisual.

Ficha do Trabalho

Título

    Surto&Deslumbramento: perversão estética e narrativa em filmes queer

Resumo

    O cinema queer é atravessado por estratégias que, em sua diversidade, contrapõem-se a modelos usados para perpetuação do binarismo sexual e da heteronormatividade. Em filmes do Coletivo Surto&Deslumbramento, a estética da superfície e a narrativa paródica são formas organizadoras do aparato cinematográfico, que pervertem a norma instituída e contribuem em um projeto específico de resistência e provocação a preconceitos e clichês, promovendo a recolocação das imagens dos afetos e dos desejos.

Resumo expandido

    A partir dos anos 1980, a teoria queer, com seu princípio de recusa dos valores que traçam uma linha divisória entre o que é socialmente aceito e o que é relegado à abjeção, começa a ser considerada como instrumento de politização, aplicado a formas artísticas que se opõem àquelas que pretendem apontar as normas da representação de sexo e gênero a serem acatadas pelas sociedades. Nesse sentido, o cinema – que sempre foi um poderoso condutor dos princípios da heteronormatividade, no que diz respeito às regras da construção da imagens de corpos, atitudes e performances – inicia uma jornada de questionamentos e reflexões sobre a diversidade de gênero, a sexualidade e a variedade de experiências possíveis entre o fato de estar no mundo e sua mediação através do aparato cinematográfico. Abre-se, então, uma perspectiva de reconhecimento para filmes que tratam da multiplicidade sexual, tão visível nos dias de agora, e para a liberdade de escolhas dos indivíduos com respeito às próprias sexualidades. Com relação ao Brasil, ainda que se observe a existência de rejeição e preconceito a filmes com a temática queer relacionada ao corpo, à sexualidade e à diversidade de gêneros, ocorre que alguns desses filmes conseguem boa projeção nos aspectos de produção, exibição e distribuição comercial, como, por exemplo, Madame Satã (2002) de Karim Aïnouz; Tatuagem ( 2013) de Hilton Lacerda; Hoje eu quero voltar sozinho ( 2014), de Daniel Ribeiro. Outros nem conseguem tanto, mas circulam, cada vez mais, em mostras e festivais, como o precursor Festival Mix Brasil da Diversidade Sexual (que tem início em São Paulo, em 1993); a Mostra New queer cinema – cinema, sexualidade e política (apresentado em 2015 e 2016, em Curitiba (PR), Fortaleza (CE) , Salvador (BA), São Paulo (SP) e Rio de Janeiro (RJ); a Mostra Quatro Estações, parte do Festival de Cinema de Vitória, ES, e mais ainda. A par disso, observam-se núcleos alternativos, como os Coletivos, que se juntam no sentido de superar dificuldades financeiras e técnicas da produção e realização e fazem uso intenso da internet como plataforma para divulgação. Um desses coletivos é o Surto & Deslumbramento, com sede em Pernambuco, composto pelos cineastas André Antônio, Chico Lacerda, Fábio Ramalho, Rodrigo Almeida, já contando com intensa produção fílmica de curtas metragens como Mama (2012) direção André Antônio; Estudo em Vermelho (2013), direção Chico Lacerda); Casa Forte (2013), direção Rodrigo Almeida; Canto de outono ( 2014), direção André Antônio; Virgindade (2015), direção Chico Lacerda; Como era gostoso meu cafuçú (2015), direção Rodrigo de Almeida; Primavera ( 2017), direção Fábio Ramalho; e o longa A seita ( 2015), direção André Antônio. Os filmes produzidos pelo Surto & Deslumbramento são ostensivamente queer, em suas temáticas, oscilam parodicamente entre o real e o artifícial e fazem uso de estéticas que primam pela utilização do artifício, do camp, do exagero. Para demonstrar tais especificidades, analiso Virgindade, um curta sobre afetos e desejos infantis e juvenis, um misto de imaginário e documental, que perverte a estética e a narrativa, tanto no uso de imagens como de sons, e se ancora na memória, no kitsch, na pose, no humor, nos tableaux animados, nas fotos antigas e nas contraposições de movimento da câmera e da cidade que está sendo filmada, assim expondo e revelando o efêmero e a superficialidade, que habitam na totalização normativa da linguagem e do mundo, e questionando o binarismo em todas os seus formatos e formas.

Bibliografia

    BUTLER, Judith. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2015.
    HALLAK, Fernanda; HALLAK, Raquel (orgs.). Cinema sem fronteiras:15 anos da Mostra de Cinema de Tiradentes, reflexões sobre o cinema brasileiro 1998-2012. Belo Horizonte: Universo, 2012.
    HUTCHEON, Linda. Poética do pós-modernismo; história, teoria, ficção. Imago: Rio de Janeiro, 1991.
    LOPES, Denilson. Afetos, relações e encontros com filmes brasileiros contemporâneos. São Paulo: HUCITEC, 2016.
    LOURO, Guacira Lopes. Um corpo estranho; ensaios sobre sexualidade e teoria queer. Belo Horizonte: Autêntica, 2016.
    MILSKOLCI, Richard. Teoria Queer: um aprendizado pelas diferenças. Autêntica: Belo Horizonte, 2016.
    STEFFEN, Lufe. O cinema que ousa dizer seu nome. São Paulo: Giostri, 2016.
    MURARI, Lucas; NAGIME, Mateus (org). New Queer Cinema: Cinema, sexualidade e política. São Paulo: Caixa Cultural, 2015.
    _____. New Queer Cinema: Segunda onda. São Paulo: Caixa Cultural,2016.